Caso Moïse: agressor perguntou se câmeras "estavam gravando"
Dono do quiosque contou que recebeu uma mensagem de Fábio Pirineus da Silva flagrado batendo em Moïse Mugenyi Kabagambe
O empresário Carlos Fabio da Silva Muzi, proprietário do quiosque Tropicália, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio, onde Moïse Mugenyi Kabagambe foi espancado até a morte, recebeu uma mensagem de áudio do barraqueiro Fábio Pirineus da Silva, o Belo, pouco depois das 23h de 24 de janeiro, contando o que aconteceu com o congolês naquela noite e perguntando se as câmeras do estabelecimento “estavam gravando”.
Ele não sabia, mas havia sido flagrado nos vídeos, junto com Aleson Cristiano de Oliveira Fonseca, o Dezenove, e Brendon Alexander Luz da Silva, conhecido como Tota, agredindo a vítima com socos, chutes e até pedaços de pau.
Em depoimento prestado a policiais da Delegacia de Homicídios da Capital (DHC), Carlos Fabio disse que, desconfiado da pergunta, respondeu a Belo que os equipamentos não estavam funcionando e o rapaz demonstrou então estar “aliviado”. Assim como Dezenove e Tota, ele teve a prisão temporária decretada pela juíza Isabel Teresa Pinto Coelho Diniz, nessa madrugada, durante o plantão judiciário.
"Frise-se, ainda, que as imagens comprovam toda a ação delituosa em seu mais alto grau de crueldade, perversidade e desprezo pela vida – o bem jurídico mais importante de todo ordenamento”, escreveu a magistrada na decisão.
De acordo com o depoimento, ao qual o Globo teve acesso, o dono do Tropicália contou que, assim como na maior parte dos quiosques da praia, lá não há funcionários fixos, atuando todos de forma temporária e recebendo pelos serviços por comissão.
Ele disse que grande parte dessas pessoas moram na praia e muitos são usuários de drogas ou alcoólatras. “Relata que é comum a ocorrência de assaltos na localidade e muita das vezes esses ambulantes ajudam na captura desses marginais ocasionando confusões”, afirmou.
Carlos Fabio contou ainda conhecer Moïse desde 2019 e que ele costumava aparecer na região no período de alta temporada, para trabalhar como “freelance” e disse que ele nunca tinha arrumado nenhum tipo de confusão ou briga com outros funcionários ou clientes na praia.
No 19 de janeiro desse ano, ele relatou que solicitou ao congolês que fosse embora do serviço porque estava embriagado e não admite esse tipo de comportamento por parte dos funcionários. Mesmo o tendo dispensado, o empresário diz ter pago a comissão ao estrangeiro. Moïse havia chegado ao Brasil em 2011, fugindo dos conflitos armados na República Democrática do Congo, que já duram décadas.
No dia 20 de janeiro, segundo o proprietário do Tropicália, Moïse teria começado a trabalhar no quiosque Biruta, onde ficou por quatro dias. Ele contou que, por volta de 20h30 de 24 de janeiro, antes de ir para casa, avistou o congolês embriagado próximo do local, o chamou num canto e o aconselhou a ir embora por causa de seu estado alterado.
Cerca de duas horas e meia depois, o empresário disse ter recebido uma ligação de um funcionário de uma barraca localizada na areia dizendo que um grupo de pessoas batera no Angolano, como era chamado o congolês, e acreditavam que ele estava morto.
Ainda no depoimento, Carlos Fabio disse ter recebido em seguida a ligação de Belo, vendedor de outra barraca na areia da Praia da Barra da Tijuca, e contou ter ficado bastante apreensivo. Ele relatou ter ido, com a esposa, ao local, por volta de 1h, verificar o que teria ocorrido.
O empresário disse que, ao chegar ao Tropicália, o corpo do congolês não estava mais no local e dois funcionários teriam ido à delegacia. Ele relatou ter sido abordado, no dia seguinte a morte do congolês, por cinco de seus familiares, a quem explicou que não estava no momento do fato, não tendo presenciado seu espancamento e morte.
Carlos Fabio explicou ainda que continuou a abrir o quiosque Tropicália normalmente nos dias posteriores e ter solicitado as imagens da câmera de segurança ao técnico responsável, tendo entregue os vídeos aos policiais da Delegacia de Homicídios da Capital (DHC).