O Brasil vai se acostumado aos horrores dos tempos bolsonaristas. Basta ver como o País recebeu o incêndio do hospital no Rio de Janeiro. A comoção foi pequena. O presidente se omitiu. O ministro da Saúde sequer se deslocou ao local da tragédia. Tudo foi tratado como se fosse um dado da natureza, como um furacão ou um terremoto, e não um produto da inépcia humana, de autoridades omissas, de um sistema hospitalar mercantilizado, de um País que vai perdendo a capacidade de se revoltar, que prefere a indiferença.
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Este processo tem história. Evidentemente que não começou com a posse de Jair Bolsonaro . Mas foi agravado pela sua política neofascista, pelo desprezo aos direitos humanos, pelo culto à violência. O que dizer de um presidente que simula um revólver com a mão? Não é um incentivo ao ódio? A resolver divergências pela força?
Jair Bolsonaro levou ao Palácio do Planalto os métodos adotados durante três décadas como parlamentar. É de conhecimento público que na capital fluminense não estão claros os limites da legalidade com a ilegalidade. Foram estabelecidas relações perigosas entre criminosos e políticos. Com o passar do tempo, a linha imaginária que separa a lei do crime foi ficando tênue. Acabou ocorrendo uma aproximação “natural” que favoreceu ambos os lados. Os criminosos adquiriram status de participantes da sociedade civil e, consequentemente, buscaram interlocutores na esfera política. Já os parlamentares receberam com prazer este interesse, que beneficia seus negócios — no sentido amplo — e permite uma aliança no momento das eleições.
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Assim, não é acidental a proximidade do gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro com o ex-capitão Adriano Magalhães da Nóbrega, chefe do Escritório do Crime, milícia que domina a comunidade de Rio das Pedras. Nóbrega foi expulso da PM e condenado a 19 anos de prisão. Está foragido. Mas foi homenageado pelo filho de Jair Bolsonaro com a Medalha Tiradentes, principal condecoração do estado.
Esta forma particular de fazer política, típica da desmoralização das instituições democráticas, foi levada para Brasília. E em apenas nove meses contaminou ainda mais o corpo já enfraquecido do Estado brasileiro. O enfado, a indiferença e a falta de perspectiva política colaboram para transformar a barbárie em algo inevitável — para alguns, aceitável. Assim, é possível entender o bolsonarismo como produto social e não de um indivíduo.
Truculência na política, desmoralização das instituições e indiferença criaram as condições para a barbárie que nos assola. O bolsonarismo não é fruto de um indivíduo, mas um produto social.