O PSDB coloca o seu futuro político em jogo nas prévias presidenciais que serão realizadas hoje. O vencedor entre os candidatos João Doria, governador de São Paulo; Eduardo Leite, governador do Rio Grande do Sul; e Arthur Virgílio, ex-prefeito de Manaus, terá o desafio de unir o partido em meio a uma série de fissuras deixadas pela disputa e dar uma cara nova à sigla, cujo protagonismo nacional ao vencer duas eleições presidenciais ficou no passado e hoje tem alas que flertam com o bolsonarismo. Além disso, o escolhido tucano terá a missão de convencer uma parte dos parlamentares, que sequer querem candidato a presidente.
Tucanos experientes reconhecem que o partido vive um cenário de vácuo de lideranças, além de desconexão entre o comando nacional e a bancada no Congresso — a maioria dos parlamentares é contemplada pelas emendas do orçamento secreto, como admitiu o presidente do partido, Bruno Araújo, em entrevista ao GLOBO na última sexta-feira. Essas lideranças esperam que as prévias abram um novo ciclo para o partido, a partir da participação de 44,7 mil filiados na escolha do candidato da legenda.
A disputa foi marcada por denúncias de fraudes, uso de verba pública como moeda de troca por apoio e até ataques abaixo da linha da cintura. Especialistas avaliam que a agressividade da campanha coloca em dúvida a possibilidade de união da sigla, e ainda veem uma dose de fragilidade para a construção de alianças para a terceira via em meio a uma provável entrada do ex-juiz Sergio Moro na corrida eleitoral. Doria e Leite patinam nas pesquisas de intenção de voto e, por enquanto, estão próximos do piso de Geraldo Alckmin nas eleições de 2018, que teve 4,7% dos votos, o pior desempenho da história da sigla.
— Unir o PSDB é um trabalho de Hércules. As prévias foram longe demais e se passou do ponto na guerra interna. O candidato derrotado terá dificuldade de pedir voto para aquele que acusou de mentir e fraudar o resultado — afirma o cientista político Claudio Couto, da FGV. — Embora Moro tenha rejeição, seu piso é maior que o dos tucanos. Já o Doria tem uma rejeição altíssima, enquanto Leite precisa se fazer conhecido.
Na visão de Marco Antônio Teixeira, professor de ciência política da FGV de São Paulo, o vencedor das prévias terá que dialogar internamente e fazer concessões tanto para conter debandadas, quanto para evitar que setores do partido façam campanha para o presidente Jair Bolsonaro em 2022.
No partido, a expectativa é que com uma eventual vitória de Doria, o ex-governador Geraldo Alckmin, hoje rival do paulista, seja o primeiro a sair. Há incerteza também sobre a permanência do deputado mineiro Aécio Neves, desafeto de Doria. Caso Leite seja o escolhido dos tucanos, não está descartada uma saída de Doria para concorrer ao Palácio do Planalto por outra sigla, embora o paulista negue essa possibilidade.
— O cálculo eleitoral vai empurrar todos para um acordo. Se Doria vencer, terá que fazer uma concessão a Aécio para conseguir fazer a campanha deslanchar em Minas Gerais, estado fundamental para ganhar a eleição. Já Leite também precisará chegar a um acordo com Doria e precisará do apoio de São Paulo — diz Teixeira.
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Internamente, uma das medidas administrativas defendidas para contribuir com a unidade seria o candidato escolhido agregar parte da equipe derrotada em sua campanha e estabelecer um comando inclusivo, com espaço para segmentos diversos do partido.
Cálculo dos deputados
Caciques lembram que a maior parte dos deputados está preocupada com a reeleição e questões regionais os aproximam de Bolsonaro em estados ruralistas e onde os evangélicos têm grande peso no eleitorado. Nesse sentido, a tese de não ter candidato ao Planalto, já tornada pública por Aécio, ganha força.
O ex-deputado Marcus Pestana, que integra a comissão das prévias, discorda da análise de que a votação interna ampliou divisões do partido e avalia que elas apenas ficaram mais expostas:
— A prévia é uma forma de tratar as divergências que já existem de forma democrática; a outra seria varrer para debaixo do tapete. A unidade vai depender da habilidade e talento do vencedor que terá que abrir conversas com as forças democráticas.
O presidente do PSDB, Bruno Araújo, adota raciocínio semelhante e frisa que o escolhido do partido precisará ter sabedoria para reconstruir pontes dentro e fora da sigla e cita o exemplo dos Estados Unidos, onde os candidatos brigam e depois se apoiam:
— O escolhido nas prévias vai estar legitimado para buscar unidade, mas não vai acontecer no dia nem na semana seguinte. As democracias mais maduras ensinam.