Bolsonaro abandona entrevista ao ser perguntado sobre vídeo de leão e hienas

Presidente não quis comentar reação do decano do Supremo, o ministro Celso de Mello, que chamou postagem de 'atrevimento sem limites'

Bolsonaro voltou a fugir de entrevista ao ser perguntado sobre críticas de Celso de Mello ao vídeo de leão e hienas
Foto: José Dias/PR
Bolsonaro voltou a fugir de entrevista ao ser perguntado sobre críticas de Celso de Mello ao vídeo de leão e hienas

Questionado sobre a crítica do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Celso de Mello , a um vídeo postado em seu perfil no Twitter em que debocha da Corte, ataca partidos e entidades, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) abandonou a entrevista que concedia à imprensa brasileira, nesta terça-feira (29), ao deixar o hotel em que está hospedado, em Riade, capital da Arábia Saudita. O ministro do Supremo chamou a postagem de 'atrevimento sem limites'.

Depois de se encontrar com com o princípe herdeiro Mohammed bin Salman, Bolsonaro dizia estar otimista quanto às chances de investimento do país estrangeiro quando foi perguntado sobre a nota do decano do STF e decidiu encerrar a entrevista.

O vídeo publicado nas suas redes sociais , na tarde desta segunda-feira (28), mostra um leão, representando Bolsonaro, cercado por hienas. Os animais são identificados como diversas entidades e movimentos, entre eles o STF , a Organização das Nações Unidas ( ONU ) e o PSL , seu partido. Logo após a publicação, cerca de duas horas depois, o vídeo foi apagado da conta do presidente.

Em nota, Celso de Mello disse que a comparação foi feita "de modo absurdo e grosseiro, por falsamente identificar a Suprema Corte como um de seus opositores".

Para o ministro, o vídeo é uma "expressão odiosa (e profundamente lamentável) de quem desconhece o dogma da separação de poderes" e de quem "teme um Poder Judiciário independente e consciente de que ninguém, nem mesmo o Presidente da República, está acima da autoridade da Constituição e das leis da República".

Ao fim do vídeo, o protagonista é salvo por um outro leão que surge no horizonte e depois o acaricia, o "patriota conservador". Enquanto as hienas fogem, surge na tela uma mensagem de apoio a Bolsonaro: "vamos apoiar o nosso presidente até o fim! E não atacá-lo! Já tem a oposição pra fazer isso!". Em seguida, uma bandeira do Brasil é projetada sobre uma foto do presidente no dia da sua posse.

Celso de Mello afirmou ainda que Bolsonaro não é um "monarca presidencial" e que o Brasil não é "uma selva na qual o leão imperasse com poderes absolutos e ilimitados". Ele conclui o texto dizendo que "em uma sociedade civilizada e de perfil democrático, jamais haverá cidadãos livres sem um Poder Judiciário independente, como o é a magistratura do Brasil".

Na postagem, Bolsonaro elencou cinco países sul-americanos — "Chile, Argentina, Bolívia, Peru, Equador ....." — e escreveu que "mais que a vida, a nossa LIBERDADE". E concluiu com seu slogan de campanha, "Brasil acima de tudo! Deus acima de todos!".

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De acordo com a colunista Bela Megale, do O Globo , o presidente disse a assessores que foi pego de surpresa com o vídeo em que ele aparece como um leão acuado por hienas. O relato foi feito à coluna da Bela antes que o vídeo fosse deletado. A mensagem ficou cerca de duas horas no ar. Apesar de não ter afirmando que Carlos Bolsonaro (PSC-RJ) foi o responsável pela publicação, 11 de 10 assessores do presidente a atribuem ao vereador.

Confira a nota de Celso de Mello na íntegra:

"A ser verdadeira a postagem feita pelo Senhor Presidente da República em sua conta pessoal no 'Twitter', torna-se evidente que o atrevimento presidencial parece não encontrar limites na compostura que um Chefe de Estado deve demonstrar no exercício de suas altas funções, pois o vídeo que equipara,ofensivamente, o Supremo Tribunal Federal a uma 'hiena' culmina, de modo absurdo e grosseiro, por falsamente identificar a Suprema Corte como um de seus opositores.

Esse comportamento revelado no vídeo em questão, além de caracterizar absoluta falta de 'gravitas' e de apropriada estatura presidencial, também constitui a expressão odiosa (e profundamente lamentável) de quem desconhece o dogma da separação de poderes e, o que é mais grave, de quem teme um Poder Judiciário independente e consciente de que ninguém, nem mesmo o Presidente da República, está acima da autoridade da Constituição e das leis da República.

É imperioso que o Senhor Presidente da República – que não é um 'monarca presidencial', como se o nosso País absurdamente fosse uma selva na qual o Leão imperasse com poderes absolutos e ilimitados – saiba que, em uma sociedade civilizada e de perfil democrático, jamais haverá cidadãos livres sem um Poder Judiciário independente, como o é a Magistratura do Brasil".