O afegão Mohammed Ismali Nabizada chegou ao Brasil há uma semana entre milhares de refugiados que deixaram o Afeganistão, após volta do grupo radical do Talibã ao controle do país — que completou um ano este mês, com a saída das tropas americanas da região.
Nabizada e sua família, que recentemente ganhou uma nova integrante, de apenas um mês de vida, divide o chão do aeroporto com outros 250 afegãos em situação de refúgio, improvisada e com precariedade de recursos.
Eles passam as noites e os dias nos alojamentos montados com carrinhos de malas, colchões e cobertores recebidos por doações da prefeitura de Guarulhos ou de pessoas e cidadãos solidários nos corredores do Aeroporto Internacional de Cumbica, em Guarulhos, em São Paulo.
A vinda ao Brasil
As famílias afegãs que fugiram do Talibã são do grupo étnico chamado Hazara e seguem o Islam Xiita, uma minoria religiosa no Afeganistão. Eles são considerados uma ‘ameaça’ ao regime extremista do Talibã, que oprime os direitos das mulheres e qualquer grupo religioso que se opõe à sua ideologia radical.
Ismali Nabizada conseguiu embarcar para o Brasil com a mãe de 86 anos em cadeira de rodas, sua esposa, o filho e uma menina recém nascida de apenas um mês de vida. A família, após perder tudo em seu país, busca abrigo e trabalho no Brasil.
“Nós somos uma minoria religiosa no Afeganistão. Nós, povos Hazara, somos considerados inimigos pelo Talibã, pois somos Xiitas. A situação está muito perigosa, nossas escolas, mesquitas e templos foram destruídos com explosivos pelos grupos terroristas”, disse Nabizada.
A situação é de tamanha vulnerabilidade para essas pessoas que o número de vistos humanitários em embaixadas brasileiras no Irã e do Paquistão bateu recorde após medida emergencial do governo brasileiro editada no início da crise autorizando a entrega de visto humanitário aos afegãos.
Pedidos de vistos triplicaram
Nos três primeiros meses, 339 vistos foram concedidos e esse número chegou a triplicar nas últimas semanas. Hoje, após um ano da volta do Talibã ao poder, estima-se que cerca 2,8 mil pessoas originárias do Afeganistão vieram para o Brasil.
Ao todo, estima-se que 3 milhões de pessoas tiveram que deixar sua terra natal para fugir do Talibã.
Desde o início da política de acolhida aos afegãos, o Itamaraty informou que já foram autorizados 6.138 vistos humanitários a afegãs e afegãos cujas vidas estavam em risco em seu país.
No Posto de Atendimento Humanizado da prefeitura de Guarulhos , de janeiro até novembro, 1.360 cidadãos afegãos foram atendidos pelos assistentes sociais.
O engenheiro Noor Muhammad deixou o país sem ter como buscar seus pertences na escola em que trabalhava. A família chegou ao Brasil no mesmo dia em que o Talibã anunciou a volta de uma versão mais radical da sharia - a Lei Islâmica.
Muhammad contou à reportagem que pretende estudar a língua portuguesa e começar um programa de doutorado.
"Eu sou professor de planejamento urbano na universidade. Minha família, meus colegas, estão todos em situação de perigo e miséria. Está muito perigoso para eles. Agora, ter acesso à educação está mais difícil para todos, incluindo homens e mulheres", disse.
A voluntária do terceiro setor Aline Campos acompanha as famílias há dois meses no aeroporto e diz que a alta demanda exige maior atenção do poder público para encontrar abrigos para todos.
"A gente entende que foi uma demanda muito grande de pessoas e não tem espaço para todos. Não houve uma logística para essa povo chegar e ir para algum lugar. Então, tem se tentado acolhimento. Hoje mesmo saíram cinco família e dez solteiros que foram para um hotel acolhimento da prefeitura", conta.
Enquanto estão no aeroporto, a cidade de Guarulhos oferece alimentação diária com café da manhã, almoço e jantar, além de água e cobertores e o serviço prestado pelo posto de atendimento humanizado da prefeitura.
A prefeitura de Guarulhos também cirou a residência Transitória Todos Irmãos para Migrantes e Refugiados, com capacidade para abrigar 27 pessoas, que ampliou o número para outras 20 vagas especiais para pessoas com deficiência e gestantes.
O Itamaraty informou a maioria dos casos, a vinda ao Brasil é intermediada por organizações da sociedade civil, que os recebem e promovem sua integração local.
"Parcela minoritária não conta com esse apoio prévio da sociedade civil organizada e chega ao país em situação de vulnerabilidade", diz a nota.
Para quem desejar colaborar como voluntário na ajuda aos refugiados afegãos entre em contato na Central de Voluntariado de Guarulhos pelo WhatsApp (11) 99637-2799.
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