Tetyana (à direita) segura seu neto Timofiy, nascido dois dias antes, em frente à sua filha Tetyana Pishchuk, de 31 anos, na enfermaria do centro neonatal em Pokrovsk, região de Donetsk, em 20 de julho de 2024
Anatolii STEPANOV
Tetyana (à direita) segura seu neto Timofiy, nascido dois dias antes, em frente à sua filha Tetyana Pishchuk, de 31 anos, na enfermaria do centro neonatal em Pokrovsk, região de Donetsk, em 20 de julho de 2024
Anatolii STEPANOV

Na última maternidade ainda aberta no leste da Ucrânia, pacientes e médicos não podem dormir devido à fúria da guerra.

Em Pokrovsk - um centro de transportes na mira das forças invasoras russas - a maternidade vive no ritmo dos bombardeios cada vez mais intensos e próximos.

“Tivemos dez ataques ontem à noite, dá para acreditar? Dez!”, diz Ivan Tsyganok, de 58 anos, responsável pelo centro médico.

O obstetra lidera a equipe enquanto se desloca pelos corredores para visitar os pacientes.

“Não estão dormindo o suficiente. Estão mal alimentados, estão estressados”, diz ele sobre o estado geral das mães e dos bebês no hospital.

Pokrovsk, que já teve uma população de 60 mil pessoas, fica a 20 quilômetros das tropas russas, que se aproximam cada vez mais.

Moscou também tenta tomar uma estrada próxima que liga Pokrovsk a Kramatorsk, a maior cidade da região industrial de Donetsk, controlada pela Ucrânia.

A maternidade de Kramatorsk foi destruída.

A região tem estado sob controle das forças separatistas russas desde 2014 e sofreu vários ataques mortais às suas maternidades.

Entre eles, figura o brutal ataque do porto de Mariupol no início da guerra e o recente ataque a Selidove.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) afirma ter documentado pelo menos 1.170 ataques a instalações médicas ucranianas, que já mataram pelo menos 136 trabalhadores e pacientes.

- À luz do telefone -

“Com a estrada fechada, fica difícil enviar pacientes para o nosso centro”, disse Tsyganok.

As mulheres que vivem perto da linha da frente precisam pegar uma rota mais longa, por uma zona frequentemente atacada por drones e artilharia, afirmou.

O presidente Volodimir Zelensky pediu à população que abandonasse Donetsk e as autoridades têm realizado evacuações forçadas de algumas pessoas na linha da frente.

Ao ser questionado se estão pensando em transferir os pacientes ou fechar o hospital, o responsável afirma que entende "os riscos", "mas enquanto houver pacientes aqui, não podemos parar o nosso trabalho".

Ao passar por uma sala de cirurgia, Tsyganok aponta para os sacos de areia que cobrem as janelas para proteger os pacientes e médicos.

A eletricidade é outro problema. Os bombardeios da Rússia contra as usinas elétricas ucranianas reduziu pela metade a capacidade de produção de eletricidade do país, em comparação ao ano anterior. Os apagões são frequentes nas imediações da linha da frente.

“Tivemos um apagão no meio de uma cesariana delicada e tivemos de a terminar à luz dos nossos telefones porque havia um problema com o gerador”, conta ele.

A falta de pessoal também se tornou um problema.

“Alguns dos nossos enfermeiros vivem na linha da frente. Muitos foram embora”, disse Tsyganok.

“O povo é frequentemente bombardeado. A situação afeta os empregados e os pacientes”, acrescentou ele, afirmando ainda que o número de nascimentos prematuros na região de Donetsk "duplicou" desde a invasão russa em fevereiro de 2022.

- Desprotegidas -

“As mulheres que estão prestes a dar à luz precisam estar em um ambiente médico protegido. Que ambiente protegido pode haver em Avdiivka?”, questionou.

Em uma ala, Tetyana Pychuk olhava para o seu filho Timofiy, que tem só dois dias de vida.

A jovem de 31 anos é de Selidove, onde os bombardeios russos mataram uma mulher grávida em uma maternidade em fevereiro.

Ela passou a noite abrigada na relativa segurança do corredor do hospital, sob a ameaça de um ataque de mísseis russos.

“Houve bombardeios durante toda a minha gravidez”, recordou. Pychuk afirmou que sua filha mais velha nasceu há 12 anos e cresceu ao som dos combates entre o Exército ucraniano e os rebeldes pró-russos.

Quando perguntada por que razão deixou Selidove, as lágrimas correram pelo seu rosto antes de responder que foi “quando um conjunto de mísseis caiu em frente à sua casa”.

Ela se preocupa com a incerteza do futuro de seus filhos.

"Honestamente, não sei o que vai acontecer daqui a uma semana, daqui a 15 dias”, respondeu, enxugando as lágrimas.

O fechamento da maternidade seria “trágico” para os habitantes de Donetsk, segundo Tsyganok.

Os equipamentos e os pacientes teriam de ser transferidos para Dnipro, uma cidade a cerca de 200 km de distância que também enfrenta bombardeios aéreos esporádicos, uma viagem perigosa para uma mulher em trabalho de parto.

"Vamos evacuar [o local], mas ainda não sei quando", disse Tsyganok, acrescentando que os soldados estão lutando para que suas companheiras possam dar a luz aqui".

    AFP

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