Entenda por que EUA está longe de controlar a pandemia do Covid-19
Apesar do temor com uma segunda onda de casos, alguns especialistas afirmam que o país ainda está em uma primeira leva de casos
Por BBC News Brasil | | Mike Hills - BBC |
O noticiário nos Estados Unidos tem sido dominado pelas manifestações antirracistas das últimas semanas, mas a pandemia de coronavírus voltou às manchetes.
Diversos Estados têm registrado um número recorde de casos registrados nos últimos dias, ampliando o temor de que o país esteja enfrentando uma segunda onda de infecções. Alguns especialistas, no entanto, afirmam que os EUA ainda estão na primeira onda.
Para o vice-presidente americano, Mike Pence, esses temores são "exagerados". Ele acusou a mídia de usar “previsões sombrias” para assustar o povo americano.
O que está acontecendo nos EUA então?
Número de infecções está crescendo
Com mais de 2 milhões de casos registrados, os Estados Unidos têm o maior número de infecções confirmadas no mundo , quase um quarto do total global. O Brasil está em segundo lugar, com mais de 1 milhão, segundo a Universidade Johns Hopkins.
A situação piorou bastante no fim de março, mas em maio os casos entraram em declínio e a maioria dos Estados começou a flexibilizar restrições de circulação de pessoas adotadas para conter o espalhamento do vírus.
No entanto, o número de novos casos esteve poucas vezes abaixo de 20 mil, já que havia alguns Estados com a epidemia sob controle e outros onde as infecções estavam em alta.
Por essa razão, Anthony Fauci, considerado o mais importante especialista em doenças infecciosas do país e um dos principais integrantes da força-tarefa criada pela Casa Branca para responder à pandemia, afirma que a situação atual é uma continuação dos surtos iniciais.
“As pessoas ficam falando e falando sobre segunda onda. Mas ainda estamos na primeira onda”, disse Fauci a jornalistas.
Picos de casos em novos locais levaram os números gerais a aumentar por diversos dias pela primeira vez desde que o país chegou ao pico, no início de abril.
Enormes diferenças regionais
A região Nordeste foi de longe a mais atingida, com um quarto dos novos casos e mais de um terço das mortes nos Estados de Nova York e Nova Jersey. Mas nas últimas semanas, os dois Estados controlaram o espalhamento da doença.
O Sul e o Oeste do país, por outro lado, têm enfrentado um grande aumento do número de infecções, segundo dados compilados pela plataforma online COVID Tracking Project .
Não há divergências se os casos estão crescendo de novo, mas sobre os motivos.
O presidente americano, Donald Trump , culpou o aumento do número de testes realizados. Ao jornal americano The Wall Street Journal , ele afirmou que a testagem “é superestimada” porque “nos deixa mal na fita de diversas maneiras”.
Os Estados Unidos fizeram o maior número de testes no mundo, cerca de 25 milhões até agora, logo isso explica em parte porque o país está em primeiro lugar em total de casos. Mas as comparações internacionais são sempre bastante complicadas por diversas limitações.
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Os dados disponíveis, no entanto, mostram que o aumento de casos registrados vai além da ampliação da realização de testes.
Mais testagem?
Duas vezes na semana passada, o Estado do Arizona registrou mais casos novos em seu território do que todos os nove Estados da região Nordeste, e isso não se deve apenas ao aumento do número de testes.
Se o número de exames cresce enquanto o espalhamento do vírus está caindo, a taxa de diagnósticos positivos tenderia a cair.
Atualmente, a taxa de casos positivos em âmbito nacional está abaixo de 5%, patamar recomendado pela Organização Mundial da Saúde ( OMS ) para que os países não ultrapassem, nas duas semanas que antecedem a flexibilização das restrições de movimento dos cidadãos.
Mas um terço dos Estados está acima desse limiar, como mostra o gráfico abaixo, e muitos deles adotaram medidas de reabertura no último mês.
O número de pessoas hospitalizadas também aumentou em diversos desses Estados, incluindo o Texas, onde bares e restaurantes que reabriram estão fechando as portas novamente, segundo reportagens do jornal Texas Tribune , por temerem uma nova explosão de casos.
De um lado, os casos crescem e, de outro, a economia anseia desesperadamente por uma retomada.
Por causa disso, autoridades apostam no uso de máscaras para ajudar a conter o espalhamento do vírus. Califórnia, Carolina do Norte e diversas cidades do país recomendaram ou tornaram obrigatório na semana passada o uso de máscaras em locais públicos.
O uso de máscaras, no entanto, ganhou contornos políticos nas últimas semanas. Para Trump , algumas pessoas usam máscara para mostrar oposição a ele.
Tendência de queda das mortes
Em meio aos temores sobre novos focos de casos, a notícia mais positiva até agora nos Estados Unidos é a queda do número diário de mortes.
Elas atingiram um pico em maio quando o avanço da pandemia na região Nordeste estava em seu momento mais intenso, com mais de mil mortes por dia. Na semana passada, giravam em torno de 40 por dia.
No entanto, o número de mortes é uma métrica atrasada em relação ao total de casos e de hospitalizações porque as pessoas que morrem por causa de covid-19 ficam semanas doentes. Isso significa que as consequências da atual disparada de casos só será percebida nas estatísticas daqui a algumas semanas.
Se houver uma explosão de mortes, deve haver pressão sobre alguns governantes para reintroduzir restrições à circulação de pessoas, mas Anthony Fauci avalia que isso não será levado adiante.
“Eu não acho que não discutiremos se vamos voltar ao confinamento total. Acho que trataremos de como achar melhores formas de controle para aquelas áreas do país que tiveram aumento dos casos.”
Pesquisadores estão correndo contra o tempo para desenvolverem vacinas eficazes e seguras, mas a população mundial deve ter que conviver com o vírus no mínimo até o próximo ano.
Até agora, os Estados Unidos já registraram 120 mil mortes, o mais alto número no mundo.
Segundo o modelo matemático desenvolvido por pesquisadores da Universidade de Washington, que é uma das principais balizas usadas pela Casa Branca, o número de mortos deve passar de 200 mil em outubro, véspera da eleição presidencial.