Alexandre de Moraes e Bolsonaro: Quais os motivos dos atritos?

Moraes foi foi indicado para o STF em 2017, na vaga aberta após o falecimento do ministro Teori Zavascki em um acidente aéreo

Foto: Antonio Augusto/Secom/TSE
Como o ministro Alexandre de Moraes ganhou protagonismo no cenário

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF)  Alexandre de Moraes ganhou protagonismo no cenário político nacional recente, principalmente por conta das diversas crises institucionais em razão dos atritos com o  presidente Jair Bolsonaro (PL).

Antes de falar sobre os conflitos entre ambos, vamos entender a origem de Alexandre de Moraes e como ele chegou até o Supremo.

Moraes se formou em Direito, no ano de 1990, pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, da Universidade de São Paulo (USP). Em 1998, tornou-se professor da Escola Superior do Ministério Público de São Paulo.

Ele ingressou no Ministério Público de São Paulo (MP-SP) como promotor em 1991, no qual exerceu diversas funções. Moraes ficou no cargo até 2002, quando deixou o MP para assumir a Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo, nomeado pelo então governador Geraldo Alckmin, hoje vice na  chapa de Lula.

O atual ministro permaneceu nesse cargo até 2005. Durante esse período foi também, de 2004 a 2005, foi presidente da Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor (FEBEM/SP), que depois passou a se chamar Fundação CASA.

A partir de abril de 2005, ele nomeado pelo então Presidente da República,  Luiz Inácio Lula da Silva, para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no qual permaneceu até 2007.

Foto: Marcos Corrêa/PR
O ministro do STF Alexandre de Moraes e o presidente Jair Bolsonaro em 2019

Ele saiu do CNJ, em 2007, para assumir um cargo de Secretário Municipal de Transportes de São Paulo, acumulando ainda as presidências da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) e da São Paulo Transportes (SPTrans). Em fevereiro de 2009, foi nomeado titular da Secretaria Municipal de Serviços de São Paulo, funções que exerceu até junho de 2010.

Em dezembro de 2014 foi nomeado pelo governador Geraldo Alckmin para cargo de Secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo, onde permaneceu até até 12 de maio de 2016, quando deixou o cargo para assumir o Ministério da Justiça do governo interino do vice-presidente Michel Temer, que assumiu a Presidência após a abertura do processo de impeachment de  Dilma Rousseff (PT).

No dia dia 31 de agosto de 2016, quando o Senado aprovou o impeachment de Dilma, Michel Temer foi efetivado no cargo e Alexandre de Moraes foi mantido na pasta da Justiça.

No dia 6 de fevereiro de 2017, foi indicado pelo presidente Michel Temer para o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), na vaga aberta após a morte do ministro Teori Zavascki em um acidente aéreo.

Polêmicas

Por conta do histórico de atuação em cargos políticos, a indicação de Alexandre de Moraes foi criticada por diversos políticos e figuras públicas que falavam que a escolha dele era político-partidária. A polêmica girava em torno de uma possível associação de Moraes com o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB).

Porém, ministros que já estavam no STF, como Marco Aurélio Mello, Gilmar Mendes e Luiz Fux consideraram que a carreira de Alexandre de Moraes não configuraria empecilho e que a nomeação poderia acontecer.

Com o aval, Moraes foi sabatinado na Comissão de Constituição e Justiça do Senado no dia 21 de fevereiro e teve seu nome foi aprovado para o cargo de ministro do STF por 19 votos a favor, 7 contras e 1 abstenção. No dia seguinte, o plenário do Senado aprovou definitivamente sua indicação para o Supremo, com 55 votos favoráveis e 13 contrários. No mesmo dia, foi exonerado do Ministério da Justiça e nomeado para o STF pelo presidente Temer.

Moraes x Bolsonaro 

Alvo preferido do bolsonarismo e do próprio presidente, Alexandre de Moraes ganhou um capítulo a parte na gestão do atual presidente. Não faltaram oportunidades para Bolsonaro criticar a acusar o ministro. O presidente já chegou a chamar Moraes de "canalha" e defender que ele fosse "enquadrado".

"Qualquer decisão do senhor Alexandre de Moraes esse presidente não mais cumprirá. A paciência do nosso povo já se esgotou. Ele tem tempo ainda de pedir o seu boné e ir cuidar da sua vida", disse Bolsonaro, diante de apoiadores em São Paulo, na comemoração do feriado de 7 de setembro.

Para especialistas, algumas podem ser as respostas para entender por qual motivo Bolsonaro escolheu Moraes como seu principal 'alvo'. Entre os principais motivos podemos citar o fato do ministro comandar inquéritos que investigam o presidente. Além disso, Alexandre de Moraes já foi responsável pela prisão e bloqueio de recursos de aliados de Bolsonaro.

Entre as investigações que miram o presidente está o 'inquérito das fake news', aberto em 2019 pelo então presidente do STF, Dias Toffoli, para investigar a divulgação de notícias falsas e ameaças a ministros do tribunal.

Moraes também é relator do inquérito das 'milícias digitais', que investiga indícios de uma organização criminosa montada para atentar contra a democracia e as instituições. Uma das suspeitas é de que o grupo tenha sido abastecido com verba pública.

Para Leandro Consentino, professor de ciência política do Insper, o fato de Moraes ser um ministro de origem mais política acaba fazendo com que Bolsonaro se sinta mais "ameaçado", uma vez que o Supremo poderia estar atrapalhando o presidente executar os pontos que gostaria.

Outro ponto destacado pelo especialista é o fato de Moraes presidir o TSE. Fato que já era público, uma vez que o processo sucessório do TSE, normalmente, referenda o vice-presidente do tribunal, como era o caso de Alexandre de Moraes, ao cargo de presidente posterior. 

Leandro acredita que o bolsonarismo, ao saber que Moraes viria a se tornar o presidente do TSE, ajudou a endossar o discurso contra o sistema eleitoral e urnas eletrônicas. 

"Também cabe muito bem à narrativa do bolsonarismo dizer que o sistema eleitoral é duvidoso e que pode prejuducar Bolsonaro, já que um ministro como esse está à frente da corte eleitoral. Já se sabia que ele (Moraes) estaria nessa posição, então já se cria esse ambiente de animosidade para que se algo aconteça, como uma derrota de Bolsonaro na eleição, já se tenha alguém para culpar", afirma.

E completa: "O fato do ministro também ter aglutinado varíos processos contra Bolsonaro, principalmente referente às fake news, acho que atiçou parte da base bolsonarista contra o perfil dele. A reunião dessas três coisas acho que fez o Alexandre de Moraes se tornar o inimigo clássico do bolsonarismo".

Novo desafio no TSE 

Foto: Reprodução: TSE
Cerimônia de posse do ministro Alexandre de Moraes

Nesta última terça-feira (16), o ministro também  assumiu a função de presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e vai ser o responsável por conduzir uma das eleições presidencias mais instáveis da história recente do país. 

Durante o discurso de posse, Moraes falou diante do presidente Jair Bolsonaro, que já atacou e criticou, sem provas, o sistema eleitoral diversas vezes. O ministro condenou os discursos de ódio e quem usa o argumento da 'liberdade de expressão' para disseminá-los.

"Tomo posse no honroso cargo de presidente do TSE com os mesmo ideais com os quais iniciei minha formação acadêmica pela tradicional faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em 1976: Respeito a Constituição Federal, devoção aos direitos e garantias fundamentais, realização de uma justiça rápida, efetiva e eficiente, fortalecimentos das instituições e concretização e aperfeiçoamento da democracia, pressupostos essenciais para o desenvolvimento do Brasil".

Em outro momento do discurto, Moraes reiterou a defesa da democracia no país. "A Justiça Eleitoral atua com competência e transparência, honrando a sua histórica vocação de concretizar a democracia, e autêntica coragem para lutar contra as forças que não acreditavam no Estado Democrático de Direito, e pretendiam, à época de sua instalação, continuar capturando a vontade soberana do povo, desvirtuando os votos que eram colocados nas urnas", disse o ministro.

Para Renato Ribeiro de Almeida, advogado especialista em direito eleitoral e doutor em direito do Estado pela USP, "caberá ao ministro Alexandre de Moraes presidir as eleições que, provavelmente, serão uma das mais contestadas, judicializadas e polarizadas no Brasil".

"É importante destacar que a polarização é natural dentro de uma democracia, mas nós temos desafios envolvendo a contestação de urnas, a contestação da própria Justiça Eleitoral e, especialmente, a disseminação de fake news. O ministro terá o desafio de presidir as eleições nesse contexto conturbado", afirmou o especialista.

Apesar da análise de polarização, Renato analisou que a possa de Moraes neste momento tende a ser boa, por conta do perfil mais institucional do ministro. 

"Eu ressalto que o ministro tem também uma característica de muita institucionalidade, de preservação das instituições e muita sobriedade nas suas decisões. Então, eu vejo como positiva, nesse momento, a posse do ministro Alexandre de Moraes e entendo também que o TSE está cada vez mais preparado para lidar com adversidades".

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