O surgimento de Próspera em Honduras, está profundamente enraizado nas iniciativas do país em superar desafios históricos como pobreza, corrupção e instabilidade econômica. Após a crise política de 2009, o governo hondurenho buscou estratégias inovadoras para revitalizar a economia e atrair investimentos estrangeiros. Em 2013, foi aprovada a lei que estabeleceu as Zonas de Emprego e Desenvolvimento Econômico (ZEDEs), áreas autônomas com estruturas legais e regulatórias próprias, inspiradas em modelos de cidades charter e zonas econômicas especiais ao redor do mundo. Próspera é uma dessas ZEDEs, concebida como um experimento pioneiro que visa criar um ambiente propício para o empreendedorismo, inovação e desenvolvimento sustentável, representando um capítulo significativo na trajetória histórica de Honduras rumo ao progresso socioeconômico.
As cidades-experimento diferenciam-se das metrópoles comuns principalmente por sua autonomia legal e regulatória. Enquanto as cidades tradicionais operam sob as leis e regulamentos nacionais, essas novas comunidades têm a capacidade de estabelecer seus próprios sistemas jurídicos e políticas econômicas. Isso permite a implementação de modelos disruptivos de governança, incentivos fiscais diferenciados e ambientes mais favoráveis à iniciativas empresariais e ao progresso. Essa flexibilidade regulatória cria um cenário propício para atrair investimentos estrangeiros e testar políticas públicas que seriam difíceis de implementar em estruturas urbanas convencionais.
Além disso, essas cidades são planejadas com foco em tecnologias avançadas, sustentabilidade e qualidade de vida. Ao contrário dos centros urbanos comuns, que muitas vezes crescem de forma orgânica e enfrentam desafios de infraestrutura e planejamento, as cidades-experimento são projetadas desde o início para serem eficientes, conectadas e ambientalmente responsáveis. Elas incorporam conceitos modernos de urbanismo, como uso de energia renovável e mobilidade sustentável, buscando não apenas atender às necessidades atuais, mas também antecipar futuras demandas públicas. Essa abordagem transformadora proporciona a sensação de que algo novo está nascendo, oferecendo um modelo alternativo de desenvolvimento urbano que pode inspirar mudanças em escalas globais.
Por exemplo, ao invés de seguir integralmente o sistema legal nacional de Honduras, Próspera implementa um conjunto de leis baseadas em modelos internacionais de direito comum (common law), o que permite maior flexibilidade nos contratos e nos negócios. Além disso, a cidade estabelece suas próprias políticas fiscais, podendo oferecer incentivos como redução de impostos e tarifas alfandegárias para atrair investidores. A gestão administrativa é conduzida por entidades privadas ou conselhos locais, permitindo uma tomada de decisão mais ágil e alinhada com as necessidades específicas da cidade, diferentemente da burocracia tradicional encontrada em municípios comuns. Essa autonomia facilita a implementação de inovações em governança, infraestrutura e serviços públicos, criando um ambiente propício para o desenvolvimento econômico e social.
Em cidades tradicionais, como São Paulo e a Cidade do México, os cidadãos enfrentam desafios estruturais que remontam a décadas, muitos dos quais são difíceis de resolver por causa da infraestrutura herdada. Trânsito intenso e transporte público ineficiente são grandes dores: em São Paulo, por exemplo, o crescimento desordenado e o aumento da frota de veículos levam a congestionamentos massivos, com uma média de mais de duas horas de deslocamento diário para muitos trabalhadores. Além disso, os serviços públicos de saúde são sobrecarregados; em cidades como Lagos, a população tem acesso limitado a hospitais e longas filas de espera por atendimento são a regra. Questões ambientais também são persistentes: no Cairo, altos níveis de poluição afetam a qualidade de vida, enquanto iniciativas verdes são escassas e difíceis de implementar devido à falta de espaço e à complexidade regulatória. Além disso, em cidades tradicionais, o cidadão costuma ser um observador passivo das decisões públicas, sem um mecanismo real de participação direta.
Por outro lado, novas cidades experimentais e ZEDEs, como Próspera em Honduras e NEOM na Arábia Saudita, foram projetadas desde o início com uma governança direcionada para solucionar essas dores. Em Próspera, por exemplo, a estrutura regulatória foi construída para maximizar a participação cidadã, com o uso de tecnologias blockchain para votações transparentes e rápidas, permitindo que os moradores participem das decisões sobre políticas locais de forma direta e segura. Em NEOM, a sustentabilidade e a inovação estão no centro do design urbano; a cidade é projetada para ser totalmente alimentada por energia renovável e equipada com sistemas de transporte autônomo e inteligente que eliminam a necessidade de veículos pessoais, reduzindo o congestionamento e a poluição. Em Charter Cities como a Talent City na Nigéria, a governança é orientada por desempenho, e os cidadãos têm a opção de escolher entre diferentes pacotes de serviços públicos, como saúde e educação, que competem em qualidade e eficiência, promovendo uma lógica de mercado que eleva os padrões de atendimento.
Essas novas cidades e ZEDEs oferecem soluções “by design” para os problemas urbanos persistentes, criando um ambiente onde participação cidadã ativa, eficiência governamental e sustentabilidade não são apenas metas aspiracionais, mas pilares centrais da sua fundação. Ao contrário das adaptações graduais em cidades antigas, esses novos experimentos de governança permitem que os cidadãos vivam em ambientes que já foram projetados para maximizar a qualidade de vida, resolver problemas complexos e promover uma governança ágil e inovadora.
Quando as grandes cidades foram criadas, os principais desafios da humanidade eram assegurar infraestrutura básica, como água e saneamento, organizar áreas para comércio local e garantir segurança física contra ameaças imediatas. Essas cidades cresceram e prosperaram, mas com estruturas e políticas pensadas para um mundo muito diferente do atual. Hoje, o cenário global se tornou muito mais complexo: enfrentamos crises ambientais sem precedentes, ameaças digitais como ciberataques e desinformação, além de riscos de armas de destruição em massa e questões emergentes de ética e segurança em inteligência artificial. Adaptar as cidades tradicionais a esses desafios é uma tarefa árdua, muitas vezes bloqueada por grupos de interesse estabelecidos, como corporações que lucram com a infraestrutura obsoleta ou políticos que resistem a mudanças que poderiam ameaçar seu poder e influência. Por exemplo, em cidades como Nova York e São Paulo, tentativas de criar sistemas de transporte mais sustentáveis enfrentam a oposição de setores tradicionais e a expansão de políticas ambientais pode ser travada por interesses imobiliários.
Diante dessa realidade, para lidar com os problemas e necessidades do século XXI, é crucial pensarmos em novos modelos de cidade que já nascem desenhados para esses desafios, com governança inovadora, estruturas flexíveis e centradas na participação cidadã. Exemplos como Próspera, NEOM e Talent City representam essa nova geração de cidades, onde o design urbano e as políticas de governança não carregam o peso das estruturas tradicionais, mas são focados em soluções inteligentes, sustentabilidade e no empoderamento do cidadão. Assim, dando mais opções para a sociedade, estaremos permitindo que eles ‘votem com seus pés’, como diz o ditado americano, - ou seja, migrem para locais melhores. Afinal, o mundo precisa urgente de novas cidades para novos tempos.