Quando se pensa em brasileiros interessados em viver nos Estados Unidos
, o que logo vem à mente são as pessoas que tentam chegar ao país atravessando a fronteira com o México
longe do olhar das autoridades ou entram como turistas e acabam extrapolando o tempo do visto. Mas cresce o número de profissionais com graduação e currículo extenso em suas
áreas de atuação que decidem emigrar para os Estados Unidos, passando por todos os ritos legais para viver o sonho americano.
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No ano passado, o Departamento de Imigração dos EUA emitiu 4.458 vistos para brasileiros que decidiram viver, para trabalhar ou estudar, no país. O número representa um
crescimento de 27,3% na comparação com o ano anterior. Até 2014, a concessão desse tipo de visto não passava de 2 mil por ano.
— Aumenta a quantidade de profissionais liberais já estabelecidos no Brasil e de executivos com experiências em grandes empresas que querem a segurança pública e a boa educação
para os filhos disponíveis nos Estados Unidos — diz Leonardo Freitas, especialista em imigração do Hayman-Woodward, escritório de advogados especializados nesse tipo de
processo.
Dados do Itamaraty estimam que há 1,6 milhão de brasileiros em cidades americanas. Embora não haja pesquisas recentes, estima-se que a maioria, sobretudo de jovens, entrou no
país de forma ilegal ou não voltou ao Brasil após o fim do prazo previsto no visto de turista. Mas as características de quem entra legalmente chama a atenção.
Com base na análise dos dados oficiais do governo americano, o Hayman-Woodward publicou uma pesquisa que mostra o perfil dos brasileiros que receberam o visto de permanência no
ano passado. A maior parte, 89%, têm no mínimo graduação, e 66% estão na faixa entre 30 e 49 anos. A partir do histórico de dados dos seus clientes, o Hayman-Woodward estima que
a renda média do brasileiro que emigra para os EUA é de US$ 55 mil ao ano, pouco acima da renda média do americano, que é de US$ 53 mil.
— Ano a ano vem crescendo a intenção de residência permanente por parte do brasileiro. Isso começou há uns cinco anos, quando o Brasil começou a perder força econômica.
Diferentemente do passado, vivemos uma fuga de cérebros. São profissionais com mestrado, doutorado — diz Pedro Drummond, sócio da consultoria Drummond Advisors.
O Texas foi o destino de André Dayan, de 50 anos, veterinário que vendeu a empresa que tinha em Ribeirão Preto (SP) e embarcou há três anos com a família para College Station,
cidade de cerca de 100 mil habitantes no Texas. As filhas hoje têm 5 e 6 anos.
— Escolhi um lugar que pudesse ser bom para educar minhas filhas. A cidade é pequena e muito segura. Claro que sentimos falta dos confortos no Brasil e da família, mas não vamos
voltar tão cedo — disse.
Dayan foi para os Estados Unidos com o visto O-1, destinado a pessoas com habilidades especiais. No caso dele, contava a experiência na área de reprodução animal. Entre o início
do planejamento, o pedido de visto e a autorização, o veterinário levou cerca de um ano. Ele está agora no processo de mudar a categoria do visto para EB1, que não necessita de
renovação anual e permite que o seu portador peça um green card , ou seja, estabeleça residência permanente no país.
A adaptação mais simples foi a das crianças. Para o casal, a saudade dos hábitos brasileiros é suprida da forma que é possível. Fazem caipirinha em casa e já encontraram empresas que vendem produtos brasileiros, como o filtro de barro São João — com preço de US$ 200 (cerca de R$ 815) por exemplar.
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Opção mais procurada
São muitas as categorias de visto para imigrar para os EUA, mas as mais pedidas são as baseadas em habilidades extraordinárias. Formação e experiência na área de saúde,
economistas, profissionais de tecnologia da informação e piloto de avião são algumas das carreiras que têm demanda alta em solo americano.
Drummond alerta que, mesmo com visto, há condicionantes nessas autorizações de trabalho, que devem ser cumpridas para evitar deportação.
— O importante é nunca violar os termos do visto. Eles têm limitações de tempo e escopo, ou seja, quanto tempo pode ficar e o que pode fazer. Se violar, está sujeito a deportação e a não ter outros tipos de visto emitidos — reforça, referindo-se às pessoas que possuem visto de negócios ou de turismo e tentam trabalhar nos EUA.
Uma outra categoria de visto é o L-1, que é destinado a quem exerceu função executiva ou de gerência no Brasil por no mínimo três anos e é transferido para uma filial americana.
Esse foi o visto utilizado por Guilherme Cerqueira. Ele criou uma start-up, a Worthix, que recebeu investimentos de um fundo americano. Foi quando percebeu que seria mais
estratégico se a sua ideia, que consiste na oferta de pesquisas de satisfação de clientes com o uso de inteligência artificial, fosse explorada primeiro nos EUA.
O visto foi conquistado em 2016. Além do processo burocrático, que durou em torno de seis meses, ele conta que a autorização precisava ser renovada anualmente e que sempre havia
o receio de vetarem o retorno aos EUA após alguma viagem para fora.
— O mais difícil era essa incerteza. É muito ruim a sensação de ter feito uma aposta de vida, com a família toda e viver a insegurança se vai conseguir entrar no país onde agora
é sua casa — disse Cerqueira.
Como já está há três anos no país, ele conseguiu fazer o pedido para um green card.
Sua empresa conta com 34 funcionários, sendo metade de estrangeiros. Cerqueira reconhece os
estímulos para se empreender nos Estados Unidos, como menor burocracia e acesso a recursos financeiros, mas conta que tinha a ilusão de que seria mais fácil:
— O acesso ao capital é para todos, inclusive para seus competidores. No Brasil, há obstáculos, mas quando você engrena, chega mais rápido ao topo. Aqui, é mais lento e o topo
está mais longe.
Ainda assim, ele e a mulher não têm planos de voltar para o Brasil. A família está em Atlanta, no estado americano da Georgia, e a ideia é que a filha, de 7 anos, e o filho, de 13, cursem faculdade lá.
‘The book’s on the table’
Para quem tem a intenção de ir para os EUA se valendo da qualificação profissional, os especialistas lembram que o inglês precisa ser fluente, muito além do nível básico. Isso
será necessário para facilitar a colocação no mercado de trabalho. Outro ponto é a escolha da cidade que será a nova residência. Mais importante do que escolher um lugar que
gosta ou que possa ser o destino de férias dos sonhos, o imigrante deve levar em conta as oportunidades de trabalho.
Planejamento é necessário para quem quer esse caminho. O processo, a depender do tipo de visto, pode durar de seis a 18 meses. Os gastos também variam de acordo com o tipo de
visto, mas ficam entre US$ 5 mil e US$ 35 mil. Além disso, é sugerido levar ao menos entre US$ 25 mil e US$ 50 mil (a depender da cidade escolhida) para os gastos de instalação
e os primeiros meses.
Investimento vai subir
Outra forma de pedir a residência é arrumar emprego em uma empresa americana. Nesse caso, o visto é “patrocinado”. Ainda assim, isso só é feito nos casos em que não há
profissional equivalente disponível nos EUA.
O EB-5 é um visto bem conhecido, mas que atende uma parte menor dos brasileiros que pretendem morar nos EUA. Nesse caso é preciso investir ao menos US$ 500 mil em um projeto que vá gerar ao menos dez empregos. A partir de 21 de novembro, esse valor sobe para US$ 900 mil. Em 2018, foram emitidos 388 vistos dessa categoria para brasileiros — há um limite anual de 700, que nunca foi atingido.
Gustavo Marchesini, gerente de relacionamento da EB5 Capital, empresa especializada em projetos voltados para a obtenção desse tipo de visto, diz que, em 2019, o número ainda
deve subir, com os brasileiros se antecipando ao aumento. Depois, a tendência é de redução.
Independentemente de uma eventual queda na emissão dos EB-5, a expectativa das empresas voltadas para a emigração de brasileiros é de que a procura por outros tipos de visto
tende a aumentar com a manutenção do alto desemprego no Brasil, que reduz oportunidades mesmo para profissionais mais qualificados.
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Entenda o caminho para solicitar um visto
Há mais de um tipo de visto para quem quer viver e trabalhar nos Estados Unidos. Veja qual pode se encaixar no seu perfil:
Vistos temporários - O H1B serve para quem recebe proposta de emprego nos EUA, que ocorre apenas quando o contratante não encontra profissional equivalente no mercado americano. Permanência no país está atrelada ao contrato de trabalho.
O O-1 é para quem tem habilidades extraordinárias nas áreas científica, artística, educacional, esportiva e de negócios. É preciso comprovação dessa aptidão. É renovado
anualmente e tem um prazo máximo de 3 anos.
O L-1 funciona para quem foi executivo ou exerceu cargo de gerência por ao menos três anos e é transferido para uma filial americana. Em alguns casos, é possível posteriormente
solicitar o “green card”.
O J1 é o visto de trainee para quem vai passar um período de experiência em alguma empresa dos EUA. O prazo costuma ser de até 18 meses.
O F1 é um visto de estudo, mas, após a conclusão de determinados cursos, é possível trabalhar por um período de 12 meses como trainee e aí tentar uma vaga efetiva nos EUA.
Vistos de caráter permanente - O EB-1 é similar ao O-1. No caso de professores e pesquisadores, é preciso uma oferta de trabalho prévia. Nesta categoria de visto, já há a
intenção de residência permanente e solicitação posterior do “green card”.
O EB-5 serve para casos de imigração com base em investimentos de no mínimo de US$ 500 mil, em algumas regiões, ou de US$ 1 milhão. Os valores passarão para US$ 900 mil e US$
1,8 milhão em 21 de novembro. É preciso provar a geração de ao menos dez empregos diretos e a origem lícita dos recursos. Dá direito a residência permanente.
Consultoria - O processo é burocrático e exige a apresentação, tradução e checagem de uma série de documentos. O aval pode demorar de seis meses a quase dois anos. O processo
deve ser feito com ajuda de advogado especialista em imigração e o custo pode variar de US$ 5 mil e US$ 35 mil
Planejamento - É preciso levar em conta os gastos com instalação e os primeiros meses até a colocação profissional. O recomendado é chegar com economias entre US$ 25 mil e US$
50 mil, a depender da cidade e se a família vai junto ou não. Nos vistos temporários, não é permitido que o conjugê trabalhe, com exceção do L1.