Bolsa é um auxílio que tenta reduzir a distância entre estudantes e o ensino superior
Marcello Casal Jr/Agência Brasil
Bolsa é um auxílio que tenta reduzir a distância entre estudantes e o ensino superior

Estudantes negros e indígenas egressos de escolas públicas que irão fazer o Enem 2020 ganharam apoio de voluntários de todo o Brasil para manter os estudos em dia durante a pandemia do novo coronavírus.





Por meio de uma “vaquinha on-line”, o Movimento Amplia conseguiu arrecadar até agora R$ 67 mil na campanha “Siga Firme”, que vai oferecer bolsas aos estudantes, possibilitando o acesso à internet 4G e permanência no ensino superior, com suporte básico para alimentação e auxílio transporte.

A campanha voltada para a população vulnerável segue recebendo doações até o dia 18 de agosto e pretende apoiar até 13 mil pessoas que comprovarem ser de baixa renda e querem cursar faculdade. 

A ação solidária é segunda campanha realizada pelo Movimento Amplia , organizado pela sociedade civil, sem fins lucrativos. A primeira delas girou em torno do pagamento de 120 boletos do Enem 2020 para estudantes que comprovaram ser de baixa renda e não tiveram acesso à isenção dos R$ 85,00 exigidos para participar do exame.

estudante enem
Arquivo pessoal

O sonho de Lara é conseguir uma vaga no curso de Psicologia

Esse é o caso de Lara Rayssa, mulher negra, de 20 anos, moradora da cidade de Ituiutaba, localizado no interior de Minas Gerais, ela quase adiou o sonho de tentar fazer Psicologia com a nota do Enem 2020 .

Mãe de uma criança com doença congênita e sem poder trabalhar devido aos cuidados integrais com o filho, ela não teve acesso a isenção mesmo após comprovar a baixa renda. Por meio das redes sociais ela se inscreveu no banco de candidatos ao auxílio e recebeu ajuda de um doador, que pagou o boleto por ela.

"Chorei, me emocionei, não acreditava, ajoelhei e agradeci a Deus, pois como muitos sabem, o negro muitas das vezes não tem vez. Por conta da cor e da classe social, somos discriminados,  excluídos, esquecidos. Mas um grupo de pessoas se lembrou da gente, nos deu esperança, nos deu valor, nos incluiu para que as pessoas entendam que, sim, o negro/indígena e pobre também pode sentar nas cadeiras da universidade", relata.

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Lara também está inscrita para ter acesso às bolsas do “Siga Firme” e vai ser beneficiada com com a parceria do TrieEduc, empresa de avaliação que disponibiliza simulados inéditos com questões padrão Enem e correção pela Tri de graça. 

Idealizador do Movimento Amplia , o professor de inglês Cristiano Ferraz explica que ações como essa fortalecem uma disputa mais igualitária por vagas no ensino superior para os estudantes não brancos e periféricos . Na visão dele, essa deveria ser uma questão prioritária tanto para o poder público quanto para a sociedade.

“Acho que a gente precisa hoje, sentar e falar: 'Que país a gente quer? Que sociedade a gente quer?’. O país do futuro, que eu quero, é um país que ligue todas as máquinas [públicas] para combater desigualdades educacionais, raciais. Para gente consiga construir uma sociedade mais justa, que ofereça oportunidade para todos e todas e que seu futuro nãos seja determinado pelo CEP em que você nasce”, explica.

A oportunidade almejada por Cristiano e construída por diversas mãos ao redor do Brasil também alcançou Caroline da Silva, de 27 anos, que mora em Bangu, no Rio de Janeiro. Ela, que define a própria trajetória como “complexa”, conta que tenta ingressar no ensino superior público há três anos. “Comecei a fazer Enfermagem em uma faculdade particular. Porém, não tive condições financeiras em continuar”.

estudante de enfermagem Enem
Arquivo pessoal

Sonho interrompido: Por falta de dinheiro, Caroline teve que deixar o curso de Enfermagem em uma faculdade particular

Em 2019, Caroline não conseguiu fazer o Enem porque não entrou para a lista dos isentos e não tinha como pagar a taxa de inscrição. Mãe solo de uma menina com 4 anos, ela enfrenta dificuldades para manter a filha e os estudos. “Entre crises e mais crises de ansiedade, depressão e síndrome do pânico, luto para poder dar uma vida digna a mim e a minha filha. Eu sou tecnica de enfermagem,  trabalho com home care, mas no momento tô sem escala devido à pandemia”.

Caroline teve a chance de se candidatar ao Enem 2020 , com boleto pago por voluntários do Movimento Amplia . “Foi a luz do fim do túnel na minha caminhada. Faltavam três dias para o vencimento e eu não tinha de onde tirar [o valor]. Essa iniciativa do movimento foi uma benção na minha vida”.

Hoje, ela divide a casa com a filha, o novo companheiro e os sogros. A renda da casa é mantida com o trabalho do marido, que tem atuado como Uber na pandemia. Para reforçar os conteúdos estudados, ela também se candidatou para ser bolsista pelo Amplia e vai se beneficiar com a parceria dos simulados feitos pelo TrieEduc.

Desigualdades ampliadas pela pandemia

Com o início da pandemia do  novo coronavírus no primeiro trimestre de 2020, estudantes mundo tiveram as aulas interrompidas. Em alguns municípios e estados, foi adotada a estratégia de conteúdos remotos para que os alunos não perdessem o ano letivo, principalmente os que estão prestes a realizar o vestibular. No entanto, grande parte dos estudantes não têm acesso à internet e não pode acompanhar os conteúdos digitais.

Segundo a Unicef , 4,8 milhões de crianças e adolescentes brasileiros não têm acesso à internet. A dificuldade se acentua quando os jovens são negros e indígenas: 1 a cada 4 não tem acesso a internet.

A falta de renda também implica na queda de candidaturas para o Enem . O número de inscrições na edição de 2020 é o menor registrado desde 2010. Neste ano, 6,1 milhões de estudantes se candidataram para realizar o exame. De acordo com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira ( Inep ), 83% dos inscritos confirmados na prova receberam a isenção. Após o prazo do pagamento da taxa de inscrição, houve uma nova queda queda no número de candidatos, que reduziu de 5,8 milhões. 

A prova do Enem 2020 está prevista para ser aplicada em 17 e 24 de janeiro para os 5,7 milhões de candidatos que optaram pela prova impressa, enquanto os demais 96 mil farão a prova digital em 31 de janeiro e 7 de fevereiro.

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