Moradores do Guarujá, município de São Paulo, estão apontando os principais problemas do Plano Diretor (Plano sobre Desenvolvimento Urbano de uma Cidade), que envolve principalmente a construção de edifícios e comércios em diferentes praias da cidade.
Dentre as mudanças que a iniciativa propõe, as que mais estão entre a insatisfação da população são: transformação de áreas residenciais em zonas mistas, ou seja, a autorização para construção de estabelecimentos e prédios de até 125 metros de altura nas praias.
Depois das reclamações dos moradores ficarem em evidência, o município realizou audiências públicas sobre a temática e prometeu enviar as propostas de revisão ao Plano Diretor, que, inclusive, foi revisado pela última vez anos atrás, em 2013.
Em entrevista à CBN Santos, Tatiana Castellani, presidente da Sociedade Amigos do Bairro Praia de Pernambuco, afirma que o Plano Diretor desde o início apresentou irregularidades, além de ser inconstitucional.
‘’Em 2021, foram enviados os prognósticos, porém sem sabermos o real conteúdo da proposta do Plano Diretor. Na época, o único bairro a ser verticalizado era a Enseada. Nunca foi sequer mencionada a verticalização do Pernambuco, Tombo e Guaiuba. Muito menos alterar o zoneamento para misto’’, explicou Tatiana.
Além disso, Tatiana citou que o projeto pode descaracterizar a região, além de impactar no meio ambiente. Veja a imagem abaixo com fotos do bairro antes e depois das mudanças:
Tatiana, que também é moradora, comentou que a Sociedade Amigos do Bairro Praia de Pernambuco tentou através do Conselho Municipal do Meio Ambiente (Condema), por meio de um documento com 64 folhas, apontar os impactos das propostas do Plano Diretor para o terreno. Contudo, a presidente afirma que eles não tiveram nenhum tipo de retorno até hoje com as devidas revisões na proposta.
O presidente do Centro de Documentação e Memória Guarujá, Enrique Dias, compartilha da mesma visão de Tatiana com relação às construções de estabelecimentos e prédios. O especialista acrescentou que um alerta se acendeu a respeito do Plano Diretor logo que foi percebido que, na verdade, o maior objetivo era alterar as zonas residenciais em zonas mistas, além de permitir a construção de prédios em bairros que não são autorizados por lei.
Um dos exemplos é a própria praia de Pernambuco, já que a lei não permite verticalizar a região. Na realidade, Enrique explica que as áreas não deveriam ser liberadas para construção, principalmente por causa da quantidade de pessoas na cidade: ‘’Não podemos liberar mais essas áreas para a construção. O Guarujá já tem muita população, três vezes mais do que a região da Baixada Santista, que tem 357 pessoas por km, enquanto o Guarujá tem 757 por km’’, disse.
‘’Não temos áreas disponíveis para qualquer alteração urbana grande. Isso vai impactar no meio ambiente, vai ter muito mais esgoto indo para o oceano atlântico, para o estuário. Hoje em dia já temos cerca de 80 a 120 mil pessoas defecando nos rios sem nenhum tratamento’’, aponta o especialista sobre os possíveis cenários piores diante das construções.
Nesse contexto, Enrique ainda confirma que a revisão do plano deve ser feita para que uma nova proposta mais benéfica e inteligente possa ser efetivada. Contudo, o historiador também ressalta a importância da participação da população no caso, não somente das autoridades.
‘’Quem decide é quem mora lá, as pessoas que gastam dinheiro para comprar a casa na cidade porque no local não era permitido prédio. Não adianta querer mudar sem antes consultar a população’’, reafirmou.
O que diz a prefeitura?
Na última quinta-feira (31), a Secretária de Planejamento de Guarujá, Polliana Lamonti, explicou aos ouvintes da Rádio CBN Santos qual é o planejamento, inclusive deixando em evidência as iniciativas sobre a praia de Pernambuco.
‘’Os prédios que já existem no Pernambuco, com baixa densidade, permanecerão. O que estamos propondo de diferente é o uso misto, que são comércios compatíveis com as moradias de baixo impacto. Temos uma tabela na lei de uso e na com as moradias de baixo impacto. Temos uma tabela na lei de uso e ocupação, que determina quais são os usos daquele local, como imobiliária, escritórios da arquitetura, pequenos comércios, como café, uma pequena lanchonete, um mercadinho, para que a gente possa dar vida, e possa promover uma renovação do tecido urbano do bairro de Pernambuco”, disse Polliana.
A prefeitura de Guarujá, em nota, esclareceu que o Jardim Acapulco é um loteamento, e não um condomínio fechado. Sendo assim, é parte integrante da malha urbana no bairro Pernambuco.
‘’Nós sentimos que a comunidade daquela região não ficou satisfeita e nós podemos rever isso antes de mandar a lei para a câmara, e a câmara tem que refazer uma audiência antes de votar’’, diz a nota.
Por outro lado, Tatiana Castellani aponta que foram abertos diferentes comércios irregulares na praia e cobra a fiscalização, pensando justamente nas consequências: ‘’Imagina construir prédios onde nunca houve prédios? O trânsito irá aumentar, as pessoas vão morrer no meio do caminho, não vão conseguir chegar ao único hospital que temos na cidade’’
A representante da Sociedade Amigos do Bairro Praia de Pernambuco, quando questionada sobre possíveis resoluções para as insatisfações atuais, listou alguns pontos principais, consideradas melhorias essenciais para a população:
1. Qualificar as pessoas, ouvir a população;
2. Dar habitação para quem realmente precisa;
3. Investir na saúde;
4. Aumentar a fiscalização e segurança na cidade devido aos registros de invasores.
Enrique Dias acrescenta que a resposta dos moradores não é uma recusa total ao Plano Diretor, mas sim um pedido pela revisão dos problemas apontados que vão afetar negativamente a população.
‘’Queremos sensibilizar também alguns vereadores - parece que está marcada, não com data, uma audiência pública na camara antes dos vereadores voltarem. Será a chance da população mostrar a importância de revistar e fazer alterações necessárias neste documento", finaliza.