Enquanto cortava o cabelo em transmissão ao vivo pela internet nesta segunda-feira (29), o presidente Jair Bolsonaro afirmou que não foram os militares que mataram pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil(OAB), Felipe Santa Cruz. Bolsonaro disse que Fernando Santa Cruz, integrante do grupo Ação Popular (AP) e desaparecido durante a Ditadura Militar, teria sido assasinado por "justiçamento da esquerda" (prática em que militantes julgam e eliminam pessoas traidoras de movimentos revolucionários).
Mais cedo, o presidente havia criticado o líder da OAB e afirmado que, se Felipe Santa Cruz quisesse, poderia dizer como o pai desapareceu. A sugestão fez com que Santa Cruz decidisse interpelar Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal (STF), após divulgar uma nota em que o chama de cruel.
"Não foram os militares que mataram ele não, tá?", disse Bolsonaro ao retomar o assunto na transmissão ao vivo, acrescentando ainda que "é muito fácil culpar os militares por tudo o que acontece".
O presidente afirmou ainda que, pelas informações que teria recebido, integrantes da Ação Popular no Rio de Janeiro teriam sido responsáveis pelo desaparecimento de Fernando Santa Cruz , que pertencia ao grupo em Recife.
"E o pessoal da AP do Rio de Janeiro ficou... primeiro, ficaram estupefatos, né? Como é que pode esse cara vir do Recife se encontrar conosco aqui? O contato não seria com ele, seria com a cúpula da Ação Popular do Recife. E eles resolveram sumir com o pai do Santa Cruz. Essa é a informação que eu tive na época. É sobre esse episódio. Porque, qual é a tendência? "Se ele sabe, nós não podemos ser descobertos"... Existia essa guerra naquele momento", relatou Bolsonaro.
Em 2011, quando ainda era deputado federal, Bolsonaro já havia dito que os militares não eram culpados pela morte de Fernando Santa Cruz. Em uma palestra na Universidade Federal Fluminense (UFF), o então parlamentar disse Santa Cruz deve "ter morrido bêbado em algum acidente de carnaval".
Não há uma versão oficial que explique o desaparecimento e a morte do pai do presidente da OAB. Na contramão do que diz Bolsonaro, um ex-delegado do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) disse em 2012 que incinerou dez corpos de militantes executados pelos militares em 1973. Cláudio Antônio Guerra, em depoimento ao livro "Memórias de uma guerra suja", mencionou o nome de Fernando Santa Cruz na lista dos corpos que queimou em uma usina em Campos (RJ). Existe uma outra possibilidade, também documentada pelo relatório da Comissão Nacional da Verdade (CNV), de que Santa Cruz tenha sido enterrado por militares em São Paulo.
'Nada pessoal'
Bolsonaro afirmou que o relato sobre o "justiçamento de esquerda" é o testemunho do que ele viu acontecer naquela época e voltou a culpar a imprensa pela repercussão negativa de suas declarações.
"Então, como a imprensa pega fragmentos e divulga, tá aí o testemunho meu do que eu vi acontecer naquele momento. Até porque ninguém duvida, todo mundo tem certeza, que havia justiçamento. As pessoas da própria esquerda, quando desconfiavam de alguém, simplesmente executavam", declarou.
Ao longo de 12 minutos de transmissão ao vivo, Bolsonaro não pediu desculpas ao presidente da OAB, mas amenizou o tom.
"Não quero polemizar com ninguém. Não quero mexer com o sentimento do senhor Santa Cruz porque eu não tenho nada de pessoal no tocante a ele. Eu acho que ele está equivocado em acreditar em uma versão apenas do fato, mas ele tem todo o direito de me criticar, etc. etc. Mas essa é a versão minha do contato que tive com quem participou ativamente do nosso lado naquele momento, para evitar que o Brasil se transformasse numa Cuba", justificou Bolsonaro .