José Dirceu volta à cena em articulações na pré-campanha de Lula

Ex-ministro costura acordos em palanques regionais, coleciona encontros com atores principais da política nacional e opina até nas movimentações de Alckmin

O ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu
Foto: Divulgação/PT
O ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu

Vinte anos depois de comandar a vitoriosa campanha de Luiz Inácio Lula da Silva ao Palácio do Planalto, o ex-ministro José Dirceu volta à cena para tentar levar mais uma vez o PT à Presidência. Em uma agenda paralela à pré-campanha petista, o ex-todo-poderoso chefe da Casa Civil mantém conversas com os principais atores do cenário político nacional, inclusive com o pré-candidato a vice na chapa petista, o ex-tucano Geraldo Alckmin.

O ex-ministro tem discutido até as estratégias para a atuação do paulista. Dirceu defende que Alckmin se dedique a agendas com pequenos e médios produtores rurais e empresários do agronegócio do interior de São Paulo e do Centro-Oeste. O ex-ministro acompanhou de perto as negociações para que o ex-governador virasse vice. Segundo um dos principais articuladores da união, Dirceu foi um dos primeiros a saber da ideia de juntar Lula a um de seus ex-adversários.

Alguns aliados argumentam que é chegada a hora de Dirceu assumir publicamente o papel de articulador político da pré-candidatura de Lula, até como uma forma de se antecipar aos ataques que partirão dos bolsonaristas quando a campanha começar. O ex-ministro passou, no total, mais de quatro anos na cadeia desde 2013 em diferentes períodos. Ele está com direitos suspensos e tem duas condenações na Operação Lava-Jato.

Até o momento, o ex-ministro evita os eventos públicos da pré-campanha ou, quando vai, se mantém discreto. Na celebração do 1º de Maio das centrais sindicais em São Paulo, com a participação de Lula, optou por ficar no meio do público.

Nos estados

Nas últimas semanas, o ex-ministro vem se dedicando também a tentar resolver os problemas dos palanques de Lula nos estados. Tomou para si, por exemplo, a responsabilidade de solucionar o impasse da disputa no Rio, onde Alessandro Molon (PSB) e André Ceciliano (PT) brigam pelo posto de candidato ao Senado da chapa que deve ter Marcelo Freixo (PSB) na corrida pelo governo. Ainda para tratar do cenário no estado, o ex-ministro esteve com o prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD).

Em São Paulo, já teve contatos com Márcio França, pré-candidato do PSB que o PT tenta tirar da disputa pelo governo. Dirceu se orgulha de conhecer detalhadamente a situação do PT em cada um dos estados. No passado, as suas movimentações políticas já incomodaram Lula e a presidente do PT, Gleisi Hoffmann.

Dirceu também mantém relação estreita com integrantes da coordenação da pré-campanha de Lula, como o senador Jaques Wagner (BA) e o ex-governador do Piauí Wellington Dias.

O ex-ministro já afirmou anteriormente que não tem delegação da direção partidária para fechar acordos políticos e sabe que muitas vezes ajuda Lula ao ficar distante. Ele tem evitado conversas diretas com o ex-presidente, como forma de preservá-lo. Os dois se falaram pela última vez em abril. Segundo interlocutores, Dirceu consegue saber o que o ex-chefe está pensando mesmo sem conversar com ele. O ex-ministro foi procurado, mas disse que não comentaria.

Dirceu ainda mantém diálogo constante com presidentes de partidos. No mês passado, esteve com Carlos Siqueira, do PSB, principal aliado do PT na disputa presidencial. Siqueira chegou a postar foto do encontro nas redes sociais. Gilberto Kassab, do PSD, também é seu interlocutor frequente. Até Valdemar Costa Neto, presidente do PL, partido de Bolsonaro, mantinha até o fim do ano passado conversas com o ex-chefe da Casa Civil de Lula.

Dirceu faz também a ponte dos petistas com alguns governadores bolsonaristas, como Ratinho Junior (PSD), do Paraná, e Wilson Lima (União Brasil), do Amazonas. Nesses casos, o ex-ministro trabalha para que eles deem apenas um apoio protocolar ao atual chefe do Executivo.

“O último réu”

O ex-ministro tem afirmado não ter expectativa de trabalhar no governo se Lula for eleito. A aliados, queixa-se de perseguição política por parte da Justiça e se considera o “último réu” da Lava-Jato por não ter conseguido anular suas sentenças como outros condenados famosos. Reclama ainda de ter seu registro profissional de advogado na OAB ainda cassado, o que o impede de trabalhar.

Ele recebe uma aposentadoria parcial de R$ 9.646,57 pelo período em que exerceu mandatos de deputado federal — foi eleito em 1990, 1998 e 2002.

Em abril, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a condenação de Dirceu em 27 anos de prisão pelos crimes de associação criminosa, corrupção ativa e lavagem de dinheiro. Em outro processo, ele foi condenado em segunda instância a 30 anos de prisão. Em ambos os casos, recorre em liberdade. A defesa alega prescrição dos crimes para anular as sentenças.

"A simbologia que o José Dirceu representa é muito forte. Absolver qualquer réu da Lava-Jato passa despercebido, é mais um réu, já o José Dirceu não tem o mesmo condão", afirma o advogado Roberto Podval, que defende o ex-ministro.

Em maio, durante o lançamento da sua pré-candidatura, Lula falou publicamente sobre Dirceu quando comentava a possibilidade de a ex-presidente Dilma Rousseff participar de um novo governo:

"Você vai levar a Dilma para o ministério, vai levar o Zé Dirceu? Nem vou levar, mas jamais a Dilma caberia no ministério porque a Dilma tem a grandeza de ter sido a primeira mulher a ser presidente do Brasil."

As sentenças de prisão certamente serão usadas na campanha presidencial para tentar atingir a candidatura de Lula, prevê o entorno do ex-ministro.

Os ataques que partem do clã Bolsonaro não provocam reação por parte de Dirceu, mas, quando a artilharia é terceirizada para aliados do presidente, como o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, ele se vale de antigas relações e manda recados sobre o seu descontentamento. Ciro fez parte da base aliada dos governos Lula e Dilma.


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