Bolsonaro na mira: "Placar do Impeachment" contabiliza posição de parlamentares
Ferramenta compila, de forma independente, a posição dos deputados federais sobre possibilidade de impedimento do presidente; especialistas ouvidos pelo iG não veem crime de responsabilidade e efetividade do placar
Às vesperas da eleição da nova Presidência da Câmara dos Deputados, que ocorre no próximo dia 1 de fevereiro, a pauta do impeachment do presidente Jair Bolsonaro (sem partido)
voltou a movimentar políticos da oposição e usuários das redes sociais. A iniciativa independente " Placar do Impeachment
" análise a posição dos deputados federais sobre o tema, com o intuito de suscitar a viabilidade do impeadimento do chefe do Executivo.
"A ideia nasceu da frustração com tantas mortes em Manaus. Começamos a pensar em uma forma prática de atacar o problema: todos diziam que não haveria votos suficientes para o impeachment, mas ninguém nunca tinha visto esse cálculo. Resolvemos começá-lo sozinhos. Por mais que estejamos todos revoltados, a saída do presidente da República deve respeitar o rito constitucional. O que podemos fazer é conscientizar as pessoas sobre isso e comunicar o papel da sociedade civil nesse processo. Por isso, focamos as cobranças nos deputados federais", afirmam os idealizadores do "Placar do Impeachment" em entrevista ao iG.
A iniciativa é mantida por dois profissionais de comunicação formados pela Universidade de Brasília (UnB), que preferem não se identificar para evitar represálias. De acordo com os organizadores, o projeto tem objetivo pressionar os parlamentares a se manifestarem sobre o impeachment .
Eles dizem não ter ligação com partidos políticos e movimentos sociais organizados. "Isso isso não quer dizer que somos apolíticos . Todo ato é um ato político. Este é o nosso. Fingir neutralidade, neste momento, é ser cúmplice de uma série de crimes que já foram denunciados nos 61 pedidos de impeachment apresentados até agora e em cortes internacionais", argumentam.
As informações coletadas pela equipe são exibidas pela conta SOS_Impeachment no Twitter e em um Dashboard que organiza os deputados em grupos a favor, contra e ainda sem posicionamento sobre o impeachment.
O monitor ainda inclui informações sobre os deputados federais, como o partido, o telefone, o e-mail e a "evidência" de que o posicionamento retratado na ferramenta condiz com os ideais do parlamentar. Segundo os idealizadores, as informações sobre as posições dos políticos acerca do tema são coletadas com base em manifestações públicas emitidas nas redes sociais.
"Tudo isso é levantado de maneira transparente e independente. Não mantemos contato com nenhum parlamentar de forma privada. Além daqueles que se posicionam abertamente, muitos usuários cobram seus representantes e nos enviam as respostas, que entram na planilha como evidência de cada posicionamento".
"A maioria dos deputados contra o impeachment, aliás, se posiciona apenas desta forma. Acreditamos que os deputados devem dividir com a população a opinião sobre o principal assunto em pauta na democracia brasileira. Eles chegaram à Câmara por voto popular", afirmam.
Para Márcio Juliboni, mestre em ciência política pela USP, a iniciativa não é um bom recurso de avaliação das intensões dos congressitas e, também, de pressão popular pela abertura do processo de impeachment, como pretendem os idealizadores.
“Não é uma ferramenta que vai virar o jogo e que possa mostrar com fidelidade o humor do Congresso em relação ao impeachment. É muito mais um estímulo para provocar o debate na população”, afirma.
"O placar do impeachment, do jeito que ele é montado pelo SOS_Impeachment, é muito mais uma curiosidade do que algo efetivo para se medir a disposição dos parlamentares em efetivamente levar adiante o processo de impeachment".
O cientista político Sergio Praça, da FGV-São Paulo, vê na existência da plataforma a comprovação de que o " impeachment voltou ao debate público ", asim como os eventos recentes de desabestecimento de oxigênio em Manaus e o ofuscamento do governo federal na vacinação.
Crime de responsabilidade
O impeachment é um processo de natureza política, mas que une elementos do processo jurídico. Para além da vontade dos parlamentares e da população de depor o chefe do Executivo, é necessário que o presidente tenha cometido um crime de responsabilidade.
Segundo a Lei 1079, de 10 de abril de 1950, recepcionada pela Consituição de 1988, o crime de responsabiliade é caracterizado por atentados à Constituição Federal e, especialmente, contra a existência da União; o lívre exercício dos poderes Legislativo, Judiciários e consittucionais dos Estados; o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais; a segurança interna do país; a probidade na administração; a lei orçamentária; o emprego do dinheiro público e o cumprimento das decisões judiciárias.
Rubens Baçek é doutor em direito constitucional pela USP e avalia que não há crime de responsabilidade nas ações do presidente Jair Bolsonaro até este momento , inclusive nas ações - ou ausência delas - no enfrentamento à pandemia de Covid-19. Mas podera que a jurisprudência criada por outros processos de impeachment garante a "interpretação do espírito da lei".
"Do ponto de vista estritamente jurídico não há configuração do crime de responsabilidade, isto não quer dizer que nós possamos vir a ter a caracterização muito em breve. Pode ser até dolosa essa forma com que ele age (Jair Bolsonaro), mas ele nunca passa do limite e faz algo formal", afirma.
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) possui atualmente 61 pedidos de impedimento do cargo, de acordo com a Câmara dos Deputados. Bolsonaro se aproxima da marca da ex-presidente Dilma Rousseff, que recebeu 68 pedidos de impeachment até ser removida do cargo.
“A quantidade de pedidos de impeachment não é tão relevante assim. Num processo de impeachment não importa tanto a quantidade de pedidos, mas sim a qualidade e as circunstâncias em que são analisados", avalia Márcio Juliboni