Última candidata a ser entrevistada pelos apresentadores do Jornal Nacional, Marina Silva (Rede) respondeu, nesta quinta-feira (30), a questionamentos de William Bonner e Renata Vasconcellos sobre a difícil criação de seu partido, a Rede Sustentabilidade, defendeu o impeachment da presidenta Dilma Rousseff (PT), que em sua opinião “não foi golpe”, e justificou ao eleitor o apoio dado a Aécio Neves (PSDB) no segundo turno das eleições presidenciais de 2014.
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Num clima relativamente mais ameno – ao menos se comparada às participações de Ciro Gomes (PDT), Geraldo Alckmin (PSDB) e Jair Bolsonaro (PSL) – Bonner iniciou a entrevista questionando Marina Silva sobre a propalada “falta de posicionamento frente aos principais temas do país”, o que teria motivado a debandada de integrantes da Rede no início do ano.
A ambientalista respondeu que vê com naturalidade a saída de políticos de seu partido. Ainda assim, afirmou, o respeito mútuo continua imperando entre a Rede e os desertores, que seguem, de acordo com Marina, acreditando nos ideais do partido. A ex-ministra do Meio Ambiente na gestão Lula explicou, então, a razão da saída dos antigos integrantes: o impeachment de Dilma Rousseff.
“Ser líder não é ser o dono do partido. O líder é aquele capaz de dialogar com as diferenças. Na época, a maioria da Rede foi favorável ao impeachment, mas houve divergências. Quando firmamos a convicção de que o impeachment não era golpe, chegamos também à conclusão de que aquilo não iria dar certo – porque Dilma e Temer são farinha do mesmo saco. Os parlamentares saíram e nós mantivemos a relação de respeito”.
Bonner, então, em sua já tradicional interrupção dos entrevistados, passou um longo minuto “explicando” à Marina que não teria sido essa a razão de os políticos terem deixado a legenda – na avaliação do jornalista, eles abandonaram o partido pela falta de posicionamentos claros da candidata frente a um largo conjunto de temas.
“É inadequado imaginar que o líder do partido é o dono da legenda”, retorquiu Marina, para quem “liderar não é ter todo mundo debaixo do mesmo guarda-chuva”. A candidata, então, disse que pode vir a ser o “novo Itamar Franco”, formando um governo de transição até as eleições de 2022.
A jornalista Renata Vasconcellos quis saber, nesse ponto, qual era a posição da ambientalista sobre a reforma da previdência. A candidata sempre fala em diálogo, disse, mas raramente apresenta propostas concretas. Quais são?
“Eu assumo posturas”, disse. “Defendo a reforma da previdência com as seguintes diretrizes: encarar o problema da idade mínima” – novamente a senhora está sendo vaga, interrompe Vasconcellos. “Tem gente que se incomoda em debater”, prossegue Marina. “Quando alguém diz que vai fazer isso, soa estranho. Mas, numa democracia, isso é o normal. No problema da idade mínima, por exemplo, vamos manter a diferença de idade entre homens e mulheres”.
A candidata cita, aí, um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais que constatou que as mulheres realizam 80% das tarefas domésticas, o que embasaria a manutenção da idade mínima menor para a mulher na hora de se aposentar.
“Não se pode achar que algo que mexe com a vida de tantas pessoas será feito a toque de caixa. É preciso dialogar com os empresários, os líderes sindicais, o trabalhador comum”, disse. A partir daí, a candidata passou a criticar a proposta de Temer para a reforma da previdência.
Bonner questiona o apoio de Marina Silva a Aécio Neves em 2014
“Hoje, com as informações que vieram pela Lava Jato, eu não teria apoiado o Aécio. Mas nas eleições de 2014, a maioria das pessoas conscientes votaram em alguém no segundo turno. Mesmo com tudo o que começava a aparecer, escolhemos em alguém para votar. Hoje, sabendo de tudo, eu não votaria nem em Aécio nem em Dilma”.
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Bonner levantou, então, as citações em delações de ex-executivos da Odebrecht que apontam que o ex-governador de Pernambuco e pré-candidato à presidência em 2014, Eduardo Campos, teria recebido propina para sua campanha, da qual Marina fora vice.
“Há quatro anos o Eduardo estava sendo entrevistado no JN”, respondeu a candidata, “e no dia seguinte nós o perdemos em uma tragédia. A Justiça está investigando, e ele não tem como se defender. Mas eu não tenho compromisso com erros. Fui a única candidata a ir à Transparência Internacional, que nos enviou diversas propostas contra a corrupção. Sou a única que apoia a Lava Jato”.
Nesse ponto, Bonner corrigiu a candidata e afirmou que vários apoiam a Lava Jato. “Exato, agora estão me copiando”, diz Marina. “O Alckmin (PSDB) disse ontem (29), aqui no JN, que apoia a Lava Jato”, respondeu Bonner. “Justamente, você nomeou quem está me copiando”, arrematou a ambientalista.
Encaminhando o final da entrevista, Bonner quis saber se as alianças da Rede com candidatos do PT, PSDB e do “centrão” em diversos estados não pode soar oportunista, já que a candidata é critica ferrenha destes partidos. Marina acha que não.
“O que atesta a minha vida são mais de 30 anos de vida pública sem nenhum envolvimento com corrupção. Olhando da forma que você coloca, pode parecer assim ao telespectador. Mas pessoas boas existem em todos os partidos. Se formos olhar para os partidos, fica muito difícil qualquer tipo de diálogo político. Temos que olhar para as pessoas, para a história delas. Não vamos sacralizar partidos. Se eu ganhar, vou governar com os melhores de cada partido. Nossas alianças são programáticas, baseadas em histórias de vida”, disse.
Em sua vez de perguntar, Renata Vasconcellos questiona: a candidata deixou o PV por divergências com o partido, e agora tem um vice do PV em sua chapa. É coerente?
“Sim, continuo coerente. Eu e Eduardo Jorge [vice de Marina] nunca tivemos divergências. Não posso querer impor a cultura partidária da Rede aos demais partidos. Temos que focar em nossas convergências. Incoerência é fazer aliança em troca de tempo de televisão e em troca de dinheiro”.
Mas, se eleita, como dialogar, por exemplo, com a crescente bancada ruralista?
“Muita gente trata o agronegócio como se ele fosse homogêneo, e ele não é. Hoje em dia já tem muitos agricultores fazendo o seu dever de casa, em relação a uma agricultura de baixo carbono. Fui ministra do meio ambiente e dialogava com todos os partidos e todas as bancadas”, respondeu a candidata.
Marina Silva partiu, então, para as considerações finais. “O Brasil que eu quero é um país aonde nenhuma pessoa tenha que passar pela humilhação de não ter o trabalho para sustentar sua família. Sou mulher, negra, fui seringueira, empregada doméstica, me alfabetizei. Trago mais que um discurso, trago uma trajetória, e o compromisso de construir um país que seja justo para todos. As pessoas me admiram como exceção, mas não quero um país de exceção, mas um país de regras, e ambientalmente sustentável”.
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