Rio: "não sei como família seguirá", diz madrinha de menina baleada no réveillon
Alice Pamplona, de apenas 5 anos, morreu nos braços da mãe enquanto familiares acompanhavam queima de fogos em comunidade carioca
A pequena Alice Pamplona da Silva de Souza, de 5 anos, estava no colo da mãe, Franciely Silva, quando foi baleada no pescoço . Era pontualmente meia-noite do dia 1º de janeiro. A tragédia aconteceu durante uma queima de fogos no Morro do Turano, na região do Rio Comprido, na Zona Norte do Rio, onde mora a família. A menina foi levada para o hospital, mas não resistiu. Sua morte foi constatada à 1h10 do primeiro dia do ano.
"Estávamos assistindo à queima de fogos . Ela gostava de ver. Estava a coisa mais linda. Ela estava no colo da mãe , lugar em que você espera ter toda a proteção do mundo. Foi à meia-noite em ponto. Foi quando ela falou: 'Ai!'", lembrou Mayara Aparecida de Souza , de 22 anos, prima e também madrinha de Alice que foi quem socorreu a menina.
O corpo de Alice foi sepultado neste sábado, dia 2 de janeiro, no Cemitério no Caju, na Região Portuária do Rio. Cerca de cem pessoas acompanharam a cerimônia. A mãe, no entanto, não viu o enterro da filha. Franciely foi ao local, mas passou mal cerca de 40 minutos depois e foi levada por parentes para um hospital próximo, onde foi atendida e depois liberada, mas não a tempo de voltar ao cemitério.
No réveillon , a família se reuniu na casa de Mayara, vizinha de Franciely. Ambas moram na localidade conhecida como Raia. A madrinha estava filmando os fogos quando Alice foi baleada. No vídeo, é possível ouvir a menina gritando “Ai!” e ver a família se desesperando, correndo, quando a filmagem é interrompida.
"Não ouvi tiros no momento. Só fogos . Não sei como minha tia vai viver. Alice era filha única e a neta mais nova. A família estava triste porque nós perdemos nosso avô em setembro, mas, ao mesmo tempo, estávamos felizes por estarmos todos reunidos. Mas Deus levou minha pequena. Era uma menina alegre", disse Mayara, que é sobrinha de Franciely.
A Polícia Militar afirmou que, no momento em que Alice foi baleada, não havia operação na região e nem houve registro de confronto. Segundo moradores, estava acontecendo um baile funk no Morro do Turano para celebrar a virada do ano. A comunidade tem uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) desde 2010.
Durante a cerimônia , neste sábado (2), no Caju, parentes e amigos entoaram cânticos religiosos na despedida. No local do sepultamento, o caixão em que estava o corpo de Alice foi aberto, e Mayara lembrou a alegria da menina: "não foi descuido, Senhor. Ela morreu nos braços da mãe dela. Era uma criança que adorava dançar".
Por meio de nota, a ONG Rio de Paz, que acompanha casos de crianças mortas vítimas de armas de fogo no Estado do Rio, lamentou o fato de Alice ter entrado para essa triste conta: “Logo no primeiro dia do ano, tomamos conhecimento de mais um caso de criança pobre que o Rio de Janeiro
impediu de crescer. A menina Alice, de apenas 5 anos, moradora do Morro do Turano, entra para a estatística de meninos e meninas mortos por bala perdida, lado mais hediondo da criminalidade”. No ano passado, segundo a organização, pelo menos 12 crianças e adolescentes morreram nessas circunstâncias, uma média de uma por mês.
Presidente da Rio de Paz , Antonio Carlos da Costa afirmou que é preciso uma política de segurança pública eficaz e lembrou a morte das primas Rebecca, de 7 anos, e Emilly, de 4, no mês passado também baleadas, na Baixada Fluminense.
"Alice teve sua vida interrompida por bala perdida não por força de ação da Polícia Militar, mas do uso absolutamente irresponsável de armas de fogo. O que precisa ser feito é o Estado e a União terem uma política de segurança pública. Menos de 30 dias atrás, duas meninas pobres da Baixada Fluminense tiveram a vida interrompida por bala perdida . Hoje é uma menina moradora do Turano. Se essas mortes tivessem acontecido na Praça General Osório ou num condomínio da Barra da Tijuca, sociedade e poder público continuariam a lidar com a indiferença com que lidam com essas mortes? Precisamos de implantação de políticas públicas nas favelas", disse.
Por meio de nota, a Subsecretaria de Estado de Vitimados informou que ofereceu atendimento psicológico e social para a família de Alice . A Delegacia de Homicídios da Capital está investigando o caso. Por nota, a Polícia Civil informou que “os pais da menina Alice Pamplona da Silva, de 5 anos, prestaram depoimento” e que “outras testemunhas serão chamadas para esclarecimentos”: “As investigações continuam para identificar de onde partiu o tiro que atingiu a criança e esclarecer os fatos”.