Na sentença desta quinta-feira (30), em que condena o ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB) a 15 anos e quatro meses de prisão por crimes apurados na Operação Lava Jato, o juiz Sérgio Moro alegou que nem mesmo a prisão do ex-deputado, ocorrida em outubro do ano passado, foi capaz de "fazê-lo abandonar o modus operandi , de extorsão, ameaça e chantagem".
Esse 'hábito', lembra Sérgio Moro , já havia sido percebido em episódios anteriores, como quando o delator Júlio Camargo, primeiro a relatar a participação de Cunha no esquema criminoso na Petrobras, disse que chegou a esconder em juízo fatos relacionados ao peemedebista "por medo das consequências".
Moro diz que Eduardo Cunha tentou "intimidar e constranger" o presidente Michel Temer ao questioná-lo sobre sua relação com o ex-assessor José Yunes e um suposto esquema de repasses ilegais a campanhas do PMDB em 2014.
"A pretexto de instruir a ação penal, Eduardo Cosentino da Cunha apresentou vários quesitos dirigidos ao Exmo. Sr. Presidente da República que nada diziam respeito ao caso concreto", escreve o juiz. "Tais quesitos, absolutamente estranhos ao objeto da ação penal, tinham por motivo óbvio constranger o Exmo. Sr. Presidente da República e provavelmente buscavam com isso provocar alguma espécie intervenção indevida da parte dele em favor do preso, o que não ocorreu."
Leia também: Eduardo Cunha consegue na Justiça impedir venda de livro sobre sua prisão
"A conduta processual do condenado no episódio apenas revela que sequer a prisão preventiva foi suficiente para fazê-lo abandonar o modus operandi , de extorsão, ameaça e chantagem", complementa Moro, que ratifica que "não há qualquer registro" de que Michel Temer tenha cedido à tentativa de intimidação.
Condenação
Em sua decisão, Moro entendeu que o principal algoz da ex-presidente Dilma Rousseff cometeu os crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e evasão fraudulenta de divisas.
A ação penal na qual Eduardo Cunha foi condenado se referia ao uso de contas na Suíça para receber propina de R$ 5 milhões referente à operação de compra pela Petrobras do Bloco 4, campo de petróleo no Benin, na África, em 2011.
A defesa já anunciou que irá recorrer da decisão do juiz Moro, da 13ª Vara Federal, ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4).
Além da pena de 15 anos e quatro meses de prisão, o ex-deputado também foi condenado a pagar US$ 1,5 milhão à Petrobras. O Ministério Público Federal pedia multa de US$ 77,5 milhões, que se refere ao valor total do prejuízo da Petrobras na compra do campo de Benin.
De pedra a vidraça: relembre a tragetória de Eduardo Cunha em 18 atos
Moro recorda Teori e exalta Lava Jato
Alvo de recorrentes críticas sobre sua atuação na operação, o juiz da 13ª vara criminal usou sua decisão para exaltar a Lava Jato e recordar o trabalho de Teori Zavaski, ex-relator da operação, que foi morto em um acidente aéreo em janeiro deste ano.
Segundo o juiz, a condenação de Cunha só foi possível “devido a coragem institucional da Procuradoria Geral da República e do Egrégio Supremo Tribunal Federal”.
Entre as decisões tomadas no STF, Moro destacou o afastamento do ex-deputado, considerando que a atitude da Corte “possibilitou o andamento normal do processo de cassação de seu mandato parlamentar”.
“Necessário reconhecer também o mérito posterior da própria Câmara dos Deputados que, sucessivamente, cassou o mandado parlamentar”, escreve o juiz.
O magistrado destacou ainda o trabalho individual do “eminente e saudoso” ministro do STF Teori Zavascki. “Por essa decisão e por outras, o legado de independência e de seriedade do Ministro Teori Zavascki não será esquecido”
“Não há melhor momento para recordar o legado de independência do Ministro Teori Zavaski do que agora, quando discute-se a aprovação de nova lei de abuso de autoridade que, sem as salvaguardas necessárias, terá o efeito prático de criminalizar a interpretação da lei e com isso colocará em risco a independência judicial, subordinando-a ao interesse dos poderosos. Espera-se e confia-se que o Congresso saberá proceder com sabedoria para a adoção de salvaguardas explícitas e inequívocas”, completa Sérgio Moro.