Casa em que morava Alfredo Stroessner no Paraguai tem ossadas enterradas
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Casa em que morava Alfredo Stroessner no Paraguai tem ossadas enterradas


O governo do Paraguai começou nesta terça-feira a investigação sobre ossadas encontradas, no início do mês, na casa onde morou o ditador paraguaio Alfredo Stroessner , em Ciudad del Este. Os ossos foram achados no banheiro da residência por pessoas que invadiram a casa. Peritos da Equipe Nacional para Investigação, Busca e Identificação de Pessoas Detidas e Desaparecidas (Enabi) recolheram também outros ossos, como partes de fêmures e de um braço.

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O chefe da equipe de memória do Ministério da Justiça do Paraguai , Rogelio Goiburú, que coordena a equipe forense de investigação da Enabi, explicou que a análise dos ossos poderá determinar o perfil biológico e a causa da morte, não descartando a possibilidade de terem sido trazidos de outro lugar, já que estavam revirados quando foram encontrados. Ele afirmou que serão realizadas análises do solo, da acidez da terra, para determinar o tempo que os ossos permaneceram no local e se há confirmação de que aquelas pessoas foram mortas na época da ditadura paraguaia.

"Entre as ossadas encontradas estão três crânios de adultos, sendo um de adulto pequeno, dois fêmures, três ossos largos e um osso úmero (osso do braço entre o ombro e o cotovelo). Os ossos foram retirados do local e serão encaminhados para o laboratório forense da Argentina, que tem melhor experiência em extração de perfil genético de ossos, e posteriormente serão comparados com o sangue de familiares de desaparecidos nas ditaduras do Paraguai e da Argentina em uma base de dados genéticos", explicou Goiburu.

A equipe forense iniciou os trabalhos na mansão nesta terça. Após terminarem a escavação no banheiro, onde as ossadas foram encontradas, continuarão pesquisando no restante do terreno, pelo menos até esta quinta. O local é conhecido como a “  Casa do terror  ” em razão dos relatos de torturas que aconteciam na época em que o ditador governava o Paraguai, entre 1954 e 1989.

"Pessoas próximas à casa disseram que escutavam gritos. Hoje, quando chegamos, várias pessoas inclusive comentaram novamente isso. Vamos tomar depoimentos que farão parte da investigação", complementa Goiburú, também filho de um desaparecido da ditadura na Argentina.

O jornalista Aluízio Palmar, presidente do Centro de Direitos Humanos e Memória Popular de Foz do Iguaçu, afirmou ao GLOBO já ter publicado denúncias de jovens brasileiros que desapareceram na década de 1970, aliciados para festas promovidas na casa do ditador:

"Na mansão tem uma suíte e mais três quartos, além da cozinha, três banheiros e sala de estar. No terreno há ainda três guaritas, um grande alojamento com cozinha e dois banheiros. Um túnel liga a mansão ao alojamento. Essa casa era usada pelo ditador quando ele vinha para a fronteira", relembra.

Depois de deposto, Stroessner recebeu asilo político no Brasil. Morreu em Brasília, em 2006, com 96 anos. Ele governou o Paraguai até ser derrubado por outro golpe militar articulado por seu próprio genro e aliado político, Andrés Rodriguez.

"O asilo político no Brasil é um instituto previsto na Constituição Federal que tem por finalidade dar proteção a pessoas que sejam perseguidas por suas opiniões políticas por algum Estado. No contexto latino-americano, a concessão de asilo a ex-governantes decorre da tradição, na forma de norma costumeira, sendo concedido em situações em que um governante tenha sofrido um golpe e procura se refugiar em algum outro país. O governo brasileiro sistematicamente ignorou os pedidos de extradição de Stroessner formulados pelo governo paraguaio", explicou o professor de Direito Internacional Fábio Aristimunho Vargas.

Durante o regime de Stroessner houve repressão a grupos de oposição e, em 1992, cerca de 700 mil documentos das forças de segurança foram tornados públicos. Conforme documentos da Comissão da Verdade e Justiça do Paraguai, mais de 2 mil pessoas foram assassinadas durante o período da ditadura, mas para o perito, este número deve ser ainda maior:

"Não é possível estimar a quantidade de mortos. O Paraguai fez parte da Operação Condor, uma espécie de colaboração entre diferentes ditaduras sul-americanas. Houve também matança dos povos originais do Paraguai, os indígenas, que não tinham documentos. Sem falar no sequestro de meninas que nunca voltaram para casa. Eram pelo menos 50 meninas, entre 8 e 14 anos, por ano, o que torna impossível calcular quantas pessoas foram no total durante os 35 anos de regime ditatorial", finaliza.

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