Resgatados em situação de escravidão no RS voltam para Bahia

Ao todo, 207 trabalhadores foram resgatados em Bento Gonçalves. Destes, 198 eram baianos

Foto: Divulgação/MPT - 24.02.2023
Trabalhadores ficaram em ginásio de Bento Gonçalves

Na noite desta sexta-feira (24), os trabalhadores encontrados em condições análogas à escravidão na cidade de Bento Gonçalves, na Serra do Rio Grande do Sul , começaram a voltar para casa. Segundo a polícia, dos 207 homens resgatados, 194 voltaram para a Bahia , estado de origem deles. Já outros quatro baianos preferiram permanecer na cidade. Nove dos trabalhadores eram gaúchos e já voltaram pros municípios de origem: Montenegro, Carazinho, Rio Grande, Marau e Portão. As idades deles eram entre 18 e 57 anos.

Cerca de quatro ônibus levaram os baianos para casa. Eles foram escoltados pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) até a saída do Rio Grande do Sul. Antes de embarcar, um dos trabalhadores chegou a dar um depoimento a um repórter da RBS TV, afiliada rede Globo no estado

"Está sendo maravilhoso [voltar para casa] porque a gente está vivendo num mundo de escravidão aqui, naquela empresa. E a gente, todos nós, vamos reencontrar a nossa família, né, todos nós estamos alegres para ver a nossa família, passamos praticamente num lugar que era uma prisão. Bem animados por chegar na nossa terra", disse.

Acordo das empresas com os trabalhadores

Um acordo fechado entre o Ministério Público do Trabalho (MPT) e as vinícolas ainda na noite de sexta (24) cedeu a cada trabalhador cerca de R$ 500 para que eles pudessem fazer a viagem. O valor total da indenização, segundo o MPT, será pago via depósito bancário até terça-feira (28).

Ainda de acordo com o MPT, um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) foi estabelecido para que o empresário responsável apresente a comprovação dos pagamentos sob pena de ajuizamento de ação civil pública por danos morais coletivos, além de multa correspondente a 30% do valor devido. A estimativa é de que, até o momento, o cálculo total das verbas rescisórias ultrapassem R$ 1 milhão.

"Os próximos passos são acompanhar o integral pagamento dos valores devidos aos trabalhadores, estabelecer obrigações para prevenir novas ocorrências com relação a esse grupo de empresas intermediadoras. Com relação às empresas tomadoras é preciso garantir reparação coletiva e medidas de prevenção, já foram instaurados procedimentos investigativos contra as três vinícolas já identificadas", afirmou a procuradora Ana Lucia Stumpf González.

Pedro Augusto de Oliveira Santana, de 45 anos, responsável pela empresa que contratou os trabalhadores chegou a ser preso, mas pagou fiança de R$ 40 mil e vai responder pelo crime em liberdade.

Ele se pronunciou atravpes de uma nota por meio de um advogado e informou que " a empregadora Fênix Serviços de Apoio Administrativo e seus administradores esclarecem que os graves fatos relatados pela fiscalização do trabalho serão esclarecidos em tempo oportuno, no decorrer do processo judicial." Veja íntegra abaixo.

A operação

A operação da Polícia Rodoviária Federal em conjunto com o MTE e o Polícia Federal teve início após três trabalhadores procurarem a PRF em Caxias do Sul afirmando que haviam fugido de um alojamento em que eram mantidos contra sua vontade. Já no local, após a denúncia, os trabalhadores foram encontrados em uma "situação degradante", afirmaram os agentes.

Notas das vinícolas
Aurora

"Em respeito aos seus associados, colaboradores, clientes, imprensa e parceiros, a Vinícola Aurora vem à público para reforçar que não compactua com qualquer espécie de atividade considerada, legalmente, como análoga à escravidão e se solidariza com os trabalhadores contratados pela terceirizada Oliveira & Santana.

As vítimas são funcionários da Oliveira & Santana, empresa que prestava serviços às vinícolas, produtores rurais e frigoríficos da região.

A Aurora já se colocou à disposição das autoridades para quaisquer esclarecimentos e está prestando apoio às vítimas. A companhia também está trabalhando em conjunto com o Ministério Público Federal e com o Ministério do Trabalho para equalizar a situação em busca de reparo aos trabalhadores da Oliveira & Santana.

A vinícola também oferecia condições dignas de trabalho no horário de expediente e os gestores responsáveis desconheciam a moradia desumana em que os safristas eram acomodados pela Oliveira & Santana após o período de trabalho.

Por fim, ratificando seu compromisso social, a Aurora se compromete em reforçar sua política de contratações e revisar os procedimentos quanto à terceiros para que casos isolados como este nunca mais voltem a acontecer."

Salton

"A Família Salton repudia veementemente e não compactua com nenhum tipo de trabalho sob condições precárias, análogas à escravidão. A empresa e todos os seus representantes estão solidários a todos os trabalhadores e suas famílias, que foram tratados de forma desumana e cruel por um prestador de serviço contratado.

Reforçamos que todas as informações foram verificadas antes da contratação do fornecedor. Entretanto, trata-se de incidente isolado e a Família Salton já está tomando medidas cabíveis frente ao tema, além de ser colocar à disposição dos órgãos competentes para colaborar com o processo.

A empresa salienta que já está trabalhando para intensificar os controles de contratação, prevendo medidas mais austeras em todo e qualquer contrato de serviços terceirizados. Prevê ainda a associação e parcerias com órgãos e entidades do setor para melhorar a fiscalização de práticas trabalhistas.

Com um legado de 112 anos, a Família Salton é referência em sustentabilidade e signatária do Pacto Global da ONU e realiza projetos que refletem diretamente a responsabilidade social da empresa e seu compromisso como empresa cidadã."

Garibaldi

"Diante das recentes denúncias que foram reveladas com relação às práticas da empresa Oliveira & Santana no tratamento destinado aos trabalhadores a ela vinculados, a Cooperativa Vinícola Garibaldi esclarece que desconhecia a situação relatada. Informa, ainda, que mantinha contrato com empresa diversa desta citada pela mídia.

Com relação à empresa denunciada, o contrato era de prestação de serviço de descarregamento dos caminhões e seguia todas as exigências contidas na legislação vigente. O mesmo foi encerrado.

A Cooperativa aguarda a apuração dos fatos, com os devidos esclarecimentos, para que sejam tomadas as providências cabíveis, deles decorrentes.

Somente após a elucidação desse detalhamento poderá manifestar-se a respeito.

Desde já, no entanto, reitera seu compromisso com o respeito aos direitos – tanto humanos quanto trabalhistas – e repudia qualquer conduta que possa ferir esses preceitos."

Nota do empresário

"Diante dos fatos noticiados em relação a operação de combate ao trabalho análogo à escravidão ocorrida na última quinta-feira, em Bento Gonçalves, a empregadora Fênix Serviços de Apoio Administrativo e seus administradores esclarecem que os graves fatos relatados pela fiscalização do trabalho serão esclarecidos em tempo oportuno, no decorrer do processo judicial.

Cabe mencionar que o empresário envolvido nas acusações é um empreendedor de atuação reconhecida e respeitada, não compactuando com qualquer desrespeito aos colaboradores e aos direitos a eles inerentes.

Além disso, é importante ressaltar que qualquer conclusão neste momento é meramente especulativa e temerária, uma vez que os fatos e as responsabilidades devem ser esclarecidas em juízo.

Manifestamos total respeito às instituições e nos colocamos à disposição da justiça para todos os esclarecimentos necessários, colaborando no que for necessário para o restabelecimento da verdade e principalmente do bem estar de todos os envolvidos.

Por fim, informamos que os trabalhadores estão recebendo todo o auxílio necessário para que esta situação não traga maiores prejuízos aos mesmos."

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