Parlamentares de partidos variados que integram as comissões de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado e da Câmara cobraram uma postura menos bélica do governo brasileiro em relação ao presidente eleito da Argentina , Alberto Fernández . De forma geral, a avaliação de governistas e opositores é que atitude hostil e inédita do presidente J air Bolsonaro de não querer cumprimentar o candidato vencedor das eleições de domingo não pode se sobrepor ao diálogo entre os dois maiores sócios do Mercosul.
- Sem noção! Eleições em países vizinhos não nos dizem respeito. Temos um fluxo importante de comércio com a Argentina nas manufaturas e isso pode nos atrapalhar muito. Temos que unir forças para brigar contra o desemprego e a fome que assola os brasileiros - disse a senadora Kátia Abreu (PDT-TO), ex-ministra da Agricultura no governo da ex-presidente Dilma Rousseff.
O líder do PSL no Senado, Major Olímpio (GO), ponderou ter sido "desnecessário" o gesto de Fernández de ter defendido Lula Livre, mas lembrou que a Argentina é o terceiro maior comprador de produtos brasileiros, especialmente de bens industrializados. Defendeu responsabilidade, "para não gerar prejuízo às nações".
"Posso não ter gostado do resultado da eleição, e de fato não gostei. Contudo, os dois presidentes saberão se respeitar. Os dois países estão numa situação bastante complicada e ninguém vai querer atrapalhar a vida um do outro", disse Olímpio.
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Para o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Bolsonaro está se comportando como "um menino mimado e irresponsável", ao colocar em risco as relações entre o Brasil e o país vizinho. Já o vice-presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, Marcos de Val (Podemos-ES), acredita que a situação ficará mais difícil a partir de agora.
"Até porque ganhou a eleição um governo de esquerda, em que a vice-presidente eleita (Cristina Kirchner) é acusada de corrupção. Mas o Mercosul é muito importante", disse de Val.
O deputado Carlos Zaratini (PT-SP) criticou o que chamou de intromissão de Bolsonaro em assuntos internos. Ele acredita que, por trás desse ato hostil, está a intenção de retirar o Brasil do Mercosul e abrir o mercado brasileiro para os Estados Unidos e outras potências.
"Esperamos que seja apenas o calor dos ânimos e que Bolsonaro recue, assim como fez em relação aos árabes, à embaixada do Brasil que seria transferida para Jerusalém e à China. Brasil e Argentina são muito interdependentes para terem qualquer tipo de enfrentamento concorrencial", afirmou o senador Humberto Costa (PT-PE).
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De maneira geral, se o governo brasileiro quiser negociar acordos sozinho com outros parceiros que não fazem parte do Mercosul, ou mesmo deixar o bloco, a interpretação mais comum é que o Executivo poderia de agir dessa forma sem o aval do Parlamento. No entanto, nada impede que o Congresso vote um decreto legislativo sustando a decisão.
Diálogo na transição
Na avaliação de fontes da área diplomática, os ânimos devem se acalmar no período de transição entre os governos do atual presidente Maurício Macri e do eleito Alberto Fernández. Aliado de Jair Bolsonaro, Macri poderá exercer um papel importante nessa conciliação, cujo fim será preservar o Mercosul.
"Há certas coisas que são perdoáveis entre candidatos. O candidato tem uma licença para agir de uma maneira que o presidente eleito, ou empossado, não tem. O que não dá é para dois grandes vizinhos e amigos brigarem de forma infantil. É essencial, agora, estabelecer as relações no patamar em que elas sempre estiveram", disse o diplomata aposentado Marcos Azambuja, ex-embaixador do Brasil na França e na Argentina.
É preciso uma mudança completa no discurso. A relação não pode ser contaminada pela desconfiança. A diplomacia é um ofício antigo, que tem linguagem e discurso próprios, e não pode se transformar em uma coisa de comadres", completou.
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Para Rubens Ricupero, diplomata e ex-ministro da Fazenda do governo do ex-presidente Itamar Franco, a crise atual não deverá resultar em problemas graves. Segundo ele, Brasil e Argentina já brigaram antes por questões ideológicas.
Isso não é uma crise, e sim uma questão ideológica dos dois lados. No fim do governo militar, o então presidente João Figueiredo não se dava com o argentino Raul Alfonsín. No entanto, assinaram acordos comerciais importantes. O determinismo geográfico vai fazer com que o bom senso prevaleça", disse Ricupero.