Covid-19: mortes demoram até um mês e meio para aparecerem em dados oficiais

Atrasos podem criar uma cortina de fumaça sobre o atual estágio da emergência sanitária; há ainda 1.253 mortes em investigação no estado

Atraso em estatísticas acabam criando cenário que não representa a realidade da doença, aponta levantamento
Foto: Brenno Carvalho / Agência O Globo
Atraso em estatísticas acabam criando cenário que não representa a realidade da doença, aponta levantamento

Os óbitos por Covid-19 no Rio de Janeiro podem levar até um mês e meio para aparecerem nas estatísticas oficiais . É o que revela uma comparação dos dados divulgados diariamente pela Secretaria estadual de Saúde (SES), apontando para defasagens num dos principais critérios para justificar a flexibilização do isolamento social: o de mortes por data da sua ocorrência, em curva descendente no estado desde meados de maio.

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Esse mesmo parâmetro é o que o  Ministério da Saúde tenta emplacar como uma das informações mais acessíveis em seu painel sobre a doença , na contramão de outros países, que destacam as notificações das últimas 24 horas.

O caso do Rio , no entanto, mostra como os atrasos podem criar uma cortina de fumaça sobre o atual estágio da emergência sanitária . No estado, a mediana do intervalo entre a ocorrência do óbito e sua confirmação, na semana passada, era de 6,1 dias. Contudo, uma lupa sobre o boletim do último dia 9 de junho, por exemplo, sinaliza que, das 147 mortes divulgadas, somente uma havia acontecido naquele mesmo dia. Todas as demais eram referentes a datas anteriores. Com os novos registros, só os óbitos de 26 de abril passaram de 174 para 199 (aumento de 14%).

As vítimas de 9 de junho, por sua vez, vêm aparecendo de forma diluída nos boletins desta semana. No mais recente, desta segunda-feira, já somavam 27. Há ainda outras 1.253 mortes sob investigação.

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"Os dados atrasados dificultam o acompanhamento da pandemia . Só depois, quando eles estiverem de fato consolidados, vamos saber se podíamos até ter reaberto antes. Além de a doença ter tido um pico em maio, sem que ninguém tenha falado que estávamos no auge, com uma mortalidade maior que a da Itália, a gente pode atrasar os passos da retomada por falta de informação em tempo real", afirma o sanitarista Daniel Soranz.

Analisando as curvas entre as mortes divulgadas diariamente e a de óbitos por data ocorrência, o descolamento entre elas é flagrante. Os boletins do fim de abril e início de maio, por exemplo, ficavam bem abaixo do número real de mortes que aconteceram nesse período. Situação que, pelo menos sem levar em conta os atrasos, começa a se reverter em meados do mês passado.

"O que percebemos é quando usamos os dados pela data da notificação ou do início dos sintomas, a curva baixa muito. Isso porque muitos dos óbitos e casos demoram dias para serem confirmados. Amanhã esses números serão revistos, mas vão se misturar na parte anterior da curva. Não é possível ver imediatamente", analisa o epidemiologista e membro do Instituto de Medicina Social da Uerj Guilherme Werneck.

Para os casos e óbitos por data do início dos sintomas, há ainda problemas na origem dos dados. Em centenas de casos, a data do aparecimento dos sintomas coincidia com o da coleta do exame ou da notificação da doença, o que seria impossível de ocorrer.

Apesar disso, a Secretaria estadual de Saúde ressalta que o "número de óbitos vem apresentando queda significativa desde o dia 18 de maio", assim como há tendência de redução no volume de internações nas redes pública e privada do Estado do Rio.