O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso determinou, nesta segunda-feira (30), a abertura de investigação contra autoridades do governo Jair Bolsonaro para apurar a conivência com a crise humanitária na terra Yanomami. Para Barroso, há indícios de crime de genocídio e desobediência a determinações judiciais.
Em seu despacho, o ministro ressaltou a gravidade da crise humanitária dos Yanomamis e vê que a omissão das autoridades colaboraram para o agravamento da situação.
"Quadro gravíssimo e preocupante, sugestivo de absoluta anomia (ausência de regras) no trato da matéria, bem como da prática de múltiplos ilícitos (crimes), com a participação de altas autoridades federais", aponta Barroso.
"Um quadro de absoluta insegurança dos povos indígenas envolvidos, bem como a ocorrência de ação ou omissão, parcial ou total, por parte de autoridades federais, agravando tal situação", completa.
O ministro analisou os dados enviados pelo governo federal e as procurações do Ministério Público Federal (MPF) e da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).
Barroso alerta que houve vazamento de operações para a retirada dos garimpeiros determinada pela Justiça e aponta indícios de retirada de aeronaves de garimpeiros do pátio da Polícia Federal, mudanças de planejamento das Forças Armadas na área Yanomami e falta de controle do tráfego aéreo em Roraima.
Os nomes das autoridades não foram divulgados pelo ministro. Há expectativa que os nomes de Bolsonaro, da ex-ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, e do ex-advogado-geral da União, Bruno Bianco, esteja entre os investigados. Diretores e comandantes da Funai e Ibama também devem ser ouvidos.
Na última semana, o STF detectou as inconsistências entre as informações prestadas pelo governo Bolsonaro e as ações tomadas em terras Yanomami. O relatório foi divulgado pelo gabinete do próprio Barroso.
De acordo com o texto, o STF tomou decisões que obrigava o governo a adotar medidas de enfrentamento da Covid-19 em terras Yanomami e determinou a retirada de garimpeiros da região. Na época, a Suprema Corte afirmou que os planos eram necessários para a ‘proteção da vida, saúde e segurança’ dos Yanomami.
A Corte chegou a intimar a União, que disse ter realizado ações para a retomada das terras e prevenção da saúde dos indígenas. O governo ressaltou os programas de enfrentamento à malária e as operações de expulsão de garimpeiros da área.
Entretanto, a Corte vê inconsistências entre as respostas de Bolsonaro e os trabalhos feitos na terra Yanomami. A região vive em crise humanitária, com registros de casos de malária, desnutrição e fome, causados pelo garimpo ilegal na região.
Atuação contra garimpeiros
Luís Roberto Barroso ainda determinou que o governo Lula atue para retirar os garimpeiros ilegais da área Yanomami e crie, em até 30 dias, um relatório com diagnóstico da comunidade e organize um planejamento, com cronograma, das medidas que serão adotadas pelo Palácio do Planalto.
Ele ainda quer que o governo tome medidas imediatas para proteção à vida, saúde e segurança das comunidades indígenas. Barroso ainda garante a cobertura necessária em crédito extraordinário para os investimentos na região.
Crise humanitária
De acordo com dados do Ministério dos Povos Originários, ao menos 99 crianças da comunidade indígena Yanomami já morreram devido o avanço do garimpo ilegal na região nos últimos meses.
As mortes foram causadas, na maioria dos casos, por desnutrição, pneumonia e diarreia. As vítimas são crianças de um a quatro anos, e os dados são referentes ao ano de 2022.
Ainda de acordo com a pasta, há uma estimativa de que, ao menos, 570 crianças foram mortas pela contaminação por mercúrio, desnutrição e fome no território durante o governo Bolsonaro.
Além das mortes, em 2022 foram confirmados cerca de 11.530 casos de malária no Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami, que estão distribuídos entre 37 Polos-base. As faixas etárias mais afetadas são de pessoas de 50 anos, seguido de jovens de 18 a 49 e crianças de 5 a 11 anos.