Ucrânia aprova estado de emergência e pede saída de cidadãos da Rússia
Ucrânia pede garantias de segurança e sugere negociações diretas com Putin; medidas são tomadas após EUA indicarem que invasão pode ocorrer nos próximos dias
O Parlamento da Ucrânia aprovou nesta quarta-feira um estado de emergência após o governo adotar uma série de medidas de preparação para uma guerra, desde convocar reservistas a pedir para seus cidadãos deixarem a Rússia imediatamente. Autoridades ressaltaram, no entanto, que as medidas buscam somente manter a calma no país e proteger a sua economia, em um momento em que uma invasão da Rússia parece iminente. De acordo com a imprensa dos EUA, a inteligência americana alertou Kiev que um ataque poderia ocorrer nas próximas 48 horas.
O estado de emergência nacional está previsto para durar 30 dias, prorrogáveis por mais 30, no qual serão aplicadas restrições especiais, disse antes da votação do Parlamento Oleksiy Danilov, a principal autoridade de segurança do país, após uma reunião do Conselho de Segurança.
Ao mesmo tempo, porém, o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, pediu "garantias de segurança" à Rússia e reiterou a sugestão de manter negociações diretas com o presidente Vladimir Putin. A declaração foi dada em uma entrevista coletiva, em Kiev, ao lado do presidente da Polônia, Andrzej Duda, e do presidente da Lituânia, Gitanas Nauseda.
A introdução do estado de emergência confere poderes especiais às autoridades, incluindo restrições ao transporte, envio de proteção adicional para instalações de infraestrutura essenciais e a proibição de greves. As autoridades regionais podem tomar decisões sobre a introdução de toque de recolher e outras medidas, disse Danilov.
— Dependendo das ameaças que possam surgir em determinados territórios, haverá um estado de emergência mais forte ou mais fraco. Estamos falando de áreas fronteiriças, onde temos fronteira com a Federação Russa, com a Bielorrússia — disse Danilov.
Danilov reiterou que a Ucrânia ainda não estava decretando uma mobilização geral nem tampouco impondo lei marcial. Esta corresponderia a restrições mais duras, que poderiam incluir proibições de reuniões, movimentos e partidos políticos. Alguns parlamentares pediram para ela ser decretada. A medida pode vir a desencadear uma reação da Rússia.
— Se necessário, esta disposição será adotada imediatamente — disse ele.
Desde o começo da crise, o governo ucraniano tenta transmitir mensagens de tranquilidade, em uma estratégia para conter danos à sua economia e evitar gerar pânico. Na terça, o Senado russo aprovou o envio dos militares a duas regiões separatistas no Leste da Ucrânia, mas o presidente Putin disse que ainda não sabe quando e se vai enviá-los.
Moscou continua negando que pretenda uma invasão em grande escala da Ucrânia, mas nesta quarta começou a retirar seu pessoal diplomático de Kiev.
Pouco antes das movimentações oficiais, de acordo com a CNN, o governo dos EUA alertou a Ucrânia de que um ataque de grande porte vindo da Rússia era iminente — antes, a revista Newsweek, também citando fontes na comunidade de inteligência, afirmou que o alerta apontava que o ataque poderia ocorrer "nas próximas 48 horas". Informações semelhantes também foram repassadas pela Otan, e elas apontavam que "ninguém sabe exatamente" o que Putin fará.
Um ponto de preocupação para a Casa Branca seria a cidade de Kharkiv, próxima à fronteira com a Rússia, mas o chanceler ucraniano declarou, de maneira incisiva, que não há planos de retirar a população da cidade.
Ouvido pela CNN, um integrante da comunidade de inteligência ucraniana afirmou não ter verificado as informações repassadas pelos EUA, mas apontou que, no passado, Washington fez alertas semelhantes que acabaram não se concretizando — na semana passada, veículos de imprensa chegaram a afirmar que uma invasão "total" ocorreria no dia 16, e poderia contar com ataques aéreos e uma ampla ação terrestre. Tais declarações, em especial sobre as alegadas datas para uma invasão total, foram ironizadas pelos russos em diversas ocasiões.
Zelensky pede garantias de segurança
Em entrevista nesta quarta, o presidente ucraniano afirmou que precisa de garantias de segurança da Rússia e dos países ocidentais, que já disseram que não combaterão ao lado dos ucranianos se houver uma guerra em grande escala, já que o país não pertence à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e, portanto, não é beneficiário da cláusula de defesa mútua em caso de agressão externa.
— A Ucrânia precisa de garantias de segurança claras e concretas, imediatamente. Creio que a Rússia deve estar entre os países que nos deem essas garantias. Já sugeri muitas vezes que o presidente da Rússia se sente à mesa de negociações e fale — disse Zelensky em entrevista coletiva.
Acompanhado dos presidentes da Polônia e da Lituânia, o líder ucraniano pediu também que os países ocidentais subam ainda mais o tom contra Moscou e disse que está organizando, em conjunto com a Europa, uma resposta "aos crimes cometidos pela Rússia".
— Os ucranianos são uma nação pacífica. Queremos silêncio. Mas se hoje nos calarmos, amanhã desapareceremos — disse.
No Twitter, Zelensky agradeceu o apoio de Duda e Nauseda. "Tive um diálogo produtivo com @AndrzejDuda e @GitanasNauseda", escreveu. "Continuaremos a coordenar claramente nossos esforços para combater a agressão da Rússia e diminuir o conflito. Grato aos Estados amigos pelo seu apoio, pois o futuro da segurança europeia está sendo decidido agora na Ucrânia".
Na terça, Putin disse que a situação poderia ser resolvida se a Ucrânia abrisse mão da demanda de entrar na Otan e declarasse sua neutralidade, modelo semelhante ao adotado pela Finlândia durante a Guerra Fria. Putin disse ainda que a Ucrânia deve se desfazer de armamentos que recebeu da aliança militar ocidental.
Nesta quarta, Putin, apesar das sanções anunciada na véspera pelas potências ocidentais, prometeu que não cederá às pressões e afirmou que "os interesses e a segurança" de seus cidadãos "não são negociáveis".
O presidente russo falou em um breve discurso televisionado sobre o Dia do Defensor da Pátria. Ele disse, no entanto, estar "aberto ao diálogo direto" com os países ocidentais, mas sempre exigindo que a Ucrânia nunca seja admitida na Otan, o que ele considera um risco à segurança da Rússia.
Visitas proibidas
Além do estado de emergência, o governo ucraniano pediu para seus cidadãos não visitarem a Rússia, e alertou que ucranianos que já estão no país vizinho devem sair imediatamente. Em comunicado, o Ministério das Relações Exteriores afirmou que ignorar essas recomendações "complicará significativamente" a proteção adequada de ucranianos em território russo.
"O Ministério das Relações Exteriores recomenda que os cidadãos ucranianos se abstenham de quaisquer viagens à Federação Russa. Quem está neste país deve deixar o território imediatamente", informa o comunicado. Quase três milhões de ucranianos vivem na Rússia.
Países como Portugal, Brasil, Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, Noruega, Dinamarca, Bélgica, Países Baixos, Alemanha, Espanha, Israel, Austrália, Nova Zelândia, Japão, Iraque, Kuwait e Itália já pediram aos seus cidadãos que deixem a Ucrânia. Na terça-feira, Moscou pediu a seus diplomatas para deixarem o país vizinho.
Após um decreto do presidente Zelensky, as Forças Armadas da Ucrânia informaram em comunicado que começaram a recrutar reservistas com idades entre 18 e 60 anos. A Ucrânia tem quase 200 mil reservistas e 250 mil militares na ativa nas Forças Armadas.
Na terça-feira, Zelensky, que pediu "armas" e garantias de apoio da União Europeia, mencionou a possibilidade de romper relações diplomáticas com Moscou. O Parlamento da Ucrânia também avalia aprovar uma lei que permitiria o porte de armas de fogo por civis.
No Twitter, o chanceler ucraniano, Dmytro Kuleba, pediu que o Ocidente imponha sanções mais duras contra o governo russo.
"Para impedir Putin de mais agressões, pedimos aos parceiros que imponham mais sanções à Rússia agora. Os primeiros passos decisivos foram dados ontem, e estamos gratos por eles. Agora a pressão precisa aumentar para parar Putin. Ataquem sua economia e comparsas. Ataquem mais. Ataquem forte. Ataquem agora", escreveu.
Soldado morto em bombardeio
Um soldado foi morto e seis ficaram feridos após bombardeios por separatistas pró-Rússia, no leste da Ucrânia, nas últimas 24 horas. Conforme militares ucranianos, as violações do cessar-fogo continuam em alto nível.
A Ucrânia acusou a Rússia de provocar violência, usando isso como pretexto para reconhecer formalmente o Leste do país como independente e transferir tropas russas para a região, precipitando uma crise que o Ocidente teme que possa desencadear uma grande guerra.
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