Talibãs em um campo na província de Badakhshan, nordeste do Afeganistão, em 6 de maio de 2024
OMER ABRAR
Talibãs em um campo na província de Badakhshan, nordeste do Afeganistão, em 6 de maio de 2024
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Do céu, o Afeganistão é um aluno excelente na erradicação do ópio. Mas nos campos de papoulas, matéria-prima deste narcótico, os agricultores resistem às unidades antidrogas dos talibãs, às vezes pagando com as suas vidas.

O Afeganistão era o maior produtor mundial de ópio, mas sua produção caiu 95% em 2023, depois que o líder supremo talibã proibiu o cultivo de papoula em abril de 2022, segundo o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC).

O resultado, comemorado pela comunidade internacional, é espetacular do ponto de vista da luta contra as drogas, mas catastrófico para os agricultores, cujos rendimentos caíram 92%.

Na semana passada, produtores da província de Badakhshan, no nordeste do país, entraram em confronto com unidades antidrogas enviadas para destruir campos de papoulas coincidindo com a colheita.

A polícia relatou uma morte no distrito de Argo durante confrontos entre uma unidade talibã e agricultores "manipulados por conspiradores". Na segunda-feira, confirmou a morte de uma segunda pessoa no distrito de Darayim.

Em Argo, "as pessoas atiraram pedras e troncos de madeira" e "tentaram queimar veículos e equipamentos" para destruir colheitas, disse um porta-voz da polícia.

Moradores da região disseram à AFP que um agricultor foi morto por um talibã na semana passada em Darayim e outro em Argo.

O porta-voz do governo, Zabihullah Mujahid, lamentou os "acontecimentos trágicos", mas lembrou na rede social X que o decreto de erradicação do ópio inclui "todas as regiões, sem exceção".

- "Morte ao Emirado" -

Nem todos os produtores de papoula conseguiram dedicar-se a outros cultivos. Eles afirmam que alguns agricultores conseguiram salvar seus campos graças às boas relações com as autoridades talibãs.

Um morador de Argo contou à AFP, sob anonimato, como agiram membros da unidade antinarcóticos enviada para destruir as plantações. "Entraram nas casas (...) arrombando as portas", conta o homem de 29 anos. "Depois atiraram em quem resistiu (...), matando um deles e ferindo quatro".

Outro agricultor de 45 anos, também sob condição de anonimato, disse que "as forças de segurança invadiram as casas, insultando e espancando as pessoas".

Um terceiro morador disse que os talibãs entraram à força nas residências na sexta-feira, dia sagrado da semana muçulmana.

Um vídeo postado no X mostra dezenas de homens manifestando-se em Darayim, alguns parecem carregar um cadáver. "Morte ao Emirado!", grita a multidão, referindo-se ao nome oficial do país sob o domínio talibã: "Emirado Islâmico do Afeganistão".

Em outro vídeo gravado em Darayim, um dos manifestantes denuncia: "Semearam o pânico, foram selvagens". "Não temos nada contra o governo", acrescentou.

O Executivo talibã anunciou o envio de uma comissão para "uma investigação aprofundada" liderada pelo chefe do Estado-Maior dos exércitos, Fasihuddin Fitrat, originário desta região de Badakhshan.

Segundo mensagens publicadas nas redes sociais, os habitantes destes dois distritos, Argo, com maioria uzbeque, e Darayim, com maioria tadjique, reclamaram que os talibãs enviados para suas casas não falavam seu idioma.

- Culturas alternativas -

Como a proibição, disparou os preços do ópio em 124% em um ano, em março seus produtores esperavam ganhar entre 800 e 1.000 dólares por quilo (4.000 a 5.000 reais).

Estes enfrentamentos "poderiam indicar que agricultores carecem de recursos para suas necessidades básicas e que culturas alternativas poderiam ajudar", disse à AFP um funcionário do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime.

Batatas ou feijões poderiam ser opções. Mas o governo talibã culpa a comunidade internacional pela situação, que "deveria colaborar com o Emirado Islâmico propondo soluções alternativas".

"Infelizmente não houve colaboração", lamentou o porta-voz do governo à AFP em dezembro.

    AFP

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