Advogado que perdeu R$ 60 mil com 'faraó dos bitcoins' diz estar "constrangido"
Grupo de investidores entrou na Justiça contra 'Faraó dos bitcoins' pedindo devolução dos recursos investidos com Glaidson dos Santos
"Conheço gente que vendeu a casa achando que ia se aposentar", conta um advogado de 41 anos sobre o esquema de pirâmide financeira que, segundo as investigações da Polícia Federal (PF) e do Ministério Público Federal (MPF), era comandado por Glaidson Acácio dos Santos, que ficou conhecido como 'Faraó dos bitcoins' e acabou preso no fim de agosto .
O próprio homem, morador de Itaboraí, na Região Metropolitana do Rio, investiu R$ 60 mil na empresa do ex-garçom, que prometia lucros exorbitantes mediante supostos investimentos no mercado de criptomoedas. Na última semana, após mover uma ação contra Glaidson, o advogado tornou-se um dos primeiros clientes a conseguir na Justiça o bloqueio de valores entregues ao grupo.
"Tenho alguns amigos empresários que já investiam lá e me recomendaram. A publicidade deles é muito forte. Além disso, eu sabia que havia realmente um grande boom nesses criptoativos, pessoas ficando milionárias, notícias relatando valorizações incríveis. E eu nunca tive muita familiaridade com isso. Para quem não é desse mundo, fica numa espécie de zona cinzenta, o que acaba fazendo com que a pessoa acredite que é possível. Pra mim, é constrangedor, claro, mas em um primeiro momento, diante de todo esse panorama, eu acreditei", diz a vítima do esquema, que preferiu não ser identificada.
Inicialmente, o advogado investiu R$ 10 mil junto ao grupo. Semanas depois, ele foi a uma reunião em uma espécie de sucursal da GAS Consultoria, empresa de Glaidson, na cidade de Niterói, vizinha a Itaboraí. A aparência do escritório, que ocupava metade de uma cobertura em São Francisco, bairro nobre do município, aumentou a confiança na empresa. Ele decidiu, então, aportar mais R$ 50 mil.
"Depois que tudo veio à tona, as pessoas falam: "Ah, mas estava na cara que era pirâmide". Só que estamos falando de algo muito novo. E tem gente que continua acreditando, que diz que não é golpe, que a situação vai se desenrolar. É uma espécie de síndrome de Estocolmo", afirma o advogado, que continua: "Comecei a desconfiar quando vieram as reportagens. Decidi ir à Justiça no mesmo dia da operação, porque sabia dos meus direitos. Passei a manhã inteira já em meio ao processo. Acabei conseguindo a tutela antecipada, e agora meu dinheiro está salvaguardado. Caberá a eles provar que tudo é mentira, o que eu não acredito."
Segundo o advogado, de sete contas vinculadas a Glaidson e à GAS Consultoria localizadas, em apenas uma ainda havia dinheiro a ser recolhido judicialmente. Em seu pedido para o bloqueio dos valores, o investidor ressaltou que Glaidson encontra-se preso e que a polícia encontrou evidências de que ele tentava fugir do país.
A descoberta de que a esposa do ex-garçom, a venezuelana Mirelis Yoseline Diaz Zerpa, havia deixado o Brasil semanas antes da operação, em posse de grande quantia, também aumentou a desconfiança do cliente. Os carros de luxo e valores em espécie apreendidos com o próprio Glaidson completaram o quadro de descrença.
"Foi ali que tudo caiu por terra. Cheirava muito mal. E era mal", resume.
Além do advogado, pelo menos outros dois investidores conseguiram na Justiça o bloqueio de valores associados a Glaidson e à GAS Consultoria. Em uma das decisões, um servidor público que reside na cidade de Guapimirim, na Região Metropolitana do Rio, conseguiu o arresto de R$ 180 mil das contas da G A S Consultoria e Tecnologia LTDA., empresa para a qual realizou três depósitos, na expectativa de receber os lucros do investimento em criptomoedas.
Em outro despacho localizado pelo Globo, uma professora de Cabo Frio, na Região dos Lagos, cidade que era base das operações de Glaidson, conseguiu o bloqueio online de R$ 20 mil das contas da GAS LTDA, referentes aos valores investidos e indenização por danos morais. Os três arrestos somam R$ 240 mil.
Ao todo, há ao menos 13 ações em andamento no Tribunal de Justiça do Rio nas quais os autores pedem o valor aplicado de volta. Em uma delas, um aposentado de Niterói requer R$ 460 mil, transferidos através de quatro depósitos distintos entre maio e julho deste ano, afirmando que Glaidson se passava por uma empresa de investimentos em criptoativos e prometia rentabilidade de 10% sobre o valor aplicado.