BRASÍLIA — Embora o Ministério da Saúde tenha comemorado em meados de março a capacitação dos 27 Laboratórios Centrais (Lacens), ligados às secretarias estaduais de Saúde , para fazer o diagnóstico da Covid-19, uma deficiência estrutural deixou de ser observada: quase a totalidade deles não contam com métodos automatizados para o processamento de exames do tipo RT-PCR — único capaz de confirmar a doença.
A limitação, confirmada em documento da própria pasta, impediu a agilidade que a pandemia requer, chegando a ter fila de espera de milhares de exames em alguns estados, como São Paulo .
Só recentemente, com máquinas emprestadas da Rede de Laboratórios de Carga Viral de HIV, é que os Lacens de todos os estados passaram a ter os métodos automatizados para agilizar os resultados, segundo informações da pasta após questionamentos do GLOBO.
A defasagem estrutural dos Lacens está descrita em boletim do Ministério da Saúde , publicado neste domingo, como um fator que impede a ampliação da capacidade de testagem no Brasil, considerado fundamental para o enfrentamento ao novo coronavírus.
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O informe oficial relata que a capacitação dos 27 Lacens ocorreu de 12 a 18 de março, como forma de descentralizar a realização de exames da Covid-19 no país. Até então, o resultado de casos suspeitos dependia de algum dos três laboratórios de referência do Centro Nacional de Influenza, localizados no Rio de Janeiro, São Paulo e Pará. O Ministério da Saúde fez uma entrevista coletiva para anunciar a qualificação dos Lacens em 18 de março.
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No boletim do domingo passado, porém, a pasta registrou entraves. "Mesmo com a descentralização para os LACEN, depara-se com a limitação da capacidade de processamento diária, visto que apenas 10% destes conta com métodos automatizados para a extração do material genético e demais etapas de processamento da metodologia de RT-qPCR", diz a pasta no documento.
O fato, ainda segundo o informe, "restringe a capacidade instalada para aproximadamente 2 a 3 mil exames diários no país, notadamente insuficiente para o controle da epidemia em um país com a população acima de 200 milhões de habitantes, com dificuldades logísticas e de acesso".
A capacidade registrada no boletim é metade da declarada em coletivas à imprensa por integrantes do Ministério da Saúde, que já chegaram a falar que o país podia fazer cerca de 6,5 mil testes por dia. Para o pico da pandemia, a necessidade projetada pela pasta é de 30 mil exames diários. Em São Paulo, a fila chegou a 17 mil exames, que foi zerada na quarta-feira, segundo o governo paulista.
O Ministério da Saúde, em nota, não informou onde estão os 10% de Lacens que têm métodos automatizados próprios. Disse apenas que "hoje, com o compartilhamento dos equipamentos da Rede de Carga Viral de HIV, todos os Laboratórios Centrais contam com processos automatizados para RT-qPCR".
Questionado sobre a existência de falha nos Lacens, o Ministério da Saúde respondeu que "desde 2019 vem realizando esforços para implantar métodos automatizados em todos os Laboratórios Centrais do País".
A pasta destacou ainda que laboratórios de outras instituições públicas começaram a receber insumos desde a semana passada para fazer testes, citando o Instituto Nacional do Câncer, a Polícia Federal, o Hospital das Forças Armadas, o Ministério da Agricultura e o Instituto de Biologia do Exército.
O governo anunciou que ampliará as parcerias para que laboratórios das secretarias de Segurança Pública, da rede de tuberculose, entre outras instituições, sejam também usados. Ainda não há balanço do que está funcionando. Segundo o Ministério da Saúde, cabe a cada Lacen organizar sua rede de colaboradores e repassar os dados para a pasta. "O Ministério da Saúde ainda aguarda as respostas dos 27 LACEN", diz a nota.