A situação do senador Aécio Neves (PSDB-MG) está cada vez mais complicada. Investigado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no esquema de corrupção de Furnas, estatal do setor elétrico e severamente implicado na delação dos irmãos Joesley e Wesley Batista, da JBS, o tucano procura meios de se livrar das investigações.
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Nessa busca intensa em "dar um jeito nas coisas", o senador Aécio Neves fez uma ligação suspeita para Gilmar Mendes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e pediu para o ministro conversar com o deputado Flexa Ribeiro (PSDB-PA) e convencê-lo a votar a favor da aprovação da lei de abuso de autoridade, que ajudaria a frear boa parte das investigações da Lava Jato e de outras operações da Polícia Federal que envolvem os políticos do País.
Na conversa, que aconteceu no dia 26 de abril, Aécio diz a Gilmar Mendes que seria "importante" que Flexa Ribeiro acompanhasse seu voto, e pede para ele ligar para o paraense. Paciente e solicito, o ministro ouve o senador e prontamente responde que iria realizar o desejo do tucano.
Confira a transcrição completa da conversa, disponibilizada pela Polícia Federal:
Aécio Neves : Oi, Gilmar. Alô.
Gilmar Mendes : Oi, tudo bem?
Aécio : Você sabe um telefone que você poderia dar que me ajudaria na condução lá. Não sei como é sua relação com ele, mas ponderando… Enfim, ao final dizendo que me acompanhe lá, que era importante… Era o Flexa, viu? [Aécio se referia ao senador Flexa Ribeiro]
Gilmar : O Flexa, tá bom, eu falo com ele.
Aécio : Porque ele é o outro titular da comissão, somos três, sabe?… Né…
Gilmar : Tá bom, tá bom. Eu vou falar com ele. Eu falei… Eu falei com o Anastasia e falei com o Tasso… Tasso não é da comissão, mas o Anastasia… O Anastasia disse “Ah, tô tentando… [incompreensível]…” e…
Aécio : Dá uma palavrinha com o Flexa… A importância disso e no final dá sinal para ele porque ele não é muito assim… De entender a profundidade da coisa… Fala ó… Acompanha a posição do Aécio porque eu acho que é mais serena. Porque o que a gente pode fazer no limite? Apresenta um destaque para dar uma satisfação para a bancada e vota o texto… Que vota antes, entendeu?
Gilmar : Uhum.
Aécio : Destaque é destaque é destaque… Depois não vai ter voto, entendeu?
Gilmar : Uhum. Uhum.
Aécio : Pelo menos vota o texto e dá uma…
Gilmar : Uhum.
Aécio : Uma satisfação para a ban… Para não parecer que a bancada foi toda ela contrariada, entendeu?
Gilmar : Uhum.
Aécio : Se pudesse ligar para o Flexa aí e fala…
Gilmar : Eu falo pra com ele… Falo com ele… Eu ligo pra ele… Eu ligo pra ele agora.
Aécio : …[incompreensível]… importante
Gilmar : Ligo pra ele agora.
Aécio : Um abraço.
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Pouco depois de desligar com Gilmar, Aécio telefona para Flexa Ribeiro e diz ao colega que "um amigo comum importante" está tentando ligar pra ele. "Ouve o que ele tem pra te dizer", avisou Aécio. Naquele mesmo dia, a lei de abuso de autoridade foi aprovada por 54 votos a 19, com Aécio e Flexa Ribeiro votando a favor do texto. Jogando por terra qualquer validade dos votos.
As polêmicas de Gilmar Mendes
O ministro Gilmar Mendes é uma das figuras mais criticadas do cenário político brasileiro. Ele acumula declarações e decisões polêmicas, como conceder habeas corpus ao médico Roger Abdelmassih. acusado de 56 crimes sexuais. O ex-prefeito de São Paulo, Celso Pitta e o investidor Naji Nahas também foram agraciados pela benevolência de Mendes, que concedeu habeas corpus à dupla.
Condenado no Mensalão, o publicitário Marcos Valério também conseguiu liberdade através de uma decisão de Gilmar. O mesmo aconteceu com o bilionário Eike Batista, que saiu da prisão mesmo sendo acusado de repassar US$ 16,5 milhões em propina ao então governador do Rio, Sérgio Cabral.
Gilmar Mendes é frenquentemente acusado pela oposição, princpalmente pelo PT, de beneficiar o PSDB e seus membros investigados, entre eles, Aécio Neves. Na mesma data da conversa gravada pela Polícia Federal, o ministro suspendeu um depoimento do tucano sobre a corrupção em Furnas.
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No entanto, as decisões polêmicas de Mendes também já irritaram tucanos e agradaram petistas. Em uma de suas maiores polêmicas, o queridinho dos corruptos optou por soltar José Dirceu, condenado por corrupção na Operação Lava Jato. Na época, os ministros chegaram e gerar um abaixo assinado pedindo seu impeachment.
Veja o video de Joaquim Barbosa dizendo o que pensa de Gilmar Mendes:
Os casos de corrupção envolvendo Aécio Neves
A queda de Aécio Neves de presidenciável a multi investigado foi vertiginosa. Após a derrota nas eleições de 2014 para a petista Dilma Rousseff, o tucano foi para a linha de frente da oposição, sempre relembrando as dezenas de casos de corrupção envolvendo os políticos do PT.
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No entanto,o senador mineiro também é investigado em uma série de casos. Além da citação de Delcídio do Amaral sobre a corrupção em Furnas, Aécio também foi delatado por um funcionário do doleiro Alberto Youssef, que afirma ter repassado cerca de R$ 300 mil reais ao senador. Ele também foi entregue por Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro. Aécio teria recebido R$ 1 milhão em 1998, quando ainda era senador, mas o caso foi arquivado.
No entanto, foi apenas nas últimas semanas que o tucano viu as acusações contra ele ganharem corpo. Joesley Batista, ex-presidente da JBS, gravou uma conversa onde Aécio pede dinheiro ao empresário. O dinheiro foi entregue a Frederico Pacheco de Medeiros, o Fred, que é primo de Aécio e coordenou a campanha do tucano para o planalto. "Tem que ser um que a gente mata ele antes de fazer delação. Vai ser o Fred com um cara seu. Vamos combinar o Fred com um cara seu porque ele sai de lá e vai no cara", disse Aécio, em conversa gravada.
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Um dos quatro pagamentos de R$ 500 mil foi filmado pela Polícia Federal. Quem entregou o dinheiro ao primo de Aécio foi o diretor de Relações Institucionais da JBS, Ricardo Saud, hoje um dos delatores. A PF seguiu Fred, que foi filmado repassando a pagamento a Mendherson Souza Lima, assessor parlamentar de do senador Zezé Perrela (PSDB-MG), amigo pessoal e aliado político de Aécio. Segundo as investigações, o dinheiro teria sido rastreado até uma empresa que pertence a Gustavo Perrela, filho de Zezé Perrela.
A defesa do tucano afirma que o dinheiro seria para ajudar a pagar sua defesa na Operação Lava Jato, mas a PGR afirma que não existe qualquer evidência desse repasse.