Na última sexta-feira (7), Alexandre de Moraes alugou os serviços da NBR [emissora que atende ao governo] por mais de uma hora para tagarelar sobre o Plano Nacional de Segurança – que já havia sido anunciado no dia anterior, note-se. Ali, como em diversas outras ocasiões, o ministro da Justiça dava uma prova de que é a mais plena personificação do ‘fala muito e faz pouco’, uma característica inaceitável para alguém que ocupa tal posto.
Afeito aos holofotes, Alexandre de Moraes desempenha esse papel com maestria: convoca entrevistas coletivas para divulgar assuntos de menor importância e, quando a água bate em seu pescoço, lança mão de seu melhor terno para fazer pronunciamentos meramente reativos.
A crise da vez é o pandemônio despertado nos presídios diante da ruptura entre as facções criminosas PCC e Comando Vermelho, e que envolve seus aliados na região Norte do País.
Frente à falência do sistema carcerário brasileiro, o ministro da Justiça cospe números vazios para transparecer seriedade, dando a si mesmo uma aura de “autoridade responsável”, como se de fato estivesse preocupado com a situação antes de a crise eclodir.
Quando foi exigido, no entanto, o ministro não demonstrou tal preocupação. Em agosto do ano passado, a governadora de Roraima, Maria Suely Campos (PP), enviou ofício a Brasília pedindo o socorro das autoridades federais para controlar a situação nos presídios no estado. O ministro da Justiça deu de ombros, e a conta pela ação irresponsável foi cobrada na semana passada: 31 mortes na maior penitenciária de Roraima . Isso poucos dias após a carnificina que deixou 56 mortos, muitos deles degolados, em Manaus.
Em uma dessas já incontáveis entrevistas, o ministro se escondeu atrás da rasa informação de que o governo repassou R$ 1,2 bilhão para os estados cuidarem do sistema penitenciário. Ao fazer isso, Moraes jogou a responsabilidade para cima dos governos estaduais, que de fato devem arcar com a manutenção dos presídios em seus territórios.
Mas cabe ao Ministério da Justiça o dever constitucional de fiscalizar a condição das penitenciárias do País e prestar todo auxílio aos estados quando for exigido. A julgar pelos recentes acontecimentos, esse trabalho tem sido ridiculamente mal executado.
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Hábito antigo
A faceta falastrona de Moraes já é conhecida de outros tempos. Em 2015, quando ainda era secretário da Segurança Pública de São Paulo, Moraes desdenhou da Polícia Rodoviária Federal ao dizer em entrevista à Folha de S.Paulo que tentaria retirar os agentes federais das rodovias paulistas "para dar um salto de qualidade" na fiscalização.
Hoje que a PRF está sob sua responsabilidade, não se vê o menor indício de que Moraes esteja tão disposto a aprimorar a corporação quanto estava disposto a menosprezá-la.
Também no governo paulista, Moraes já demonstrava seu narcisismo mesmo diante de situações desconfortáveis, como no episódio da chacina que deixou 19 mortos em Osasco e em Barueri, na Grande São Paulo.
Na ocasião, o então secretário adotou uma agenda de entrevistas quase que de hora em hora. Mesmo que fosse para divulgar meras suspeitas. Mesmo que elas não se confirmassem. Mesmo que fosse só para encarnar mais uma vez seu papel de “autoridade responsável”.
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Renúncia?
Moraes chegou ao governo de Michel Temer embalado pelos resultados positivos apresentados durante sua atuação em São Paulo – o que se deve em grande parte à equilibrada gestão do governador Geraldo Alckmin. No âmbito nacional, onde a casa está longe de se mostrar arrumada como em São Paulo, o ministro já não é unanimidade.
No Congresso Nacional, integrantes da chamada Frente Parlamentar de Segurança Pública sugerem a criação de um Ministério próprio para essa área. A iniciativa é compreensível, uma vez que o ministro da Justiça não tem se mostrado capaz de realizar sozinho aquilo que se espera do ocupante de seu cargo.
Em outra frente, integrantes do Centro Acadêmico XI de Agosto, da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, publicaram uma carta aberta pedindo a renúncia de Moraes. O documento é assinado pelos ex-ministros José Eduardo Cardozo, Tarso Genro e Eugênio Aragão, além de deputados, senadores, juízes, advogados, defensores públicos e professores.
O gesto de renunciar ao cargo até o momento não parece condizer com o já mencionado narcisismo apresentado pelo ministro. Mas caso ocorra, é certo que deverá ser acompanhado de uma entrevista coletiva. Caso não, espera-se que Alexandre de Moraes passe então a fazer exatamente o contrário do que tem praticado até agora. Ou seja: faça mais e fale menos.