As falas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre não respeitar a lista tríplice de indicação para a Procuradoria-Geral da República (PGR) repercutiram negativamente nos corredores do Ministério Público. Os procuradores viram como uma "afronta" a decisão do presidente e disse que isso vai contra a independência entre os poderes.
Em entrevista à BandNews FM, Lula afirmou não pensar em lista tríplice e disse que o modelo já provou não funcionar. As falas f oram corroboradas pelo ministro da Justiça, Flávio Dino, em entrevistas para a GloboNews e Rede TV!.
As declarações desagradaram procuradores, que tinha expectativa de retomar a lista tríplice para premiar os servidores mais experientes. Nos dois primeiros governos, Lula seguiu a risca as indicações, dando o cargo para Claudio Lemes Fonteles, Antonio Barros e Silva e Roberto Gurgel Santos.
Em conversa com a coluna, procuradores apontaram a preocupação do “efeito Augusto Aras”, bancado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e que estava fora das indicações da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). Para eles, há possibilidade de o novo procurador-geral virar um “engavetador-geral da República”, apelidado dado a Aras por arquivar processos contra Bolsonaro.
Uma das fontes ainda disse que a indicação fora da lista tríplice inibe o trabalho do Ministério Público e prejudica investigações no Supremo Tribunal Federal. O procurador ainda ressaltou que se não cumprida a lista tríplice, Lula estará colocando em xeque suas declarações sobre independência do Judiciário.
Falas não são novidades
As falas de Lula sobre minar a lista tríplice não são novidades. Ele já afirmou, antes mesmo da campanha eleitoral, que quer um procurador que dê “direito de defesa” ao acusado.
O petista se usou como exemplo, na época em que foi preso na Operação Lava Jato. Na visão do presidente, o Ministério Público agiu em conluio para tirá-lo da disputa pelo Planalto em 2018.
Em outras oportunidades, Lula disse que o MP foi parcial e a PGR não fez nada para impedir uma “prisão injusta”. Na época, a procuradoria-geral estava sob comando de Raquel Dodge.
Negociações e indicações
Em nota, a ANPR disse que manterá o envio da lista tríplice e ressaltou que as indicações mantêm a transparência na escolha. A associação ainda vê margem para negociar com o Planalto a manutenção das indicações via lista tríplice.
Nos bastidores, a lista tríplice para este ano – prevista para ser entregue em agosto – deve trazer nomes mais pró-governo. Entre os possíveis indicados deve estar Nicolao Dino, irmão do ministro Flávio Dino, que esteve nas últimas duas listas para a PGR.
Dino é favorito na disputa e agrada a Lula. Na visão da cúpula petista, o procurador tem visão parecida com o governo sobre o direito de defesa, mas ainda há ressalvas sobre o histórico de processos dele.
Em 2017, quando chefiava o Ministério Público Eleitoral (MPE), Nicolao Dino pediu a cassação da chapa Dilma-Temer. Dino disse que Dilma sabia dos casos de caixa dois em sua campanha em 2014.
“Restou demonstrados nos autos que a então candidata Dilma Vana Rousseff tinha conhecimentos sobre a forma dos pagamentos realizados a João Santana, responsável por sua campanha, via caixa dois”, afirmou, na época.
Ele ainda pediu que Dilma ficasse oito anos inelegível. O pedido foi rejeitado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
A troca na Procuradoria-Geral da República deve acontecer apenas em setembro, quando Augusto Aras completará seu segundo mandato à frente do Ministério Público. Antes, Lula deverá indicar um ministro para o Supremo Tribunal Federal, no lugar de Ricardo Lewandowski. O nome do advogado Cristiano Zanin, responsável por sua defesa quando esteve preso em Curitiba, desponta como favorito na disputa.