Justiça exonera da Funai militar que falou em 'meter fogo' em índios
Ministério da Justiça exonerou o coordenador regional da Funai no Vale do Javari, Henry Charlles Lima da Silva, tenente da reserva do Exército
O Ministério da Justiça exonerou o coordenador regional da Funai no Vale do Javari Henry Charlles Lima da Silva, tenente da reserva do Exército. A decisão foi publicada nesta terça-feira no Diário Oficial da União. Charlles se tornou centro de uma polêmica após a divulgação de um áudio em que o militar estimula líderes da etnia marubo no Amazonas a atirar contra indígenas e afirma apoiá-los para "meter fogo nos isolados".
“Eu vou entrar em contato com o pessoal da Frente (de Proteção Etnoambiental) e pressionar: ‘Vocês têm de cuidar dos índios isolados, porque senão vou junto com os marubos, meter fogo nos isolados’”, afirma o militar no áudio. “São eles que estão saindo do território deles para importunar os marubos”, tentou justificar.
A fala de Charlles aconteceu durante uma reunião na aldeia Vida Nova, em 23 de junho, duas semanas depois que índios isolados teriam supostamente raptado de uma comunidade vizinha uma mulher de 37 anos, nas margens do rio Ituí. A informação foi revelada pela "Folha de São Paulo" e confirmada pelo GLOBO. A indígena teria sido encontrada na mata horas depois com as mãos amarradas.
A Frente de Proteção Etnoambiental Vale do Javari acompanha o aparecimento de indígenas isolados na região.
Na gravação é possível ouvir Charlles dizer que não queria "ser falso para levantar a bandeira da paz".
“Não estou aqui pra desarmar ninguém, também não estou aqui pra ser falso e levantar bandeira de paz. Eu passei muito tempo da minha vida evitando a guerra, mas se a guerra vier, nós também não vamos correr. Se vierem na terra de vocês, vocês têm todo o direito de se defender", estimulou os indígenas alegando que os isolados já entendiam o português e tais atitudes não se justificavam, o que não é verdade.
Charlles também diz no áudio que os indígenas recebem "cestas básicas", mas cita dificuldade do governo do presidente Jair Bolsonaro atuar no Javari por "questões ideológicas". Não há registros de nenhum contato com esse tipo de benefício a povos isolados.
"A Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil) vai, denuncia, e a gente fica nesse impasse”. Na época, a Funai informou em nota que a gravação "não apresenta a posição oficial da instituição".
Procurada para comentar se a exoneração tinha a ver com o áudio do ex-coordenador, a Funai ainda não se manifestou.
O Brasil tem 114 registros de povos não contatados ou de recente contato, sendo que 86 deles carecem de pesquisas para serem confirmados, outros 28 são reconhecidos em situação de total isolamento. Mais de um terço dessas indicações estão no Amazonas (37), seguido por Pará (24), Mato Grosso (14), Rondônia (12).
No Vale do Javari, a Funai dispõe de uma coordenação regional, uma coordenação de Frente de Proteção (índios isolados e de recente contato) e cerca de 30 servidores, divididos em quatro bases de proteção, para dar conta de 5 Terras Indígenas com mais de 10 de milhões de hectares. Responsáveis pela proteção aos isolados não somam 10 servidores ativos, que se revezam no campo.