Aos poucos, o futuro governo Bolsonaro (PSL) vai tomando forma. Até agora, além da equipe de transição , o presidente eleito já confirmou o nome de dez turos ministros dos "cerca de 15" que pretende contar no seu governo. Com nomes famosos, como o do juiz federal Sérgio Moro e do astronauta Marcos Pontes, um fato que chama pouca atenção é a aproximação de Bolsonaro ao DEM, partido político que ficará com o comando do ministério da Casa Civil, da Agricultura e da Saúde.
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O responsável por dar ainda mais representatividade ao Democratas no governo Bolsonaro é o deputado federal pelo Mato Grosso do Sul Luiz Henrique Mandetta. Médico ortopedista pediátrico e deputado desde 2011, Mandetta foi confirmado como próximo ministro da Saúde nesta terça-feira (20), vencendo uma disputa com nomes considerados mais técnicos como o de Henrique Prata, diretor do Hospital Amor, o antigo Hospital do Câncer de Barretos.
Boa parte dessa responsabilidade, no entanto, se deve a um outro nome que acompanhou Bolsonaro em todo o período eleitoral e é visto como o líder de um dos três polos que circundam o futuro presidente: Onyx Lorenzoni . Também filiado ao DEM e confirmado como futuro chefe da Casa Civil, ele é considerado o líder da articulação política do governo Bolsonaro que também sofre forte influência dos militares, em áreas como segurança e infraestrutura; e dos liberais, na área da economia – um cenário que fica evidente no quadro pintado até o momento com os futuros ministros já confirmados por Bolsonaro.
Enquanto o liberal Paulo Guedes acumula o poder de diversas pastas extintas como os ministérios da Fazenda, da Indústria, Comércio e Serviços, e do Trabalho, sob o guarda-chuva do novo futuro Ministério da Economia; os militares já emplacaram um dos seus no Gabinete de Segurança Institucional (GSI), com o general Augusto Heleno; no Ministério da Defesa, com o general Fernando Azevedo e Silva; além de Marcos Pontes no Ministério da Ciência e Tecnologia, que é tenente-coronel da reserva e ex-piloto de caça da Força Aérea Brasileira, apesar de ser mais conhecido por ter sido o primeiro astronauta brasileiro a ir para o espaço.
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Além de lidar com interesses distintos dentro do próprio governo, portanto, a missão de Onyx se torna ainda mais difícil já que o futuro ministro da Casa Civil, setor responsável pela articulação política do governo com o poder legislativo federal, precisa conseguir o apoio necessário para que Bolsonaro consiga aprovar suas propostas dentro de um Congresso Nacional com grande fragmentação partidária e inexperiência política.
Tudo isso, sem descumprir a promessa de campanha do presidente eleito de acabar com a política do "toma lá, dá cá" do chamado "presidencialismo de coalizão" que distribui cargos públicos por indicação política do presidente, inclusive ministérios, para contar com o apoio de mais partidos na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.
A ala política dos ministérios de Bolsonaro, no entanto, não está ajudando Bolsonaro a cumprir uma outra promessa de campanha: o combate à corrupção. Os três nomes do DEM que já estão confirmados ou próximos de serem confirmados ministros de Bolsonaro estão envolvidos em casos polêmicos.
Enquanto o próprio Onyx Lorenzoni já admitiu publicamente ter recebido propina via Caixa 2 do frigorífico JBS para pagar gastos de campanha, a futura ministra da Agricultura, Tereza Cristina, também mantém negócios com a empresa dos irmãos Joesley e Wesley Batista através de seus familiares (ela nega conflito de interesses) e o deputado Luiz Henrique Mandetta, confirmado para o Ministério da Saúde, é investigado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por suspeitas de ter favorecido duas empresas – a Telemídia e a Alert – num contra de R$ 9,9 milhões assinado com a Secretaria de Saúde de Campo Grande (MS), no período em que ele comandou a pasta.
Fora o desgaste político com a opinião pública, a troca de farpas entre vários integrantes da equipe de Bolsonaro e o atual Congresso Nacional que tem feito o futuro governo ter dificuldades para aprovar projetos de interesse como o Projeto de Lei (PL) 7.180/2014 popularmente conhecido como "Escola Sem partido" e praticamente desistido de aprovar projetos de grande interesse como a reforma da Previdência ainda este ano mesmo na esteira da grande popularidade e apoio herdada das urnas, dá a dimensão do tamanho da dificuldade que vem pela frente no relacionamento com a classe política.
Engana-se, porém, quem pensa que o governo Bolsonaro, sobretudo a ala liderada por Onyx, tem acumulado só derrotas até aqui. Isso porque além de estar próximo de colocar seu segundo colega de partido na futura equipe ministerial, o partido também está vencendo a disputa pelo apoio do futuro governo na disputa pela Presidência da Câmara dos Deputados, através de uma já considerada provável reeleição de Rodrigo Maia
( DEM
-RJ).
Internamente, os filhos de Bolsonaro, incluindo o deputado federal eleito por São Paulo com recorde de votos, Eduardo Bolsonaro , concordam que seria "concentração de poder demais" tentar eleger o presidente da Câmara do mesmo partido, o PSL, por isso acreditam que seria bom apoiar o nome de um parlamentar de outro partido "desde que ele não trave a pauta" do governo, uma vez que o presidente da Casa tem a prerrogativa de decidir quais serão os assuntos discutidos e eventualmente votados em cada sessão, mas são eles os que mais resistem ao apoio ao nome de Maia para a Presidência da Casa.
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Independentemente disso, após alguns estranhamentos, a reaproximação entre o presidente eleito e o presidente da Câmara parece estar sendo selada. Pelo menos é o que sinaliza Bolsonaro com o convite para Maia "tomar um café" com ele na manhã desta quarta-feira (14).
A eleição para presidente da Casa, no entanto, só acontecerá em fevereiro do ano que vem, após a posse das novas bancadas eleitas nas eleições 2018. Até lá, Rodrigo Maia tem uma prova de fogo pela frente já que também está embuído da missão de aprovar algumas pautas que estão travadas no Congresso, sobretudo as mais polêmicas, para evitar um desgaste do novo governo logo no começo do mandato.
A missão se torna ainda mais difícil já que a Maia avalia que haverá um intervalo de apenas quatro semanas para colocar outros projetos em discussão e votação antes que a Câmara se debruce de vez sobre o orçamento federal para 2019, projeto que impede constitucionalmente que os parlamentares saiam de recesso no final do ano antes de votarem.
A revisão do Estatuto do Desarmamento, a fim de flexibilizar regras como a compra e o porte de armas de fogo, parece ser o mais adiantado dos projetos já que o próprio Rodrigo Maia, ainda na campanha, defendeu que a proposta deveria ser votada "o quanto antes", o que também foi visto como o primeiro gesto do atual presidente da Casa aos aliados de Bolsonaro em busca da sua reeleição.
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Constatação final de que Bolsonaro tem caminhado para uma aproximação com o DEM é o fato curioso de que na última eleição para presidente da Câmara que consagrou Rodrigo Maia como chefe da Casa durante o biênio 2017-2018, o então apenas deputado Jair Bolsonaro também se candidatou e foi adversário de Maia. Na ocasião, porém, o novo presidente eleito terminou a votação na última colocação dentre as seis candidaturas com apenas quatro votos enquanto Maia obteve 293.