A concentração de poderes do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) na campanha do pai começa a gerar dificuldades no projeto de reeleição do presidente Jair Bolsonaro. Apesar de ter ao seu lado políticos experientes, como o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, e o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, cabe a Flávio, homem de confiança do titular do Palácio do Planalto, a tarefa de tomar as principais decisões e convencê-lo a chancelar as ideias do grupo.
A arrecadação de recursos, a montagem de palanques nos estados, o plano de governo e até mesmo a administração de conflitos envolvendo o irmão Carlos Bolsonaro. Tudo precisa passar pelo filho mais velho do presidente, uma vez que Bolsonaro já deixou claro não confiar totalmente nos aliados.
A avaliação de integrantes da campanha é de que, apesar de a relação de Flávio com o restante da equipe estar azeitada, o acúmulo de funções, associado ao papel de articulador político do governo no Senado, tem atrasado algumas definições. O programa de governo, por exemplo, que está sob o guarda-chuva do senador, avançou pouco até agora. Enquanto isso, adversários, como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), já apresentaram propostas para um eventual governo.
Reforço para campanha
O total controle nas mãos de Flávio, contudo, é uma decisão do presidente, que costuma desconfiar de pessoas que não sejam do seu clã. Em 2018, o coordenador da campanha foi o advogado Gustavo Bebianno, morto em março de 2020. Ele deixou o governo com menos de dois meses de gestão, após acumular atritos com Carlos, e se tornou desafeto do presidente.
Ao jornal O Globo, Flávio diz que o acúmulo de funções não atrapalha a execução das tarefas.
"Não sou general de nada. A decisão é sempre do presidente. Só levo a ele as demandas, pela proximidade natural", justificou.
Apesar de o senador negar estar sobrecarregado, o time que trabalha pela reeleição de Bolsonaro ganhou reforços nos últimos dias para poder redistribuir tarefas antes concentradas em Flávio. O ex-ministro da Defesa Walter Braga Netto, por exemplo, ganhou status de subcoordenador da campanha. Confirmado como vice na chapa, o general tem entre suas missões organizar informações do governo para elaborar propostas para um segundo mandato.
A partir de amanhã, Braga Netto passará a despachar na casa alugada para ser o QG da campanha, no Lago Sul, área nobre de Brasília. O militar, que deixou o cargo de assessor especial da Presidência na sexta-feira, também ficará responsável por organizar as viagens do candidato pelo país.
Outro a ser incorporado à equipe é o ex-chefe da Secretaria de Comunicação da Presidência Fabio Wajngarten. Apesar de ter o retorno ao governo anunciado pelo próprio presidente há algumas semanas, houve resistência por parte de aliados de Bolsonaro, e ele acabou ganhando função apenas na campanha. Será responsável pela área de comunicação e, segundo interlocutores, ajudará também no contato com empresários.
Quando ainda estava no governo, Wajngarten atuou na gestão da crise causada pelas denúncias de “rachadinha” no gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. A investigação foi anulada pela Justiça, mas o caso ainda é visto por aliados como um possível “teto de vidro” do filho do presidente, que passou um tempo longe dos holofotes antes de virar o homem forte da campanha do pai.
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Além do acúmulo de funções, Flávio também passou de fonte de escândalo para gerente de crises. Na semana passada, por exemplo, foi o responsável por levar ao pai a avaliação de que era preciso agir rápido após as denúncias de assédio sexual envolvendo o então presidente da Caixa, Pedro Guimarães.
Próximo de Bolsonaro, o executivo teve a demissão confirmada apenas um dia depois de relatos de funcionárias terem sido publicados pelo site Metrópoles. O temor do núcleo político era de que, caso a situação não fosse resolvida logo, a repercussão negativa poderia respingar no presidente, com reflexos na disputa eleitoral.
A crise envolvendo denúncias de assédio sexual atropelou outra missão à qual Flávio estava dedicado: a de evitar o avanço da CPI do MEC, após senadores da oposição conseguirem o número necessário de assinaturas, na terça-feira. O objetivo dos parlamentares que defendem a instalação do colegiado é investigar suspeitas de corrupção na pasta durante a gestão do ex-ministro Milton Ribeiro.
PEC Eleitoral
Na manhã de quarta-feira, coube ao filho do presidente a tarefa de ir até a casa do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para tentar convencê-lo a não instalar a CPI, que tem potencial de desgastar a imagem de Bolsonaro em plena campanha eleitoral. Saiu de lá com a promessa de que a questão só seria resolvida nesta semana.
Flávio, que é líder do PL no Senado, também precisou se empenhar na negociação para aprovar a chamada PEC Eleitoral, que dribla vedações legais para permitir ao governo oferecer um “pacote de bondades” a três meses da disputa eleitoral. A medida é vista pela campanha como tábua de salvação para o projeto de reeleição de Bolsonaro.
Do plenário, o parlamentar negociou mudanças no texto e disse ter até mesmo ligado para o pai pedindo que ele “entrasse no circuito” para convencer o ministro da Economia, Paulo Guedes, a dar aval a pontos doprojeto que atropela regras fiscais em favor do “vale-tudo eleitoral”.
Os assombros da campanha
Escândalo do MEC
Sempre que possível, Bolsonaro tenta empregar o discurso do combate à corrupção como marca de seu governo. Recentemente, porém, o presidente se viu no centro do escândalo no Ministério da Educação. Antes de ser preso, o ex-ministro Milton Ribeiro (na foto ao lado do pastor lobista Gilmar Santos, ao microfone) foi gravado admitindo que fora alertado sobre a operação policial — o que seria “um pressentimento” de Bolsonaro.
Eleitorado feminino
Uma das fragilidades encontradas pelo presidente é a baixa popularidade entre as mulheres. Casos recentes tornam ainda mais preocupante essa rejeição, como o escândalo de assédio na Caixa. Ex-presidente do banco e figura constante nas lives do presidente, Pedro Guimarães (foto) é acusado de assediar funcionárias. Bolsonaro também foi condenado por fazer comentários misóginos contra a jornalista Patrícia Campos Mello.
Crise econômica
A alta da inflação e dos combustíveis fez com que o governo atuasse de forma desesperada para conter os danos eleitorais. A praticamente três meses do pleito, o Senado aprovou uma Proposta de Emenda à Constituição que dá espaço para mais de R$ 40 bilhões para colher dividendos eleitorais. A ideia é abrir os cofres e aumentar o Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600, além de conceder um vale de R$ 1 mil a caminhoneiros.
Investigações contra os filhos
Investigações que têm os filhos como alvo também preocupam a campanha. O Ministério Público apura suspeitas de “rachadinha” nos gabinetes de Flávio, na Assembleia do Rio de Janeiro, e de Carlos (foto), na Câmara Municipal. Eduardo, por sua vez, está na mira do inquérito que apura a atuação de organizações criminosas na propagação de fake news, enquanto Jair Renan, o mais novo, é suspeito de tráfico de influência.