Uma carta elaborada por diplomatas e que circula neste sábado (27) em grupos fechados de funcionários do Itamaraty mostra que há insatisfação também dentro do Ministério das Relações Exteriores com Ernesto Araújo . O Congresso tem cobrado do presidente Jair Bolsonaro a demissão do chanceler , mas ele resiste a fazer a troca.
O manifesto dos servidores afirma que a gestão de Araújo nos últimos dois anos tem sido marcada por atos incompatíveis com as diretrizes da política externa brasileira, tanto nas relações com parceiros internacionais como na atuação para conseguir vacinas e outros produtos usados no combate à Covid-19 .
O documento não é assinado. A justificativa é que os servidores do Itamaraty não podem se expressar, devido à legislação em vigor, e temem sofrer retaliações que afetariam suas carreiras e vidas pessoais.
Segundo a carta, a presença de Ernesto Araújo no comando do Itamaraty é um "lamentável e anômalo intervalo na condução da política externa brasileira, cujo alcance a trágica pandemia de Covid-19 colocou a nu, da pior forma possível e a um custo intolerável".
O texto destaca, ainda, que as dificuldades evidenciadas pela pandemia de Covid-19 apenas descortinam os riscos de uma diplomacia "amadora, despreparada e personalista, dirigida por critérios fantasmagóricos". Os autores da carta alertam que esses riscos podem se traduzir em prejuízos concretos, "por vezes irreparáveis", à toda a sociedade brasileira.
A carta fala em agressões injustificadas contra países com os quais o Brasil mantém relações estratégicas e demonstrações de adesão a práticas inaceitáveis em uma democracia moderna, como nos comentários de Araújo, em redes sociais, sobre a invasão do prédio do congresso americano, no início deste ano, dias após a posse do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden . O chanceler condenou o ato, mas defendeu que fosse investigada a possível participação de elementos infiltrados entre os apoiadores do ex-presidente dos EUA, Donald Trump .
"Longe de corresponder a um programa de governo que pregou uma política externa 'livre de ideologias', a gestão do ministro Ernesto Araújo submeteu o acervo de princípios e tradições da diplomacia brasileira , construído ao longo de gerações, aos humores e ditames de uma ideologia facciosa, muitas vezes antidemocrática, que presta contas apenas a seus próprios seguidores".
A carta destaca que, por séculos, a política externa brasileira se caracterizou por pragmatismo e profissionalismo. Os resultados obtidos nas últimas décadas, diz o texto, são positivos, com ganhos comerciais, diversificação de mercados, credibilidade, respeito internacional e maior participação em instâncias decisórias.
As pressões para a troca do chefe da diplomacia crescem a cada dia. Na última quarta-feira, ao participar de uma sessão no plenário do Senado
sobre como o Itamaraty
tem agido para conseguir vacinas para a população brasileira, a maioria dos senadores pediu que Araújo deixasse o cargo.
A situação está indefinida, pois Bolsonaro insiste em manter o ministro. Na sexta-feira, o presidente questionou a Rodrigo Pacheco (DEM-MG) se a saída do assessor de assuntos internacionais da Presidência, Filipe Martins , seria suficiente para estancar a crise. No Congresso, porém, a visão é que o ministro não tem mais condições para continuar no cargo e que a diplomacia brasileira tem responsabilidade nas dificuldades encontradas pelo país para obter a importção de vacinas e insumos para a fabricação dos imunizantes .