Barroso proíbe governo de contratar campanha contra isolamento na pandemia
Decisão foi tomada em ações ajuizadas no Supremo. Segundo o ministro, campanha não é voltada para "informar, educar ou orientar"
Por Agência O Globo |
O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), proibiu nesta terça-feira que o governo federal contrate qualquer campanha contra medidas de isolamento durante a pandemia do coronavírus. Segundo o ministro, a campanha do governo federal "O Brasil não pode parar", que chegou a circular nas redes sociais, não é voltada para "informar, educar ou orientar socialmente", como determina a Constituição Federal.
"Em momento em que a Organização Mundial de Saúde, o Ministério da Saúde, as mais diversas entidades médicas se manifestam pela necessidade de distanciamento social, uma propaganda do governo incita a população ao inverso. Trata-se, ademais, de uma campanha ‘desinformativa’: se o Poder Público chama os cidadãos da “Pátria Amada” a voltar ao trabalho, a medida sinaliza que não há uma grave ameaça para a saúde da população e leva cada cidadão a tomar decisões firmadas em bases inverídicas acerca das suas reais condições de segurança e de saúde", escreveu Barroso.
Ainda segundo o ministro, o uso de dinheiro público em campanhas desse tipo “claramente desassociados do interesse público consistente em salvar vidas, proteger a saúde e preservar a ordem e o funcionamento do sistema de saúde”, é uma afronta as princípios da legalidade, da moralidade e da eficiência, como preconiza a Constituição.
Leia também: Bolsonaro muda tom sobre covid-19 e assume medidas de combate à doença
Barroso argumentou que a campanha não pode ser tratada como uma decisão política do presidente da República sobre como conduzir o país durante a pandemia. “Haveria uma decisão política, no caso em exame, se a autoridade eleita estivesse diante de duas ou mais medidas aptas a produzir o mesmo resultado: o bem estar da população, e optasse legitimamente por uma delas. Não é o caso. A supressão das medidas de distanciamento social, como informa a ciência, não produzirá resultado favorável à proteção da vida e da saúde da população. Não se trata de questão ideológica. Trata-se de questão técnica”, explicou o ministro.
Você viu?
Ainda segundo a decisão, não há “dicotomia entre proteção à saúde da população e proteção à economia e aos empregos da mesma população, tal como vendo sendo alegado”. Barroso pondera que “o mundo inteiro está passando por medidas restritivas em matéria de saúde e pelos impactos econômicos delas decorrentes. Caso o Brasil não adote medidas de contenção da propagação do vírus, o próprio país poderá ser compreendido como uma ameaça aos que o estão combatendo, passando a correr o risco de isolamento econômico”, argumentou.
Leia também: Bolsonaro diz que Mandetta 'está bem' e ironiza diretor da OMS
A decisão foi tomada a pedido da Rede Sustentabilidade e da Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos, que entraram com ações no Supremo contra a campanha publicitária “O Brasil não pode parar”. Na decisão, Barroso ressaltou que a pandemia, pública e notória, alcançou proporções inéditas. “A situação é gravíssima e não há qualquer dúvida de que a infecção por COVID-19 representa uma ameaça à saúde e à vida da população”, afirmou.
Barroso acrescentou que a experiência de outros países demonstram que as medidas sanitárias devem ser tomadas rapidamente, para reduzir a velocidade de contágio. “Sem a adoção de tais medidas, o contágio de grande parcela da população ocorre simultaneamente, e o sistema de saúde não é capaz de socorrer um quantitativo tão grande de pessoas. Entre as medidas de redução da velocidade de contágio estão justamente aquelas que determinam o fechamento de escolas, comércio, evitam aglomerações, reduzem a movimentação de pessoas e prescrevem o distanciamento social”, argumentou.
Leia também: Em meio à pandemia, Carlos Bolsonaro ganha escritório no Planalto
O ministro lembrou que a recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) não pode ser desprezada no Brasil, que tem “grandes aglomerações urbanas, muitas comunidades pobres e enorme quantitativo de pessoas vivendo em situação de precariedade sanitária”. Segundo Barroso, “nada recomenda que as medidas de contenção da propagação do vírus sejam flexibilizadas em países em desenvolvimento. Ao contrário, tais medidas, em cenários de baixa renda, são urgentes e devem ser rigorosas, dado que as condições de vida em tais cenários – grandes aglomerações e falta de condições sanitárias adequadas – favorecem o contágio e a propagação do vírus”.