Suástica nazista era usada como marca de ferrar gado no Pará, mostram documentos

Pesquisa de aluno da Ufopa investigou a imigração alemã para a região, e encontrou em documentos de 1938, do TJPA, evidências de roubo de gado de uma companhia alemã em Santarém

Foto: Joanderson Mesquita/Arquivo Pessoal
Documento histórico datado de 1938 serviu de base para a descoberta de Mesquita

Uma análise detalhada de documentos históricos fez um estudante da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) descobrir que a suástica nazista já foi utilizada como marca de ferrar gado em Santarém, no oeste do estado. Os documentos são datados do ano de 1938.

A pesquisa fazia parte do TCC (trabalho de conclusão de curso) de história do aluno Joanderson Mesquita. Intitulado "Liebold & Cia.: os rastros da suástica na Amazônia", o estudo partiu do uso da suástica nazista como marca de ferrar gado no município para investigar a imigração alemã para a região.

A pesquisa

Joanderson Mesquita detectou que a firma Liebold & Cia. marcou o gado de sua propriedade com o sinal da suástica . Os documentos registram, com data de janeiro de 1938, um furto de gado pertencente à firma constituída por dois sócios: Artur Johannes Liebold, alemão, e Pedro da Silva Motta, brasileiro.

Segundo os documentos, Francisco Machado Freire mandou roubar uma cabeça de gado marcada com o emblema nazista e vendeu o animal para Antônio José Fernandes, proprietário da charqueada Cravo Roxo, pelo valor de duzentos e vinte mil réis.

Ao término da negociação, foram surpreendidos pela notícia de que o boi tinha sido abatido no matadouro municipal de Santarém por Valeriano Motta da Silva, magarefe - espécie de açougueiro da época - de Freire. Depois de abatido o boi, a carne dele foi levada para ser vendida no mercado municipal.

Nos autos, a acusação conseguiu incriminar Francisco Machado Freire através do exame de corpo de delito feito no couro do boi, já que a empresa Liebold & Cia. usou o símbolo da suástica para atestar o pertencimento do animal à companhia. Ou seja, o sinal nazista era mesmo a marca oficial da firma, que reconheceu publicamente sua utilização.

A pesquisa não conseguiu provas contundentes acerca do envolvimento pessoal de Arthur Johannes Liebold com a Alemanha nazista nem da companhia com o governo alemão de Adolf Hitler.

“Não foi possível indicar que Liebold tinha vinculação com a seção do partido nazista estabelecida no Pará em 1938, mas sabemos que houve filiados à seção do Partido na cidade de Santarém”, esclarece Mesquita, que atualmente é mestrando na Universidade Federal do Pará (UFPA).

Durante a pesquisa de Joanderson foi constatado que a seção do Partido Nazista do Pará tinha 27 filiados, divididos entre as cidades de Belém, Santarém, Maracanã, Breves e Prata.

Relevância

A professora Lorena Lopes, orientadora do trabalho de TCC de Mesquita, disse ao G1, entender que “mais que dar uma resposta definitiva sobre o proprietário da Liebold & Cia., a pesquisa tem o mérito de descobrir um documento precioso da região”.

Para a docente, descobertas como esta não se dão ao acaso, mas no trabalho de arquivo.

“Neste caso, vemos por um lado a riqueza documental do Centro de Documentação Histórica do Baixo Amazonas, e, por outro, vemos como nascem as novas perguntas que fazemos para o passado, tido, muitas vezes erroneamente, como conhecido”, completou Lorena.