Entre os argumentos usados para recuperar seus direitos políticos, o ex-presidente da Câmara e deputado cassado Eduardo Cunha (PTB-SP
) usou uma decisão e um parecer do atual mandatário da Casa, Arthur Lira (PP-AL), para conseguir o aval do Judiciário e se candidatar neste ano.
No mês passado, em decisão liminar, o desembargador Carlos Augusto Pires Brandão, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), suspendeu os efeitos da punição a Cunha por quebra de decoro.
Em 2016, o então peemedebista perdeu o mandato por ter mentido sobre a existência de contas na Suíça. Ele deveria ficar inelegível até 2027, segundo a Lei da Ficha Limpa. Mas foi favorecido pelo julgamento do TFR-1 ao questionar possíveis ilegalidades cometidas durante o julgamento político. Cunha pretende concorrer à Câmara pelo PTB de São Paulo, partido de Roberto Jefferson, mas ainda pode sofrer revés no mesmo processo, que deverá ser analisado em plenário da Corte.
Para se livrar da sanção, o ex-deputado se valeu de um precedente aberto por Lira em agosto do ano passado, durante o julgamento da deputada Flordelis, acusada de mandar matar o marido. Arthur Lira mudou o formato da votação da perda de mandato. Até então, os parlamentares analisavam, em plenário, o próprio parecer do Conselho de Ética sobre o investigado. Mas os deputados passaram a apreciar um projeto de resolução (outro instrumento legislativo) para definir o futuro dos colegas.
A partir desse novo entendimento da Câmara, Cunha recorreu ao Judiciário, em setembro, alegando que o rito antigo, ao qual foi submetido, cerceava o seu direito de defesa. Isso porque o plenário não podia alterar as punições sugeridas em parecer do Conselho de Ética no momento da votação pela cassação.
Com a manobra de Lira, é possível apresentar emendas ao projeto de resolução e alterar a punição recomendada pelo conselho. No caso de Cunha, por exemplo, se estivesse em vigor a decisão do atual presidente da Câmara, um aliado poderia sugerir a suspensão do mandato para livrá-lo cassação.
Na decisão, Brandão citou ainda um parecer de 2016 redigido por Lira em nome da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Na ocasião, o então presidente da Casa, Waldir Maranhão, fez uma consulta para que fosse esclarecido o rito do processo de cassação. Lá, Lira já apresentava os mesmos argumentos. Ao responder se a cassação deveria ser analisada por meio de apresentação de um projeto de resolução, Lira disse que era "exatamente o caso".
"Há também aqui, conforme entendimento exarado em documento da própria Câmara dos Deputados (parecer de Lira), plausibilidade jurídica do direito do recorrente, ao alegar afronta ao devido processo ante a incongruência entre o procedimento previsto pela legislação e aquele aplicado em seu caso", escreveu o desembargador.
Aliado de Cunha, Lira trabalhou para retardar o processo de cassação em 2016. No início do mês, o Ministério Público Federal (MPF) recorreu da decisão liminar que favoreceu o ex-presidente da Câmara.
Na Justiça, para conseguir recuperar seus direitos, a defesa de Cunha usou outros argumentos, como a alegação de que a informação de que ele teria conta na Suíça, repassada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) à Câmara, deveria estar protegida pelo sigilo fiscal e bancário. Assim, o compartilhamento da informação só poderia ter ocorrido com autorização judicial, o que não aconteceu.
Em sua decisão, o desembargador avaliou que, numa primeira análise, "parece assistir razão" a Cunha, uma vez que, no processo, não houve "qualquer menção a eventual autorização judicial para quebra de sigilo".
A defesa também alegou outros problemas na condução do processo. Na decisão, o desembargador levou em conta o argumento de que o relator do processo de cassação, o então deputado e hoje senador Marcos Rogério (PL-RO), incluiu outras acusações, como o recebimento de vantagens indevidas, sem que isso tenha sido apurado devidamente na Câmara.
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