
No primeiro dia do julgamento da Ação Penal (AP 2668 ) que apura a tentativa de golpe, o relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Alexandre de Moraes e o procurador-geral da República, Paulo Gonet destacaram a consistência das provas e reafirmaram as acusações contra os integrantes do Núcleo 1 (ou Núcleo Crucial).
O chefe da PGR pediu a condenação de Bolsonaro e dos outros sete auxiliares do seu governo, apontados como os autores intelectuais da trama.
Tanto Gonet quanto Moraes deixaram claro que houve a tentativa de golpe de Estado e que diante de tamanhas evidências deram a entender que não há possibilidade de absolver nenhum dos oito réus, eentre os quais estão militares de alta patente do Exército e da Marinha.
O relator relembrou todo o processo e a validação das provas coletadas pela Polícia Federal (PF).
Relatório
Moraes levou cerca de 1h40 para ler o seu relatório no Plenário da Primeira Turma do STF. Além de destacar a força das instituições, ele defendeu que a pacificação do país só é possível se houver respeito à Constituição e punição aos culpados.
"A impunidade e a covardia não são opções para a pacificação", afirmou.
O ministro lembrou que foram asseguradas as garantias do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório a todos os oito réus que integram o chamado “Núcleo 1” ou “Núcleo Crucial”, assim como foi feito nas demais 1.630 ações penais relacionadas aos atos de 8 de janeiro de 2023.
Ele afirmou que a missão do STF no julgamento da ação penal é analisar as acusações apresentadas pela PGR, a partir das provas produzidas sob a garantia do devido processo legal.
“Existindo provas, acima de qualquer dúvida razoável, as ações penais serão julgadas procedentes, e os réus condenados. Havendo prova da inocência ou mesmo qualquer dúvida razoável sobre a culpabilidade dos réus, eles serão absolvidos. Assim se faz a justiça”, destacou.
Numa indireta às pressões externas feitas pelo governo dos Estados Unidos, Moraes reforçou que o papel do STF é julgar com imparcialidade e aplicar a justiça a cada um dos casos concretos, e que isso ocorrerá independentemente de ameaças ou coações, “ignorando pressões internas ou externas”.
Para o ministro, a pacificação do país diante da polarização política depende do respeito à Constituição, da aplicação das leis e do fortalecimento das instituições.
Ele acrescentou que este momento da história brasileira só é possível porque o país conta com instituições fortes e independentes, que impediram retrocessos a partir das balizas firmadas pela Constituição Federal de 1988.
“O Supremo Tribunal Federal sempre será absolutamente inflexível na defesa da soberania nacional e em seu compromisso com a democracia, os direitos fundamentais, o Estado de Direito, a independência do Poder Judiciário nacional e os princípios constitucionais brasileiros”, enfatizou.
Moraes afirmou ainda que, ao longo do processo, foram identificadas condutas dolosas de uma "verdadeira organização criminosa" que tentou coagir o Judiciário e até submeter o funcionamento da Corte a interesses estrangeiros.
"Essa tentativa de obstrução não afetará a imparcialidade e a independência dos juízes deste STF, que continuarão a dar sequência ao devido processo legal, acompanhado por toda a sociedade e pela imprensa"
Após a leitura do relatório do ministro Alexandre de Moraes, foi a vez do chefe da PGR, Paulo Gonet, sustentar oralmente as acusações contra o Núcleo Crucial.
Ele afirmou que a tentativa de ruptura da ordem democrática foi comprovada no processo e que os réus desenvolveram e implementaram um plano progressivo de ataques às instituições democráticas para impedir a alternância de poder nas eleições de 2022.
Gonet disse que a denúncia apresenta detalhes sobre a estruturação e a atuação da organização criminosa entre meados de 2021 e início de 2023, com o objetivo de promover a ruptura da ordem democrática no Brasil.
O procurador-geral destacou que a acusação não se baseou em suposições frágeis, uma vez que os próprios integrantes do grupo documentaram quase todas as fases da ação. Durante a investigação, foram apreendidos arquivos digitais, planilhas, discursos prontos e trocas de mensagens relacionados ao plano.
Segundo ele, a organização criminosa liderada por Bolsonaro atuava de forma alinhada com o único objetivo de subverter a democracia e manter o então presidente no poder, impedindo a posse de Lula e do vice, Geraldo Alckmin.
Para Gonet, é um imperativo punir a tentativa frustrada de ruptura coma ordem democrática. Segundo eles, que está em julgamento são atos “que hão de ser considerados graves enquanto quisermos manter a vivência de um Estado democrático de direito”.
“Os atos que compõem o panorama espantoso e tenebroso da denúncia são fenômenos de atentado com relevância criminal contra as instituições democráticas. Não podem ser tratados como atos de importância menor, como devaneios utópicos, como aventuras inconsideradas, nem como precipitações a serem reduzidas com o passar dos dias a um plano bonachão das curiosidades tão só irreverentes da vida nacional.”, afirmou.
O julgamento foi encerrado por volta das 18h desta terça-feira (2), após as sustentações orias feitas pelas defesas do autor da delação premiada, o tenente-coronel Mauro Cid; do ex-diretor da Abin, Alexandre Ramagem; do ex-comandante da Marinha, almirante, Almir Garnier; e do ex-ministro da Justiça, Anderson Torres.
Nesta quarta-feira (3), serão ouvidos os advogados de Bolsonaro e dos generais Augusto Heleno; Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto.