Refugiada da Bósnia e militar brasileiro lembram conflito após 20 anos

Ao menos 86 refugiados da guerra receberam abrigo no Brasil, segundo agência da ONU

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Após chegar ao Brasil em 1992 como refugiada da Guerra da Bósnia (1992 - 1995), Dragica Sebescen, de 52 anos, leu em um jornal que a casa de seu pai havia sido atingida repetidas vezes por fogo de artilharia.

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Ele morreu enquanto socorria a mulher, atingida por estilhaços. Sebescen é uma das 2,7 milhões de pessoas que se tornaram refugiadas ou deslocadas devido ao conflito, que completa 20 anos nesta sexta-feira.

Ao menos 86 desses refugiados receberam abrigo no Brasil, segundo a Acnur, a agência da ONU para os refugiados. "Comecei a sentir que algo estava errado em 1990, quando a minha filha de sete anos voltou da escola machucada. As colegas a chamaram de 'vaca sérvia' e bateram nela", disse Sebescen.

Na época, sua família morava na cidade croata de Split. O episódio fez Sebescen se mudar para o interior da Sérvia. Começava o desmembramento da então Iugoslávia.

Independência

Em março de 1992, a Bósnia declarou independência. O conflito começou em abril do mesmo ano, após a desintegração da antiga Iugoslávia, e se estendeu por mais de três anos. A guerra foi marcada pela violência entre as etnias que viviam na antiga Iugoslávia.

A pior atrocidade ocorreu em Srebrenica em 1995, quando forças sérvias lideradas pelo então general Ratko Mladic tomaram uma região que deveria ser um refúgio mantido pela ONU. Cerca de 8 mil muçulmanos, homens e meninos, foram executados no que atualmente é chamado de massacre de Srebrenica.

Em meio ao início do conflito, Dragica Sebescen e o marido receberam uma carta de um casal de brasileiros - que haviam conhecido anos antes, esquiando na Eslovênia - sugerindo que eles se mudassem para o Brasil.

A viagem ocorreu em agosto de 1992. No Brasil, receberam apoio da Acnur e da Caritas, além do status oficial de refugiados. "Eu cheguei a ficar doente porque queria voltar, mas não tinha para onde voltar. Mas hoje já consigo falar no assunto sem chorar", disse Sebescen, que possui uma empresa de desenho de moda em São Paulo.

Observadores

Na Bósnia, o conflito entrou em uma fase de limpeza étnica e vitimou civis de todos os lados. A ONU enviou observadores militares que não conseguiram restabelecer a paz.

Entre esses observadores, estava o então major do Exército brasileiro Claudinei Roncolatto. Ele sobreviveu a diversos bombardeios, entre eles o que destruiu o aeroporto de Sarajevo. "Na prática, nós não podíamos fazer muito para impedir o conflito. Ficávamos contando o número de disparos de artilharia de cada lado para elaborar relatórios", afirmou ele.

"A pior memória é de quando estava com quatro colegas da ONU patrulhando uma trilha e um finlandês tropeçou em uma armadilha que acionou uma mina terrestre", disse Roncolatto, que hoje é coronel reformado e escritor.

"O finlandês perdeu o pé e um grande amigo meu malaio morreu na hora. Conversávamos muito, ele sempre falava dos seus seis filhos. Vinte anos depois, o único sentimento é de saudade de pessoas como ele." Roncolatto voltou ao Brasil em 1994.

Um ano depois, a Otan (aliança militar ocidental) lançou ataques aéreos contra as forças sérvias, forçando um acordo de paz - firmado nos EUA em novembro. Roncolatto escreveu seu livro de memórias: Na Guerra da Bósnia (Thesaurus/2003).

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