Após ejacular no pescoço de uma passageira em um ônibus em São Paulo, Diego Ferreira de Novais foi acusado de estupro, preso e liberado poucas horas depois dia 29 de agosto deste ano. O caso se repetiu quatro dias depois, quando o homem violentou uma mulher dentro de um coletivo na região central da cidade. Desta vez, o acusado foi detido e um inquérito foi aberto. Na sua ficha, Diego possui 17 denúncias de abuso sexual – um número chocante, mas que pode ser ainda maior, uma vez que algumas vítimas, por motivos diversos, decidem não reclamar a violência sofrida.
Outro caso recente, da escritora Clara Averbuck, que sofreu abuso de um motorista de Uber também em agosto. Na época, ela escreveu em sua página do Facebook que estaria refletindo se delataria o agressor por ‘conhecer o processo’ nas delegacias. Com isso, as pessoas começaram a debater a questão da denúncia em casos de estupro – sendo levantados alguns pontos como o sentimento de “humilhação” das vítimas, a “burocracia das delegacias” e a possível (senão provável) impunidade. Mas você sabe o que acontece, juridicamente, depois da acusação?
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Para ilustrar melhor, vamos voltar ao caso de Diego, em São Paulo, que tem pelo menos outras 15 notificações de crimes semelhantes registradas entre dezembro de 2009 e junho de 2017. Após ser liberado nas 16 primeiras ocasiões, o homem de 27 anos teve a prisão preventiva decretada dia 3 de setembro, na 17ª circunstância, e a partir deste momento, uma série de ritos jurídicos deve ser seguida até a finalização do caso.
Para a episódios de abuso sexual, nove etapas básicas devem acontecer desde o momento que a vítima registra o crime em uma delegacia até o juiz declarar a sentença:
De acordo com a juíza de Direito, Isabel Cristina Modesto Almada, o delegado é o responsável por instaurar o inquérito e colher todas as informações necessárias para sua formação. Ele tem até 30 dias para finalizá-lo e enviá-lo para o Ministério Público Estadual, entretanto, isso quase nunca acontece: a notificação de um crime pode demorar muitos meses para chegar até o MP.
Quando, enfim, o inquérito chegar ao Ministério Público , deve conter um parecer do delegado: ele pode pedir pela continuidade das investigações ou pelo arquivamento do caso. O promotor de justiça, então, analisa o caso e o encaminha para o juiz responsável com duas sugestões: ou o arquivamento ou o oferecimento de denúncia.
Mas, independente da avaliação do promotor, é o juiz que define o prosseguimento da denúncia:
No caso de Diego Ferreira de Novais, o Ministério Público ofereceu a denúncia (etapa 6.1) no dia 20 de setembro. Assinada pela promotora Adriana Ribeiro Soares de Morais, agora a denúncia segue para o Judiciário, que segundo nota do MP de São Paulo, decide se mantém a prisão preventiva, recebe a denúncia ou a arquiva (etapa 7.1), e também deve apontar se determina a instauração do incidente de insanidade mental.
Neste caso, segundo a juíza de Direito, se o teste alegar insanidade mental , Novais deve ser encaminhado para uma casa de custódia.
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Casos de estupro em números
Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 45.460 casos de estupro foram registrados no ano de 2015. Os números revelaram uma queda de 10% em relação às estatísticas de 2014, porém, o número de denúncias de crimes sexuais para o Disque 180 aumentou em 129% neste mesmo período.
De acordo com o relatório, divulgado em novembro de 2016, uma situação muito preocupante é o caso da subnotificação . Por conta da culpabilização das vítimas, as constantes dúvidas sobre a veracidade das denúncias e a falta de preparo das autoridades, muitas vítimas não denunciam os casos de estupro.
Desta forma, por mais que o número de relatos no Disque 180 tenha apresentado significativo aumento, a queda do número de denúncias explicita o crescimento dos casos subnotificados. Um estudo do IPEA, por exemplo, se atentou a esta realidade e calculou que, no Brasil, aconteçam, aproximadamente, 527 mil tentativas ou casos de estupros consumados, sendo apenas 10% deles reportados às autoridades.
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Os números utilizados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública são baseados na Lei Federal 12.015/2009, que inclui atos libidinosos e atentados violentos ao pudor na conceituação de estupro
, além da definição por base na conjunção carnal.