Vinícius Lummertz

Vinícius Lummertz: O Turismo e a negação política

O Brasil ignora seu enorme potencial e não enxerga o Turismo como locomotiva econômica

Praia de Copacabana é a favorita dos turistas que vão ao Rio de Janeiro
Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
Praia de Copacabana é a favorita dos turistas que vão ao Rio de Janeiro

O Brasil não prioriza o Turismo, mesmo sendo o feliz proprietário do maior potencial natural e do oitavo maior potencial cultural do planeta para o desenvolvimento da “Economia do Turismo”, também entendida como a “economia do visitante”, segundo estudo de 2018 do WTTC, Conselho Mundial de Turismo e Viagens.

O Turismo impacta mais de uma centena de setores, constituindo-se no maior empregador do mundo e, segundo o mesmo WTTC, caberá ao turismo a geração de mais de 25% dos empregos globais nos próximos dez anos. Diante de tantas evidências priorizar o turismo deveria e poderia estar no centro da estratégia do país de forma perene e no mais alto interesse nacional, tanto dos governos quanto da sociedade. Muito pelo contrário, os estudos do WEF, Fórum Econômico Mundial, confirmam não só a baixa atenção como também a evidente descontinuidade das políticas governamentais em favor do turismo no Brasil. 

Confirma-se, também, que o Brasil tem desenvolvido muito seu turismo interno ao longo das últimas décadas, aos trancos e barrancos, mas que continua atrasado — pois sendo o décimo segundo mercado turístico no mundo ainda se arrasta para trás de quadragésimo em competitividade.

Encurtando a história, estes estudos e outros como o do WTTC coincidem sobre o motivo central do relativamente baixo desempenho do Brasil: a já mencionada falta de priorização de políticas e estratégias governamentais de apoio à economia do turismo.

Quando observadas as vantagens comparativas do turismo brasileiro perante o resto do mundo, só encontramos um único grande e bom rival, nosso fortíssimo agribusiness. São potenciais que advém do tamanho, das terras, do sol e das águas. A diferença: o agro brasileiro está integrado às cadeias de produção internacionais, tanto na ciência e no conhecimento, aonde foram investidos bilhões, quanto na comercialização nas bolsas mundiais. E suas empresas tiveram, além de maior concentração, muito mais liberdade para empreender, mais logística, menos impostos e muito mais acesso ao crédito pelos Planos Safra, crédito dos bancos oficiais e acessos aos mercados de capitais. Só para comparar, um ano de Plano Safra oferece R$ 340 bilhões enquanto a linha especializada Fungetur do Ministério do Turismo conta hoje com menos de R$ 1 bilhão.

Foto: Alan Morici
Vinicius Lummertz é ex-ministro do Turismo

Enquanto no agro a evolução foi sistêmica, no turismo foi espasmódica. Como as cadeias de produção do turismo são mais variadas e complexas, as ações necessárias são mais detalhadas, indo desde a gestão da conectividade, hospitalidade, atrações, parques naturais até o saneamento básico e a urbanização de cidades. Mais grave ainda, pelos estudos internacionais, o ambiente de negócios para desenvolver empreendimentos de turismo no Brasil está entre os cinco piores do mundo. Além do baixo incentivo, há desincentivo e até mesmo preconceito contra esta grande indústria, que não é reconhecida por seu conjunto virtuoso — o pior sintoma se apresenta na marcante insegurança jurídica que afasta investidores brasileiros e estrangeiros.

Aqui a negação política aparece com grande evidência e até cinismo, resultando num célebre “virem-se”. Até mesmo a desprestigiada indústria brasileira enfrentando a desindustrialização dos últimos anos, sempre recebeu mais incentivos. Em muitos casos, empréstimos, benefícios fiscais, terrenos, energia e saneamento. Tudo isto sempre foi rifado na economia do turismo.

O equívoco no limite da visão é o não entendimento de que o turismo passou de vagão para locomotiva econômica — e, não surpreendentemente, são os economistas quem mais tem dificuldades para assumir isto. Todavia, o turismo em 2022 cresceu 28%, segundo a Fecomercio-SP, chegando a R$ 208 bilhões de faturamento, com grande efeito na distribuição de renda do país. Já o agribusiness bateu R$ 1,4 trilhões de faturamento — e tendo saído de setor importador de alimentos há 40 anos, hoje lidera a exportação brasileira, enquanto o turismo amarga déficits na conta internacional de mais de U$ 150 bilhões de 2005 até 2022.

Está passando da hora de mudar está história, a partir das premissas que moveram os países bem-sucedidos a apoiarem suas economias do turismo. Falta sairmos da negação política.

* Vinícius Lummertz é Presidente do Conselho do Grupo Wish. Foi Ministro do Turismo, Presidente da Embratur e Secretário de Turismo do Estado de São Paulo.