No rodeio de Barretos, o maior do país, a tradição manda: no último dia de competições, os peões campeões de suas categorias devem circular pela arena montados em seus cavalos. Aplaudido, diante de uma plateia de 30 mil pessoas, o presidente Jair Bolsonaro seguiu para a festa depois de visitar obras de um hospital da cidade e participar do típico jantar da queima do alho. Passava das 21h30m quando o presidente desceu do palco onde havia assinado decreto para flexibilizar as regras de rodeios e foi para o centro da arena.
De camisa branca e calça jeans, deu duas voltas galopando o " Mito ", um cavalo da raça quarto de milha, a mais rápida do mundo — alguns alcançam 80 quilômetros por hora. Este é o quarto ano consecutivo em que Bolsonaro põe os pés na arena lamacenta de Barretos , projetada pelo arquiteto Oscar Niemeyer em 1985.
Neste ano, na condição de presidente da República, ele foi agradecer pelo apoio recebido na campanha do ano passado. E retribuir: justamente com o decreto presidencial que torna sem efeito leis aprovadas por vereadores de diferentes cidades que impedem a prática, sob alegação de maus-tratos a animais. Em Barretos, uma lei desse tipo está em vigor desde 2006.
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“Respeito todas as instituições, mas lealdade eu devo a você. O Brasil está acima de tudo. Neste momento em que muitos criticam a festa de peões e a vaquejada, quero dizer com muito orgulho, estou com vocês. Não existe politicamente correto. Existe o que precisa ser feito”, disse.
No palco, ao lado de autoridades e representantes da festa, Bolsonaro fechou os olhos no momento da oração. Junto do governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), e de Ricardo da Rocha, presidente do Independentes, grupo organizador da Festa de Peão de Barretos, saudou o público fazendo com as mãos o gesto de como se estivesse apontando uma arma.
Aos berros, o locutor de rodeios Cuiabano Lima clamava a plateia a aplaudir “o simplão da República” que, segundo ele, estava ali para provar que não é “um presidente Vaselina”. Ou seja, em suas palavras, estava de fato comprometido com as causas dos apoiadores de rodeios e vaquejadas:
“Infelizmente existem ONGs que não sabem da verdade. A gente faz um desafio: pode trazer qualquer ONG aqui pra dentro de Barretos pra assistir o rodeio daqui. Temos mais de 100 veterinários. Na hora em que o animal entra ele é inspecionado. Fazemos tudo dentro da lei. Não é qualquer um que dá a cara pra bater (pelos rodeios).”
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A plateia respondeu acendendo a luz dos celulares e, braços ao alto em homenagem ao presidente , entoou refrãos de "Vai Valer a Pena", sucesso gospel da banda de rock cristão Livres para Adorar. Diz um dos trechos da canção: "Não compreendo os Teus caminhos, mas Te darei a minha canção".
A festa seguiu adiante, e Bolsonaro recebeu de presente duas grandes fivelas pretas, típicas da vestimenta de quem compete por ali. Quem entregou foi a rainha da festa em 2019, Larissa Ferreira, acompanhada da princesa, Jhennyffer Pyetra, que, por sua vez, entregou um chapéu branco tradicional
Na caixa de som, ambientando a arena, Shallow Now, hit de Lady Gaga e Bradley Cooper. A trilha sonora da noite contou ainda com uma versão do Hino Nacional executado por Gaby Violeira, jovem de 29 anos tida como uma das expoentes femininas do ressurgimento da moda de viola em novas gerações.
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Mais cedo, por volta das 19h, Bolsonaro vistoriou reformas recentes no Hospital de Amor, um dos principais centros de referência no tratamento do câncer no país, em Barretos. Na porta de uma das alas do hospital, batizada com o nome do cantor sertanejo Luan Santana, cerca de 200 pessoas aguardaram o presidente que, ao chegar, foi recebido com os habituais gritos de “mito”.
Um homem de boné, contudo, xingou o presidente e fez referência à suposta relação da família Bolsonaro com representantes de milícias. A reação foi imediata. "Volta para a Venezuela", gritavam os apoiadores do presidente, enquanto o o rapaz deixava o local.
Entre os que aplaudiam o presidente estava a venezuelana Ricarda Rodriguez, 42 anos. Usando boné de seu país, ela foi até a porta do hospital para agradecer e falar com o presidente. Ricarda chegou aqui fugindo da crise na Venezuela e mora há cinco meses no Brasil.
“Comecei tratamento no meu país, mas lá não há mais remédio. Quero pedir ao presidente para ficar de vez no Brasil”, disse ela, que não conseguiu falar com Bolsonaro.