Helcio Zolini

Hugo Motta trai governo e afronta STF

Ao ceder à chantagem bolsonarista presidente da Câmara deixa aprovar anistia aos golpistas e gera crise institucional entre os Poderes

Hugo Motta abraçou a pauta da anistia após pressão de parlamentares bolsonaristas e golpistas
Foto: LULA MARQUES / AGÊNCIA BRASIL
Hugo Motta abraçou a pauta da anistia após pressão de parlamentares bolsonaristas e golpistas

Menos de uma semana após o Supremo Tribunal Federal (STF) ter condenado o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a 27 anos e 3 meses de prisão, por chefiar uma organização criminosa que tentou dar um golpe de Estado, o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), conseguiu não só ignorar um acordo com o presidente Lula, como também afrontar a maior Corte de Justiça do país, ao pautar e deixar aprovar um projeto inconstitucional e repudiado pela sociedade brasileira, destinado a anistiar os golpistas recém-condenados que atentaram contra o Estado Democrático de Direito.

Dias antes da aprovação ocorrida na noite desta quarta-feira (17), Motta havia firmado compromisso com o presidente Lula de que não colocaria em votação a urgência do projeto (cujo teor é desconhecido), por tudo que ele representa: por ser inconstitucional e ser um insulto ao STF.

No entanto, o deputado não resistiu à chantagem bolsonarista, iniciada com o motim parlamentar ocorrido nos dias 5 e 6 de agosto.

Ignorou sua promessa a Lula e permitiu que o projeto seguisse sua tramitação.

A decisão de Motta pegou mal e azedou ainda mais o clima que já estava pesado em relação à Câmara.

Ela tinha causado indignação na terça-feira (16) ao aprovar  a PEC da Blindagem, que dificulta prisões e processos contra parlamentares, concedendo-lhes uma espécie de Habeas Corpus para praticar crimes.

Com a anistia, além de criar tensão e esgarçar ainda mais a relação da Câmara com os Poderes Executivo e Judiciário, ela gerou estranhamento e mal-estar junto ao presidente do Senado e do Congresso, senador Davi Alcolumbre (União-AP), que já havia se posicionado contra a anistia e o projeto proposto pela Câmara dos Deputados.

Para defender sua manobra, Motta argumenta que o projeto é importante porque ele vai ajudar a "pacificar" o país.

Uma fala aparentemente construtiva, mas, sobretudo, ingênua ou mal-intencionada.

Motta ignora que a matéria é inconstitucional, conforme têm reafirmado os ministros do Supremo, principalmente o decano da Corte, Gilmar Mendes, e que projetos como esse não são nem um pouco pedagógicos para a sociedade e para o fortalecimento da democracia.

Ele omite do público que anistia por si só não pacifica coisa alguma.

Apenas estimula novos atos antidemocráticos e prepara o terreno para a próxima tentativa de golpe, que certamente virá.

Pelas baionetas empunhadas por futuros golpistas, que agirão com a certeza de que nada lhes acontecerá, por mais violentas que possam ser as suas ações.

E, de resto, provoca desde já, sem a menor necessidade, uma crise inconstitucional entre os Poderes da República, que poderá ter resultados imprevisíveis para o país.