Câmara vai criar comissão e grupo de trabalho sobre adultização

Presidente da Casa e líderes definiram como prioridade dar uma resposta à sociedade sobre as recentes denúncias de exploração de menores

Felca soma 5 milhões de inscritos no YouTube
Foto: Reprodução/Canal Felca no YouTube
Felca soma 5 milhões de inscritos no YouTube
{!$sinalizador_ad$!}

Após reunião de líderes, realizada na tarde desta terça-feira (12), o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos), definiu que vai fazer uma Comissão Geral e um  Grupo de Trabalho para tratar sobre adultização e exploração de crianças e adolescentes em ambiente digital. A ideia é debater um ponto de partida para que o Legislativo apresente uma resposta à sociedade sobre as recentes denúncias feitas pelo youtuber Felipe Bressanim Pereira, mais conhecido como Felca .

A comissão geral, que consiste em uma sessão plenária da Câmara, será na próxima quarta-feira (20). Na ocasião, os deputados interrompem seus trabalhos ordinários para debater matérias relevantes, ou seja, os parlamentares devem usar a reunião que seria destinada à votação de propostas para definir os próximos passos da Casa Baixa diante dos indícios de exploração sexual de menores nas redes sociais.

Motta entendeu que há necessidade em realizar a comissão para, junto com os deputados, alinhar qual projeto que trata sobre o assunto será priorizado pela Câmara. Somente na última semana, depois que o vídeo do youtuber Felca viralizou, foram protocolados mais de 12 propostas de lei que abordam a adultização e exploração de crianças e adolescentes, bem como a regulamentação das redes sociais.

Após a comissão, o grupo de trabalho será criado para analisar melhor o projeto que for destacado pelos deputados na sessão plenária. Esse grupo deverá apresentar um parecer no prazo de até 30 dias após o início dos trabalhos. A partir de então, a Câmara passará a efetivamente votar um novo projeto de lei com vistas a combater a exploração de menores em ambiente virtual.

“São muitos projetos que tramitam na casa. Há parlamentares que já tratam do tema há muito tempo. Então, ficou encaminhado de ter uma comissão geral na próxima semana com a instituição de um grupo de trabalho que ,nos próximos 30 dias, vai apresentar um projeto para a sociedade”, revelou a deputada Taliria Petrone (Psol) após a reunião de líderes.

Há um grupo de parlamentares que defende que o ponto de partida do debate na Câmara seja o PL 2628/2022, de autoria do senador Alessandro Vieira (MDB), que dispõe sobre a proteção de crianças e adolescentes em ambientes digitais. A proposta já foi aprovada pelo Senado Federal e falta passar pela deliberação dos deputados.

“Muitos de nós [deputados] defendemos que a gente baseie o início da discussão a partir do PL 2628, que já avançou no Senado e que é um bom projeto. Eu mesma apresentei um projeto para tratar especificamente sobre monetização, que é uma lacuna do 2628. Mas acho que a gente tem que dar um primeiro passo e acho que esse passo é aprovar o mais rápido possível o 2628 e, quem sabe, melhorar o relatório ou então avançar em outras matérias no grupo de trabalho”, avaliou Petrone.

O que diz o PL 2628
O Projeto de Lei (PL) 2628/2022 dispõe sobre a proteção de crianças e adolescentes em ambientes digitais. Ele se aplica a todo produto ou serviço de tecnologia da informação que seja direcionado ou possa ser utilizado menores de idade, disponível em território nacional, independentemente de onde foi localizado, desenvolvido, fabricado, ofertado, comercializado ou operado.

O projeto aprovado pelo Senado estabelece que os produtos e serviços de tecnologia da informação devem garantir a proteção prioritária desses usuários, tendo como parâmetro o melhor interesse da criança e do adolescente. Além disso, prevê que plataformas digitais devem contar com medidas adequadas e proporcionais para assegurar um elevado nível de privacidade, proteção de dados e segurança, em conformidade com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).

A proposta também determina que os fundamentos para a utilização desses serviços por crianças e adolescentes devem incluir a garantia de sua proteção integral, a prevalência absoluta de seus interesses, sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento biopsicossocial, segurança contra violência (intimidação, exploração, abuso, ameaça), respeito à autonomia, proteção contra exploração comercial e observância dos princípios do Estatuto da Pessoa com Deficiência.

Paralelo a isso, o projeto estabelece obrigações para os fornecedores de tecnologia. De acordo com o texto aprovado pelo Senado, as plataformas digitais devem observar o dever de cuidado e segurança, buscando a tutela ampla, especial e prioritária da criança e do adolescente; devem tomar medidas razoáveis no desenho e operação para prevenir e mitigar o acesso e a exposição a conteúdos que retratem, entre outros pontos, a exploração e abuso sexual.

Ainda segundo o projeto, os produtos não desenvolvidos para crianças e adolescentes devem conter mecanismos para ativamente impedir o uso por esse público; e, desde a concepção, esses produtos devem garantir, por padrão, a configuração mais protetiva disponível em relação à privacidade e proteção de dados pessoais.

O projeto ainda trata sobre produtos de monitoramento infantil, jogos eletrônicos e publicidade em meio digital. Outro ponto importante da matéria é que ela apresenta dispositivos específicos sobre o combate à exploração e abuso sexual de crianças e adolescentes, determinando que fornecedores devem comunicar os conteúdos de exploração e abuso sexual infantil detectados às autoridades nacionais e internacionais competentes, além de reter dados associados a relatórios de denúncia (conteúdo, dados do usuário responsável).

Nesse sentido, o projeto também determina que as plataformas digitais devem criar mecanismos de denúncias de usuários sobre violações aos direitos de crianças e adolescentes e, quando notificados sobre violações, deverão oficiar às autoridades competentes para investigação e proceder à retirada de conteúdo que viola direitos desse público. assim que comunicados do caráter ofensivo da publicação, independentemente de ordem judicial.

Divergência

A elaboração de uma lei que proteja as crianças e adolescentes da exploração de suas imagens passa pela regulamentação das redes sociais. Parlamentares de esquerda e centro-esquerda apontam que não é possível garantir a segurança desse público sem modificar a forma como as plataformas digitais atuam em território nacional.

Entretanto, deputados da oposição, ligados à direita política, temem que o debate promova uma censura e violações do direito de expressão em ambiente virtual. Por isso, nos bastidores, a avaliação é que a tramitação de um projeto com o objetivo de coibir a exploração de crianças e adolescentes enfrentará um ambiente delicado na Câmara.

Um projeto que pretendia regulamentar as redes sociais já passou pelo parlamento, mas foi enterrado pelo ex-presidente da Câmara, Arthur Lira (PP), ao chegar no plenário da Casa. A proposta, que era conhecida como PL das Fake News, recebeu relatório do deputado Orlando Silva (PCdoB), favorável à matéria, mas não chegou a ser votada pelos deputados.

Na época, a oposição pressionou para que a proposta fosse retirada de pauta, por apontar o projeto como uma forma de censurar as redes sociais. Esse embate acabou minando o clima para a aprovação da matéria, o que contribuiu para que ela fosse engavetada. Lira, na ocasião, prometeu que uma comissão especial seria criada para deliberar sobre o assunto com maior atenção e apresentar um novo relatório, que trouxesse um meio termo entre o que os governistas e bolsonaristas queriam, mas esse colegiado nunca foi instalado.

Nesse sentido, o deputado Nikolas Ferreira (PL) apresentou, nesta semana, um projeto de lei para combater a exploração de menores e criticou outras matérias que pretendem regulamentar as redes sociais.
O vídeo-denúncia do influenciador Felca trouxe à tona um debate inadiável: a necessidade de proteger nossas crianças contra criminosos que lucram com a exploração infantil nas redes sociais. “Esse é o projeto que, de fato, faz prevenção e o combate à exposição indevida, adultização, exploração sexual e outros crimes contra crianças e adolescentes na internet. A opção é essa”, avaliou.

“Os demais projetos estão desvirtuando a essência do debate para fins próprios, como a regulamentação da internet. Que só vai gerar mais conflito na casa e não combate o problema que foi denunciado por Felca”, acrescentou Nikolas.

O PL 3889/2025, proposto pelo deputado Nikolas Ferreira, dispõe sobre a prevenção e o combate à exposição indevida, adultização, exploração sexual e outros crimes contra crianças e adolescentes na internet. O objetivo é estabelecer medidas para prevenção, detecção, denúncia e responsabilização por condutas nocivas no ambiente digital, ao mesmo tempo em que garante a preservação da liberdade de expressão, da privacidade e da neutralidade tecnológica.

O projeto trata sobre adultização, responsabilização de pais ou parentes que explorem as crianças e adolescentes nas redes sociais, além de propor a criação de “ferramentas voluntárias” de configuração nas plataformas digitais para facilitar a supervisão parental. Em relação à responsabilização dos provedores de internet, o deputado propõe que eles sejam obrigados a retirar conteúdos de abuso infantil somente após denúncia da vítima ou do ministério público, sem a obrigatoriedade de um filtro automático para impedir a propagação desses materiais.

Na visão do deputado Orlando Silva, que relatou o antigo projeto voltado para as redes sociais, não é possível promover uma mudança sem obrigar as plataformas a modificar seus algoritmos. “Essa proteção só será efetiva com a regulação das plataformas digitais. A internet como terra sem lei é o paraíso para os abusadores. O Brasil clama: protejam nossas crianças”, declarou.