Design Inteligente ganha espaço no Brasil

Teoria, que credita a criação dos seres vivos a um ente superior, já tem congressos e simpósios no país

Ninguém deixa Charles Darwin em paz. Mesmo 151 anos após a publicação de "A Origem das Espécies", ainda há quem argumente contra sua teoria da evolução natural. Mesmo no Brasil, o movimento do Design Inteligente, que se opõem ao darwinismo, está ganhando espaço. A Universidade Presbiteriana Mackenzie, de São Paulo, promove até hoje o "III Simpósio Internacional Darwinismo Hoje" para contrapor os dois temas. Para o final de 2010, o Núcleo Brasileiro de Design Inteligente, em Campinas, prepara seu primeiro congresso sobre o assunto.

Os partidários do Design Inteligente acreditam que algo, seja um Deus ou até mesmo um extraterrestre, seria o responsável pelas criações da maioria dos seres na Terra, em oposição ao darwinismo, que responsabiliza o mecanismo de seleção natural pela evolução dos seres vivos, inclusive o homem. 

Pesquisas feitas no mundo inteiro constatam que, quanto maior a renda e o grau de instrução das pessoas, mais elas acreditam no darwinismo. Porém, nos Estados Unidos, acontece o contrário. Segundo um levantamento de 2008, 44% dos americanos são criacionistas. Isso significa que quase metade da população americana acredita que Deus criou os seres literalmente como está descrito na Bíblia. Por isso, o Design Inteligente é chamado por seus críticos de “criacionismo disfarçado”, uma tentativa de dar um verniz científico a uma crença religiosa.

No Brasil, de acordo com uma pesquisa Datafolha desde ano, 59% das pessoas creem que o homem resulta de milhões de anos de evolução, mas que esta foi guiada por um ente supremo, ou seja, instintivamente, misturam as duas teorias. Apenas 8% acreditam que a evolução acontece sem interferência divina.

"Não negamos a evolução de seres unicelulares, pequenas mutações ou diferenças entre espécies como, por exemplo, entre as mesmas flores", afirma um dos organizadores do simpósio do Mackenzie, o doutor em literatura e pastor Mauro Meister. No entanto, ele e o pesquisador da Universidade de Idaho, nos Estados Unidos, Scott A. Minnich acreditam que as algumas lacunas na Teoria da Evolução de Darwin podem ser explicadas por esse conceito.

"As lacunas são questões ainda não completamente explicadas pela Teoria da Evolução", conta o biólogo da Universidade de São Paulo (USP), Atila Iamarino. "Isso porque é muito difícil que todos os organismos que documentariam a evolução pela qual passou uma espécie sejam preservados como fóssels e ainda sejam encontrados depois", completa. 

Foto: Getty Images
Para os defensores do Design Inteligente, apenas uma inteligência superior pode ter criado os seres vivos. Acima, afresco pintado por Michelangelo na Capela Sistina

Complexos demais para ser obra do acaso
Minnich, em entrevista ao iG , afirmou com convicção: "O Design Inteligente não é baseado em qualquer religião, mas, sim, na observação da natureza". E cita um exemplo de lacuna: "Parte das células é impelida por uma espécie de máquina molecular, como se fosse uma turbina", conta o americano, que acredita que esse sistema seja sofisticado demais para não ter sido concebido por “alguém”. Como não foram encontrados os ancestrais desse sistema, os partidários do Design Inteligente usam esse e outros detalhes como base para sua hipótese. "O principal problema do Design Inteligente é montar sua teoria em cima de falhas na Teoria da Evolução", explica o biólogo e pesquisador da Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG), Henrique Paprocki. Exatamente por isso, o Design Inteligente é visto por muitos como uma linha de pensamento filosófico ou religioso.

Foto: Getty Images
Ilustração do livro 'A Origem das Espécies¿, de Charles Darwin, que mostra o efeito do mecanismo de seleção natural em pássaros
Na ciência, para uma teoria ser dada como verdadeira, ela precisa ser testada várias vezes e, a cada repetição, apresentar o mesmo resultado. E ser aplicável em tudo o que se relaciona com ela. No caso, a Teoria da Evolução, escrita por Darwin em quase 500 páginas após décadas de experimentos, explica porque os seres vivos mudam ao longo do tempo. Segundo a teoria, a partir de um ancestral em comum, os seres vivos se diferenciaram, por mutações aleatórias que permitiram que eles se adaptassem ao ambiente e deixassem descendentes. “Existem evidências indiscutíveis sobre a Teoria da Evolução, é como afirmar que a Terra gira em torno do Sol. O fato de haverem lacunas não significa que ela esteja errada", explica Paprocki.

Um exemplo de seleção natural pode ser visto na medicina. "Quando digo que a seleção natural favorece certos organismos, sei que na presença de antibióticos as bactérias resistentes tendem a ser favorecidas. Daí a necessidade de tomar os remédios durante todo o tratamento. É não dar chance para que algumas tenham a resistência selecionada e passem adiante esta característica", explica Iamarino.

"O Design Inteligente é como dizer que o céu é azul porque alguém o deseja assim, não explica nem acrescenta", acredita Iamarino. Mesmo assim, o biólogo conclui que, de certa maneira, o Design Inteligente pode ajudar a evolução da biologia: "Ele pode apontar áreas que não são tão estudadas ou que explicamos com poucos detalhes que, posteriormente, se revelam muito importantes. Acaba sendo um 'editor', checando os locais que ainda precisam de mais estudo". "Design inteligente é ter fé, é crer. Ciência é evidência", finaliza Paprocki.

Link deste artigo: https://ultimosegundo.ig.com.br/ciencia/design-inteligente-ganha-espaco-no-brasil/n1237599350877.html