Ciumeira: proximidade de Mandetta com sertanejos incomoda Bolsonaro
Agradecimento feito pelo Ministro da Saúde a cantores sertanejos em coletiva de imprensa teria irritado Jair Bolsonaro, que usaria caneta contra ministros “estrelas”
Por Agência O Globo |
O presidente Jair Bolsonaro já deu diversas demonstrações de que está incomodado com o protagonismo do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, durante a crise do novo coronavírus. Muitas vezes com ideias opostas sobre o combate à doença, principalmente no que diz respeito ao isolamento social, os dois vêm “se bicando há um tempo”, como disse na semana passada o chefe, que afirmou faltar “humildade” ao subordinado. A aparente ciumeira do capitão quase resultou na saída de Mandetta do governo nesta segunda-feira. Mas a turma do “deixa disso” entrou em ação e trabalhou contra a troca de comando.
O inesperado desta história é que, sem saber, uma dupla sertaneja causou ciúmes no presidente e aumentou a “fritura” do ministro. Na coletiva em que anunciou que continuaria no cargo, nesta segunda-feira (6), o ministro agradeceu a alguns músicos que fizeram shows por meio de lives no fim de semana. “Agradeço a Jorge e Mateus, a Xand do Avião, por terem veiculado nas suas lives a mensagem de que o show não pode parar, mas a aglomeração, essa tem que parar”, disse.
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A participação do ministro na live realizada pelos cantores sertanejos foi um motivo a mais de irritação de Bolsonaro, que, no domingo (5) disse não ter medo de usar sua “caneta” contra integrantes do seu governo que viraram “estrelas”.
Após pressão do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Congresso e uma articulação de militares, Bolsonaro decidiu manter Mandetta à frente da Saúde. Um ato de exoneração chegou a ser preparado no Palácio do Planalto, mas, após uma reunião tensa com toda a equipe ministerial, coube ao próprio Mandetta dizer, em entrevista coletiva, que fica, após reconhecer que até as gavetas da sua sala já tinham sido limpas por seus auxiliares.
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“Hoje foi um dia que rendeu muito pouco o trabalho. Ficaram com a cabeça avoada, se eu iria permanecer, se eu iria sair. Gente aqui dentro limpando gavetas. Até as minhas gavetas. Nós vamos continuar, porque continuando a gente vai enfrentar nosso inimigo. O nosso inimigo tem nome e sobrenome: Covid-19”, disse Mandetta, que foi homenageado por servidores do ministério, enquanto a sua demissão ainda era cogitada, e aplaudido ao dizer que fica.
Assessores do presidente evitaram tratar a permanência do ministro como definitiva. Houve lembrança às saídas de Ricardo Vélez Rodrigues da Educação e de Osmar Terra, da Cidadania, adiadas em alguns dias por terem sido divulgadas antes pela imprensa. O núcleo militar do governo tenta aproximar o discurso de Mandetta ao de Bolsonaro, que tem enfatizado mais os aspectos econômicos do que os relativos à saúde. Mas já começam a trabalhar para que uma eventual troca seja por um nome que seja apontado como de perfil técnico.
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A continuidade de Mandetta, ao menos por ora, é atribuída mais à pressão externa. Davi Alcolumbre, presidente do Senado, telefonou para o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, para dizer que uma demissão tornaria a relação do governo com o Parlamento “muito difícil”. Ele conversou também com Onyx Lorenzoni (Cidadania), a quem disse não ser possível tirar um ministro que faz “excelente trabalho”. Integrantes da bancada da Saúde estiveram com Mandetta pouco antes da reunião no Planalto, também para prestar solidariedade. O deputado Hiran Gonçalves (PP-RR) divulgou um vídeo dentro do gabinete do ministro lamentando um clima de despedida.
Já o presidente do STF, Dias Toffoli, atuou em duas frentes: fez chegar ao Palácio do Planalto que a demissão de Mandetta, neste momento, seria muito mal recebida não só pela Corte, mas por diversos setores da sociedade; e trabalhou para que o ministro da Saúde também fizesse algum gesto de harmonia em relação ao presidente.