PM pede abertura de inquérito para apurar regalias de Cabral na prisão
Corregedoria da corporação encontrou TVs com dispositivos para acesso à internet, lista de banquete e até assistente virtual
O secretário de Estado da Polícia Militar, coronel Luiz Henrique Marinho Pires, determinou que a corregedoria da corporação instaurasse um Inquérito Policial Militar (IPM) para investigar se houve conivência da direção do Batalhão Especial Prisional (BEP) ao permitir supostas regalias ao ex-governador Sérgio Cabral e ao tenente-coronel Cláudio Luiz de Oliveira, acusado da morte da juíza Patrícia Acioli. Segundo a Vara de Execuções Penais, foram encontrados talheres inox na cela de Cabral e, numa área próxima à cela dele e de mais seis presos, foi apreendido um saco com celulares e grande quantia em dinheiro. O juiz-corregedor, Bruno Rulière, ainda não decidiu para onde será levado o ex-governador e os demais detentos. A transferência pode ocorrer a qualquer momento.
Na tarde desta segunda-feira, foi realizada a segunda vistoria na unidade, exclusiva para policiais militares — o político é uma exceção, por determinação judicial — e administrada pela PM, desta vez, pela própria corregedoria da instituição. Atrás de aparelhos de televisão, que são autorizados na cadeia, havia dispositivos que foram apreendidos, por haver a suspeita de permitirem conexão à internet. O material foi mandado para a perícia do Instituto de Criminalística Carlos Éboli (ICCE). Se for constatado que os itens tinham Wi-Fi, será caracterizada a irregularidade nas celas dos detentos, por ser proibido o uso destes equipamentos. A PM informou que os 13 aparelhos com kits de smart TV foram apreendidos durante a inspeção. Cães farejadores deram apoio à ação, em busca de objetos escondidos e drogas, inclusive nas áreas externas do presídio.
Segundo a PM, na cela do tenente-coronel Cláudio foi encontrada até uma secretária virtual de voz. Por nota, a assessoria da corporação informou que "todas as decisões da Vara de Execuções Penais (VEP) estão sendo rigorosamente cumpridas e com relação a transferência de internos, o comando da unidade prisional aguarda determinação da VEP".
Há dois anos tem um processo de compra de dois aparelhos de raios-X que ajudariam na detecção da entrada de objetos proibidos. A unidade tem apenas um aparelho de raio-X , que está quebrado e é fruto de doação. O GLOBO obteve acesso a um relatório feito em 2020, com o pedido ao comando da corporação a compra de dois aparelhos para a revista de pequenos e médios volumes levados pelas visitas, que podem entrar com até dois itens de alimentação. O processo de aquisição ou de aluguel está em aberto até hoje. A PM diz que todas as decisões da VEP estão sendo cumpridas e que está fazendo licitação para comprar um scanner corporal.
Por meio de nota, o Ministério Público do Rio, o qual participou de inspeções nas quais tiveram apreensões de bens encontrados, afirma sobre este caso mais recente que a "fiscalização foi realizada pela Vara de Execuções Penais que ainda não encaminhou informações oficiais para as Promotorias de Justiça que atuam junto à Auditoria de Justiça Militar e para a 2ª Promotoria de Justiça junto à Vara de Execução Penal. Tão logo recebidas as informações prestaremos mais esclarecimentos".
Objetos proibidos
Na cela do ex-governador, havia ainda toalhas bordadas com o nome de Sérgio Cabral, talheres de inox e prateleira com fundo falso justamente para esconder celulares. Além de Cabral, o tenente-coronel Cláudio, o tenente Benitez e o soldado Cleiton, serão transferidos: o vereador Mauro Rogério Nascimento de Jesus, o Maurinho do Paiol, que é PM inativo; os capitães Marcelo Baptista Ferreira e Marcelo Queiroz dos Anjos.
Durante as inspeções também foram encontrados cigarro eletrônico, assistente virtual e um caderno de anotações com as compras de um banquete adquirido via aplicativo, no valor de R$ 1.500.
Tais achados motivaram a decisão de transferir Cabral e os outros seis detentos. A expectativa é de que os sete sejam levados para Bangu 1, presídio de segurança máxima por onde já passaram os mais perigosos criminosos do estado. Cabe ao juiz-corregedor da Vara de Execuções Penais, Bruno Rulière, escolher a unidade.
Ordem do STF
Condenado a 407 anos por corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa, Cabral está no BEP desde setembro do ano passado. Antes, ele cumpria pena em Bangu 8, onde ficam políticos e presos com curso superior. Essa transferência foi autorizada pelo juiz federal Marcelo Bretas, cumprindo uma decisão do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), que impede o ex-governador de ficar perto de pessoas citadas por ele no acordo de delação premiada.
A Penitenciária Laércio da Costa Pellegrino, conhecida como Bangu 1, foi construída em 1987 para abrigar presos de maior periculosidade, por isso, também passou a ser chamada de cofre. O presídio é dividido em 48 celas distribuídas por quatro galerias.
Em uma nova inspeção no BEP, de acordo com imagens divulgadas pelo “Fantástico”, da TV Globo, agentes encontraram uma sacola com R$ 4 mil em espécie e cigarros de maconha. A fiscalização foi feita de surpresa pelo juiz titular da Vara de Execuções Penais (VEP), Marcello Rubioli, que contou com o apoio da Corregedoria da PM e do Ministério Público do Rio (MPRJ). Rubioli confirmou à TV Globo a ida de Cabral para uma unidade de Bangu.
De acordo com imagens analisadas pela VEP, a sacola com o dinheiro e a droga foi lançada em uma área onde estavam somente Cabral e o tenente-coronel Cláudio Luiz, além de um policial que arremessou o saco plástico após a chegada do juiz. Numa nova vistoria feita pela Corregedoria da Polícia Militar foi descoberto o uso de aparelhos que conectam televisões à internet.
Regalias gastronômicas
A fiscalização na semana passada já havia encontrado uma lista que mostra que os presos não vivem da quentinha distribuída pelo governo. As anotações foram achadas em um caderno que estava em uma mesa numa área usada por Cabral e Cláudio Luiz. Em nove páginas, há detalhes das encomendas que totalizam R$ 1.418, a última feita em 27 de abril. Na relação, por exemplo, estavam dez unidades de kafta de cordeiro (R$ 158), 60 esfirras (R$ 300) e nove quilos de acompanhamentos. A conta poderia ser ainda maior, já que também foi anotada uma porção de cem miniquibes (R$ 90) que foi riscada da lista.
O nível de detalhamento do pedido chama a atenção. Em uma das páginas do caderno há o valor unitário ou de 100 gramas das porções. As esfihas saem por R$ 5, o falafel por R$ 0,90 e o valor unitário do cordeiro para sanduíche custou R$ 12.
Sobre as vistorias, a defesa de Cabral afirma que nada foi encontrado na cela do ex-governador. Os advogados de Cláudio Luiz também alegam que nenhum dos materiais estava em sua cela.
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