Dor Shachar, de 46 anos, nasceu em Khan Yunis, na Faixa de Gaza, mas fugiu para Israel e se converteu ao judaísmo ainda jovem. Hoje, ele vive em Rishon LeZion e relatou como era sua vida quando criança, morando no enclave, e mais tarde, ao conseguir se refugiar em território israelense e se tornar um cidadão.
"Em Gaza, não há cidadãos que se oponham ao Hamas. Se necessário, eles assassinarão judeus, cristãos e até muçulmanos", disse ele em entrevista ao jornal Maariv. "Em Gaza, eles são afiliados a organizações como Hamas, Jihad Islâmica, Fatah, Frente Popular para a Libertação da Palestina [FPLP] e outras. Todas essas organizações apoiam o assassinato de judeus. Algumas dessas organizações se infiltraram a Faixa de Gaza. Esta é uma guerra religiosa; eles querem dominar o mundo inteiro."
De acordo com Shachar, ainda criança ele teria aprendido que os judeus eram mortos porque tomaram as terras de seus ancestrais e que, dentro de Gaza, os israelenses eram vistos como "perigosos". Ele relatou que foi instruído, com ainda 6 anos, a não se aproximar de militares israelenses e a não aceitar nada vindo deles.
Em outra memória, Shachar se lembrou de, aos 7 anos, ter ficado animado pois tinha recebido a notícia de que teria uma aula especial na escola. Quando o novo professor chegou, ele disse que o docente começou a dizer que os judeus eram assassinos de crianças, homens, mulheres e idosos.
O professor, à época, teria dito às crianças: "Os judeus tomaram as terras do seu avô, e você lutará por elas, e quem morrer será um mártir e irá para o paraíso. Ele também disse que os judeus tinham três pernas."
Shachar afirmou ter sido perturbador receber esse tipo de informação tão jovem, especialmente vindo de uma figura de autoridade.
"Minha felicidade se transformou em pesadelo e eu disse ao professor que não me sentia bem. Ele me deu um tapa na bochecha e me levou para a sala do diretor. O diretor pediu para eu ficar de frente para a parede e me deu um tapa com uma mangueira de borracha, que queimou. Exigiu que meu pai fosse comigo para a escola. No dia seguinte, meu pai foi comigo até a sala do diretor. Ele me repreendeu e me disse que eu precisava matar judeus."
A ideologia, segundo ele, também vinha de casa. De acordo com Shachar, o pai dele trabalhou em Israel por 27 anos, mas, mesmo assim, defendia o assassinato de judeus. Ele disse que também já foi ameaçado pelo pai caso tentasse contrariar a forma como ele achava que ele devia se comportar.
Mesmo assim, Shachar afirmou não ter atendido a essas exigências. "Sinto-me como um mensageiro do povo judeu. Minha missão é alertar os judeus sobre os perigos. Somos todos mensageiros neste mundo."
O primeiro contato mais direto que teve com Israel, segundo ele, foi aos 11 anos, quando embarcou em um ônibus em direção ao país sem que os pais dele soubessem. Ao fim do dia, já em casa, disse ter sido questionado pelo pai onde ele esteve, mas mentiu.
"Ele sabia que eu tinha estado em Israel, porque as pessoas no ônibus tinham contado a ele", disse.
Mais tarde, aos 13 anos, ele decidiu fugir de casa e só voltou à Gaza aos 19 anos. Em território israelense, ele encontrou um emprego em uma obra, onde conheceu Nissim, que mais tarde se tornaria seu pai adotivo. Hoje, Shachar tem outra família adotiva, mas mantém contato com as duas.
Após ser adotado por Nissim, Shachar decidiu se converter ao judaísmo.
"Eu disse a ele que queria ser judeu. Ele disse: 'Espere, o que você disse?' e eu repeti as palavras. Ele ficou surpreso com o que saiu da minha boca. Ele me disse que quem é judeu continua judeu, quem é muçulmano continua muçulmano e quem é cristão continua cristão, mas eu não aceitei", contou.
“Nissim entendeu minhas intenções e marcou uma reunião com o rabino, que concordou em me converter, mas exigiu uma carta especial da família, porque eu era menor de idade. Expliquei que não tinha contato com a minha família e que, se pedisse a eles essa carta, eles iriam me matar. Ele me aconselhou a esperar até completar 18 anos. Fiquei desapontado", relatou.
"Um ano depois, aos 17 anos, um palestino assassinou uma menina chamada Helena Rapp em Bat Yam [em 1992], chocando todo o país. O governo decidiu expulsar todos os árabes para que não houvesse vingança. Cada vez que via a polícia, eu fugia. Depois de três ou quatro meses, o governo decidiu trazer trabalhadores com mais de 40 anos, o que significou que me tornei um trabalhador ilegal", continuou.
Aos 18 anos, ele voltou a procurar um rabino, que afirmou que, devido à situação de segurança, ele precisava de uma permissão especial do Estado para ficar no país. Ele relatou, inclusive, ter sido peso por policiais que faziam patrulha próximo ao canteiro de obras em que ele trabalhava.
"Eu disse a eles que queria ser judeu. Eles me levaram de volta ao canteiro de obras e me disseram para ficar lá. Eles me deram um número de telefone e me disseram que se eu visse árabes ilegais, deveria denunciá-los, e concordei. Eles enfatizaram que se outro oficial chegasse, eu deveria dizer que era de Kafr Qasim porque eles foram autorizados", acrescentou.
No relato, Shachar disse que, em outra ocasião, já com 19 anos, foi preso novamente e acabou indo parar na Justiça. Na ocasião, foi condenado a 45 dias de prisão e um adicional de 10 meses e, ao ser detido, foi espancado dentro da cela. Ao ser transferido para outra prisão, ele disse ter sido torturado.
Quando terminou de cumprir a pena, trabalhou em Gaza para juntar dinheiro e fugir do enclave novamente.
Desta vez, Shachar conseguiu um emprego de segurança em um shopping center. Sete anos depois, recebeu aprovação para estudar o Judaísmo e se converter. Ele recebeu um número de identificação israelense e um cartão.
Questionado sobre o nome hebraico que escolheu adotar, ele disse que "Dor representa paz e bondade, e Shachar significa manhã". Shachar escreveu um livro sobre sua vida, chamado “From Khan Yunis to Mount Sinai”, e fez palestras sobre o assunto.
Ele ainda afirmou que sua família é a que está em Israel com ele e que, caso alguma coisa acontecesse com sua família biológica, ele "não se incomodaria".