Mais de 1,5 milhão de muçulmanos chegaram à cidade saudita de Meca para a grande peregrinação anual do Islã, ofuscada neste ano pela guerra em Gaza.
Embora os ritos oficiais do 'hajj' só comecem na sexta-feira (14), na Grande Mesquita de Meca, muitos fiéis vestidos de branco já começaram a dar voltas ao redor da Kaaba, a estrutura cúbica preta em direção à qual todos os muçulmanos rezam.
"É magnífico", disse Mariam Comate, uma mulher de 48 anos que viajou de Abidjan, na Costa do Marfim. "Quando vi a Kaaba pela primeira vez, fiquei estupefata", comentou.
Dados divulgados pelas autoridades sauditas, mais de 1,5 milhão de peregrinos chegaram do exterior à cidade sagrada do Islã, onde as temperaturas devem atingir 44ºC nos próximos dias.
A peregrinação à Meca é um dos cinco pilares do Islã, que todo fiel deve cumprir ao menos uma vez na vida se tiver os recursos para a viagem.
- "Ira" -
A celebração anual é ofuscada pela guerra entre Israel e Hamas na Faixa de Gaza, que começou em outubro com o ataque sem precedentes do movimento islamista palestino no sul do território israelense.
O conflito "provoca muita ira no mundo muçulmano" e pode gerar expressões de solidariedade que não serão do agrado de Riad, destaca Umer Karim, especialista em política saudita da Universidade de Birmingham, no Reino Unido.
A monarquia saudita anunciou esta semana que receberá como peregrinos quase mil parentes de vítimas da guerra, o que eleva a 2 mil o número de palestinos que estarão em Meca.
Ao mesmo tempo, o ministro responsável pelo evento, Tawfiq al Rabiah, advertiu que "nenhuma atividade política" será tolerada no hajj, que deve ser dedicado exclusivamente às orações.
Ao contrário de outros países muçulmanos, a Arábia Saudita nunca reconheceu Israel, mas a normalização das relações entre as nações estava em análise antes da guerra.
Mesmo depois do ataque de 7 de outubro e da ofensiva de represália israelense, Riad continua o diálogo com Washington sobre um eventual reconhecimento, agora condicionado à criação de um Estado palestino.
As autoridades tentarão "controlar a divulgação de qualquer mensagem ou manifestação política" que possa sair do controle e voltar-se contra a liderança saudita, afirma Umer Karim.
O hajj é uma fonte de legitimidade para os líderes sauditas, , cujo soberano ostenta o título de "guardião das duas mesquitas sagradas", em Meca e Medina.
E querem que o hajj "continue sendo uma plataforma para reforçar sua legitimidade no mundo muçulmano", afirma Madawi al Rasheed, opositor saudita baseado em Londres.
- "Proeza logística" -
Em 2023, mais de 1,8 milhão de muçulmanos participaram do hajj, quase 90% deles procedentes do exterior, essencialmente de países asiáticos e do mundo árabe.
A recepção de tantos fiéis em espaços pequenos é uma "proeza logística", destaca o professor Bernard Haykel, da Universidade de Princeton.
As autoridades implementaram sistemas para administrar o fluxo e evitar incidentes como o ocorrido em 2015, quando um grande tumulto deixou 2.300 mortos.
Também são aplicados processos para reduzir os riscos sanitários. Meca tem sido "historicamente um lugar de transmissão de doenças entre pessoas que chegam de diferentes partes do mundo", explica Haykel.
Mas um dos principais riscos para os fiéis, que cumprem a maioria dos ritos em locais abertos, será o clima, em uma das regiões mais quentes do mundo.
No ano passado, mais de 2 mil peregrinos sofreram problemas de saúde vinculados ao calor, de dores no corpo a crises cardiovasculares, segundo as autoridades sauditas.