Setor espacial russo enfrenta denúncias de corrupção e desvios milionários

Investigação sobre corrupção em agência espacial russa completa 5 anos e revela desvios milionários de verbas destinadas a construção de nova base

Setor espacial russo enfrenta denúncias de corrupção
Foto: Russia Beyond
Setor espacial russo enfrenta denúncias de corrupção


Funcionários presos ou em fuga no exterior, bilhões de dólares desviados, projetos abandonados ou adiados. A Roscosmos, a empresa estatal responsável pelo programa espacial russo, é personagem central de um dos mais longos e amplos inquéritos de corrupção desde o fim da URSS. Há cinco anos o Comitê Investigativo da Rússia - responsável por investigações em âmbito federal - analisa contas, pessoas e investimentos feitos no setor aeroespacial. 

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De acordo com o chefe do comitê, Alexander Bastrykin, foram encontradas fraudes de corrupção no valor de 1,6 bilhão de rublos, equivalente a R$ 100 milhões, apenas em 2017. Mas ele mesmo reconheceu que o valor pode ser bem maior, sinalizando que a investigação não tem prazo para acabar.

Em meio às buscas, vários executivos do setor já deixaram a Rússia. Um deles foi o chefe de um instituto de pesquisas dedicado ao desenvolvimento do Glonass, um sistema de posicionamento global que tenta rivalizar com o GPS e é considerado uma das prioridades do governo. Yuri Yaskin deixou o país em abril, alegando uma viagem de negócios. Em seguida apresentou seu pedido de demissão, pouco antes do início de uma auditoria nas contas do instituto. A Roscosmos confirmou a saída do executivo, porém sem revelar os motivos.

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Outro caso de corrupção famoso na Rússia foi o da base de lançamento de Vostochny, no extremo leste do país. Segundo promotores, cerca de US$ 126 milhões foram desviados desde o início das obras, em 2011. O ex-presidente de uma empreiteira que participava da construção chegou a ser condenado a 12 anos de prisão por fraude. Vostochny é considerada uma prioridade na política espacial russa e até aparece na nota de 2000 rublos. Até hoje a obra custou o equivalente a US$ 7,5 bilhões.

O presidente Vladmir Putin também falou sobre os casos de corrupção. Em abril, sem mencionar os problemas legais envolvendo a agência, disse que o país tinha que “progressivamente resolver os óbvios problemas que atrasam o desenvolvimento do setor”.

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Considerado uma das maiores glórias da ex-URSS, o setor espacial quase desapareceu no caos dos primeiros anos da década de 1990. Para sobreviver, a agência espacial recorreu ao capital privado e externo, investindo em lançamentos de satélites e, eventualmente, turistas espaciais.

Com a retomada da economia russa nos anos 2000, o governo passou a investir mais no setor espacial, agora com um enfoque mais estratégico. Os foguetes de lançamento Soyuz passaram a ser veículos prioritários de transporte para a Estação Espacial Internacional, ainda mais depois do fim das viagens dos ônibus espaciais dos EUA.

Porém o orçamento foi ficando menor ao longo dos anos, refletindo diretamente nas pesquisas. Falando à agência France Presse, o jornalista especializado em políticas aeroespaciais Vitaly Yegorov afirmou que apenas um projeto é intocável: o da participação russa na Estação Espacial Internacional.

Para Vitaly, a agência espacial russa funciona hoje com o seguinte pensamento: “nos deem o dinheiro e nós vamos lançar alguma coisa...algum dia.”

Em entrevista à agência France Presse, a Roscosmos afirmou que “erradicar a corrupção é um de seus maiores objetivos”, e que vem colaborando com as autoridades.